terça-feira, 19 de maio de 2009

Um Adeus Regular - Romance de Eduardo Alexandre Miranda Pinto

Romance de
Eduardo Alexandre Miranda Pinto
2006





I CAPÍTULO





Há minutos que estou encostado a um candeeiro e o sol vai brincando comigo. Fumava para o céu, focando o exercício de ascensão do fumo, nas mãos do vento. Estive de mãos dadas muito tempo, memorizando a liberdade como o caracol de Nuremberga me ensinara.

Esquecer ou sentir? Que me dizes?

Mais à frente um ser, dei-lhe o cigarro e olhei em volta procurando diversão.

Isabel teve mais um dos seus dias, hoje a braços com a Primavera. O cuidado de Isabel quando lia EU e TU nas matrículas dos carros. Talvez os carros sirvam para isso mesmo para nos iniciarmos. Houve conversas conseguidas, houve realmente algo, o facto é que a modernidade nos quis como circunstância.

Emília, a minha avó ou ‘Mãe’, como a tratávamos, estava algures numa cama em Lisboa. Os seus andavam na demanda própria de um Domingo.

Madruguei por ela, em busca da sua humildade.

- Tens de te arrumar! Dizia-me sempre enquanto ajeitava o cabelo num jeito de menina que nunca se perde.

- Sabes que homem de boné fraco homem é! E as piadas continuavam a par do tempo, como eu quando tomo café e as dores passam. Um dia, pergunto-lhe o que achava de um rapaz seu vizinho, sentado junto à sua porta e ela diz-me que ele se senta ali muitas vezes porque não pode com o peso da própria cabeça. Ficava cativado com ela.

Disse à minha Isabel, que se me quisesse conhecer, que me escutasse o coração à porta do meu prédio.

Não sabia como enquadrar o Inverno, no quadro que a minha casa mãe me prestava como homenagem. Estavam duas guitarras ao lado do quarto escuro para onde o assédio era estandarte. Mas eu era lhe visível demais e nesse caso preocupava-me em saber entrar em saber sair. Dois dias mais que o mundo eram luz e som colados à superfície. Daí para fora tudo era uma diferença a conceber em dose certa. Era este o equilíbrio a que mais me prestava. E vistas as coisas trauteava da rua para que percebessem que não era um estranho e assim era mais fácil. Mas lembrar à distância todo este processo custava um pouco agora que tinha uma vida.

Dois seres em qualquer situação são absolutos, mesmo que nada sejam. Estar só, estar absoluto, tudo, nada, como um seio que nunca foi visto.

A velocidade como a sombra detém uma sensação semelhante à da História (uma vez vista a beleza jamais é esquecida). E o que se movimenta mais é o nervo. E o entusiasmo de querer viver à frente é isso mesmo e a sua inconstância tão anual como ciclica vai dependendo porque é outra.

Isabel percebia-me e as suas deixas eram como um bálsamo que atenua o adeus. Tínhamos o hábito de passear por Alfama, nas vésperas das marchas de Lisboa, cúmplices aos segredos das vitórias deste bairro no evento de Junho. Vimos uma catraia a comer um gelado enquanto pedia “um tostãozinho para o Santo António!”. Isabel reparou que ela provocava os transeuntes com um vestido demasiado curto para a sua inocência. E comíamos cerejas e deixávamo-nos aos sons e rostos da cidade. Revíamo-nos assim e era mais fácil completar a nossa verdade. A minha impressão nestas tardes, detinham a sensação oposta de eternidade no seu clamor intuitivo e a revelação no momento em que giravam coisas sobre nós, em volta real. Hipnotizados pela vida, como quando amanhecíamos juntos.

Os laços soltavam-se em melancolia como um museu diante da tarde. A nossa força era como uma onda em riste, contida e sem fim. O nosso leme tinha uma direcção, daí que soubéssemos sempre quem éramos. Sabíamos todos os caminhos, nunca nos perdíamos, talvez porque procurássemos muito.

Acordo para Emília, diz-me que vai até à janela ver pessoas, diz-me sempre que parecem mais pequenas vistas dali.

- Talvez o português seja assim, mas olhe, vou escrever à minha pequena, quero contar-lhe o sonho que tive.

Comecei a escrever, enquanto Emília preparava o almoço.



Isabel,

Tenho um orgulho de silvo rolante na candura que abrupta memoriza todas as linhas todas as mãos. Os olhos tatuam-se e é se facilmente livre. Daí que aprecie camaleões ao sol. A cor sem o nevoeiro a que imergimos preenche todas as estrelas por diversão que a ânsia é então lacuna maldita. Esta missiva é redentora quando somos um orgasmo expansivo à saudade e somos eternos quando a carne metaliza em pranto mel as rédeas de coragem.



Entretanto eu e Emília tomámos a refeição, contava-me ela que o seu outro, o meu avô Emílio, tinha o hábito de comer maçãs e beber bagaço no fim da refeição. Eu falei-lhe de um rapaz que me perguntara o que era poesia. Poesia? Coisas bonitas feitas por palavras.

Terminámos a refeição e eu fui continuar a minha carta a Isabel.

Ontem sonhei com um dia anunciado por arroz e feijão frade, dentro de uma floresta verde. Estava a conhecer pela primeira vez a consciência da lucidez e eram cartuchos coloridos que davam início aos reflexos (a caça). Assim descobri uma nova constelação.



Teu

Assim que terminei a carta lembrei-me do dia em que nos encontrámos pela primeira vez. Combináramos na Brasileira. Subi a custo as ruas do Carmo e Garret, porque faltava um minuto para a hora. Ainda não tinha chegado e resolvo sentar-me ao lado de Pessoa. Eis que volvidos alguns minutos, ela chega, deslumbrante de vestido negro comprido e o seu ar etéreo. Pergunta-me se eu podia estar ali.

- Sabes os poetas gostam de estar próximos! Como eu e tu , pensei. Seria? Bebemos um chá e falámos durante duas horas. Lá fora a chuva apareceu e Isabel na urgência das horas abre o chapéu e entrámos nas ruas com a estética própria do primeiro encontro. As cartas abriram caminho para o resto.

Achava eu que janelas abertas, eram uma devolução física como dois lábios juntos. Isabel não sabia que eu era tão interior e quando assobiava na sua rua e abria as janelas para me ouvir, começou a desconfiar.

Aprendeu comigo a assobiar até que selámos os lábios e centenas de histórias depois fazíamo-lo com frequência. Houve uma com piada, tínhamos feito amor numa cabine telefónica, quando toda a gente fugia da chuva, nós deixámo-nos entregues ao prazer. Outra houve, mas mais sofrida, três sujeitos encostam-me três facas no corpo. Lá se vai o meu relógio de bolso… , pensei. Mas não, viram um pacote de mortalhas na minha carteira e despediram-se formalmente sem levar nada. Foi preciso ir à Galiza, cair num rio para ficar sem o relógio. Esta história nunca seduzira Isabel. Tinha tido uma premonição negativa desta viagem ao passado de outros rostos. Em Abril de 1997, chego a ‘Fonsagrada’ uma pequena vila no coração da Galiza ao fim da tarde. Não havia mais transportes para o meu destino esse dia. Tentei esperar o amanhecer, mas o frio e um predador que me acordou, pôs-me a caminho de mochila às costas e de lanterna na mão para andar cerca de 5 horas na noite galega, até chegar a ‘Boelle’, onde estava a minha amiga anarquista.

Queria eu saber tudo sobre a história do grupo anarquista onde tinha estado antes. Mas a minha ânsia deu-se mal, talvez por ter fumado marijuana a mais ou por falhas de comunicação, afinal falava-se galego, alemão, inglês, português. Mas a excelente produção de pensamentos, o veado que vi, a paisagem soberba, o sorriso à minha t-shirt que dizia ‘punk inside’, conceberam uma satisfação única. Despedi-me de Anya com amargura porque gostava dela. E fiquei sem saber da totalidade da história do grupo.

Isabel disse-me para correr até não poder mais, para que a minha curiosidade se perca, mas eu tinha muito para fazer correr e só sabendo eu descansava.

A primeira massagem em Isabel sossegou-nos porque eu tinha o cuidado de dar prazer e fazer soltar as energias com o risco da cautela e dos nossos. E fluiu uma voz quente para o seu ouvido e em relax próximo do sono, vigiei os seus movimentos calmos no meu colchão.

E o sonho era isto. Uma noite onde as imagens se igualam ao vento, vibrando e os moinhos fazem justiça. Um tempo conseguido.

Já sabia esquecer e sentir, antes e depois.



Pareceu-me muito depois.

Cheguei-me à noite escura, deixando os passos sobre si, manuseando a contemplação, fumando. O azul que paira e ergue o desejo, um azul que visto do rio se unia à estética da rapariga que há semanas esboço sorrisos. Não fora eu ao Tejo para outra coisa: tatuar as duas cores a ela e subi depois de breve cigarro rumo à colina de mais movimento a essa hora.

Na verdade estou em casa de perna traçada a pensar em quem pensa e sorri. Procuro um ‘déja-vu’, para retomar uma história esquecida e no meu joelho uma sensação de medo. Que escrevendo sem pensar muito, pode esmorecer a esperança. Talvez que ao procurar histórias e sobre essa tarefa com a mente accionada me deixe sobre a ilustração da noite. Porque a audição me trai, eu acarinho o medo no sonho. Estou só, mas observo as distâncias, subvertendo o sentido moral nas distracções por uma mulher comum. No fundo a linguagem universal é a ordenação do caos. Da experiência e da reflexão, sinto-o e como partem os sonhos e os corpos e as almas, no pensamento permaneço, sustendo-me. Pensar a história dos meus vizinhos deste planeta todos os dias, sem verter uma lágrima é perigoso, pois esta é ácida, corrói. Dor de alma que a cidade consagra, cantaria o cisne tão digno na aparência, no entanto a promessa é ceifada vezes sem conta. O que sentirá a lágrima? E o canto e os vizinhos? Os livros que tenho não mo dizem, nem alguém. Escrevo e circulo, fugindo o relógio para a frente. Calculo que ao passar do tempo, não fico. Então onde estou? A verdade duvida da memória, a lucidez das horas, a alma do corpo…

Mesmo em frente de tudo, planeando o futuro da vida, aceno até ao fim. Assim a vejo, assim traduzo saudade.

A cítara intui histórias esquecidas e os dedos podiam só tocar no corpo, deixando a alma entregue à sua verdade. O mar não tem pele, mas escreve na areia. Se soubéssemos escrever como o mar…



O modo de unir uma ilusão difere no reconhecimento, sendo o deserto a verdade de um povo. O povo aprova-se quando desenha no ventre o esboço de que é feito. Por ventura os rostos espelham a ruptura com os fenómenos do passado. Intranquila a herança, de tractos e actos que concebem a seu ver o rascunho oral da efemeridade de um ser colectivo no seu momento de vida. A transmissão é contínua.



Vejo arrefecer os dias, por favor diz-me quem sabe e me fez um sinal de cruz. O último desta fila podiam ser as unhas do homem do talho, mas não, são cócegas às raparigas. Os velhos percebem e gostam (estou no jardim da Gulbenkian). Dois portugueses aborrecem-me com a altura do cruzar de braços. Esta altura expressão encolhida vezes sem conta, onde os olhos exercitam bocejos por aí. Já o humor querendo boca, rasuras como poses sem vértice específico. Ter tempo como moeda de troca. Embora, vamos! Está na altura de dividir e aguentar uma dúvida!

Olhei de soslaio, retribuiu-me quem eu detive, enquanto as carruagens se ajeitavam na plataforma do metro. Ela falou-me num cigarro que queria acender e eu iluminei-lhe o rosto mais um pouco.

Agora!

…Esta palavra é notória a mim, quando a Ana Ferraz lá do liceu me dizia: É agora! Assim extrema, só que eu esquecia-me e nunca resultava a atitude. Ou uma vizinha da minha mãe, enquanto me assistia, conversando e dizia-o também numa precisão de uma determinação social notável. Que sustos eu apanhava!

Olha!

É uma compaixão muito digna, muito mais que um erro honesto, insistindo.

Por um tempo conseguido e em prevenção às hipóteses de história, os compassos continuam-se como a tarde de hoje. A multitude espaça-se e a cor esventra antes e depois.

Em jeito casual encontro o Branco e falámos porque nunca o tínhamos feito. O único jogo de futebol desinibido no liceu tinha sido com a turma dele. Estava demasiado só para sentir a leveza desse dia ermo. Decidimo-nos por um gelado e foi mais fácil. Pagou a solidão.



Ontem fui-me abaixo, depois de me levantar de doze horas de sono. Era a valer, de início reagi muito bem, eram as forças do Távora e do Douro. Se fores abaixo vou contigo! Só ela me dava provas de amor, mas agora estou comigo no fundo do Tejo. Às vezes lembro-me do Camões, dos pescadores, para me entreter a meio do monólogo. - I’m deep!!! Exclamo três vezes com força, até continuar em memória. Depois cuspo sal (amargo), lodo (armadilha), água… Tinha adormecido ao lado de duas garrafas de dois anos e cheias com esse tempo, uma verde, uma azul.

O sol ainda não se chegou, estou lavado e se agora me masturbasse ia até junto do rio e oferecia-lhe o meu sémen. Ainda noite ouvi o nome Odivelas, ainda e de olhos feridos como o sono que a voz ressuscita. Quis comprar uns óculos escuros ali à Rua Garret, mas só via totolotos nas mãos. Os olhos não tiveram reparo. Mas o céu está bonito, seduz a minha caligrafia há anos. Um nativo do Bangladesh de que desconheço as horas ao soerguimento, disse-me que o seu país era o céu.



No calor da João XXI, uma quarentona maquilhada deliciou-me, porque queria (eu) muito falar e disse (ganhando-lhe tempo) qualquer coisa como é aqui é acolá. Uma vez fui a Sintra e conversei com um miúdo que já tinha “praticado”.

Tive uma namorada, a Nela, na altura em que o meu cabelo entusiasmava mais que uma mocinha. Ela muito bonita, numas roupas proporcionais à sua pequenez, disse não dar mais, que o amor era cego. Também a minha pila adolescente e sem o sinal que agora tem… Adorava encostar a mesma pila inchada na Catarina, num acesso ao Aqueduto das Águas Livres. Já com a Vanessa era incapaz disso, levava-a à biblioteca do liceu e deliciava-me a olhar para os braços e rosto dela, no momento em que ela olhava para livros de almas idas.

No sonho desta noite, fugia ou perseguia um felino. Este tipo de sonho cansa. Apareceu-me uma minhota no intervalo e comecei a desejar e irrito-me por nada de concreto acontecer: nem Deus nem sexo.

Tinha uma azia generalizada a café e tabaco, os meus companheiros.

Sintra é um bom ponto de partida.

Tanta interioridade à mercê e a minha tia vem sempre nos dias de Verão e quase me diz: - Cuidado que o pensamento retrocede pelos teus sentimentos, mas tu vences e quase sempre por aí…

Penso para a virtude. O rosto do leme anuncia dourado o limite caseiro. Pensando novamente: - Sê para ti, o que nu espelhas tu.

Perto de um ritmo onde vigio as saídas. As repetições ficam na memória. Tinha comprado um caderno novo e outro repetir, embora não o soubesse. Um adeus ao rosto.

Ontem, como diria a saudade.



Pouco sabia da normalidade, recluso em bolina, pouco a pouco as coisas grandes tornaram-se o meu relógio de vida para um penar de nostalgia, quando a navegação no firmamento se tornou uma linguagem interior alucinante como o céu que é imenso e fascinante. Mas a dor fria, é escala que oscila em busca de um quadro luminoso e latente pela conquista do amor. A cidade edificou-se sem eu dar conta e desarmado, olhava para as estrelas, a minha porta de engenho, para que pudesse ficar com os relógios afinados ao universo. Um banho de montanha para reclamar a ascensão do meu pensamento original, propus-me e ela aceitou-me. Brinquei com as pinhas e as folhas e o musgo, passo firme na memória que perdera para a cidade.

Quis a terminação um pouco de dinheiro, tento encontrar-me em público, pondo a palma da mão sobre a mesa, estava para o amanhecer como o mocho para a noite, segurando o tempo. Alucinantes e vigorosas viagens marcavam o território interno enquanto me demarcava do metro de sombra mais próximo, não conseguia a quietude. Então pelo prazer, estourei os cifrões em vinil e em casa rodavam bastante alto e abria a janela para que toda a minha rua ouvisse os meus heróis estéticos. Desta vez o beijo era cinzento. Havia ritmo no silêncio que o meu coração sacudia antes de se expor às gentes, no entanto existia nele tempos de morte e de vida, rua e casa. Que podia fazer então? Ultrapassei a coragem por cima e escrevia cartas de galanteio e o seu retorno dava-me tempo de exposição, mais ou menos 3 horas, além dos 55 degraus para subir até minha casa e a mania de andar depressa sem pressa, um outro prazer que nunca esqueci. Acho que não há ninguém que ande a pé mais rápido do que eu em Lisboa e cubro qualquer aposta, até porque ganhar o pão para mim era uma estratégia muito complexa.

Tudo falava, tal ciranda ou locomotiva, então comecei a falar por dá cá aquela palha e o pensamento repousava e a cabeça enchia-se com outros frutos, conforme a locução.

Lá ia eu caótico, para perto da canção-lugar, onde os pormenores revezavam-se e eu de joelhos sabia já o segredo do meu nome. Muito sinuoso mas apurado. Resultado: comecei a trabalhar primeiro as relações e trazia para mim os detalhes de cada ser. Sempre comentavam o olhar fixo, o cabelo ou a minha fala, mas nunca soube reagir, ficava em temor, afinal existia, mesmo depois do conhecimento do amor. E definir-me como excepção era agora possível. Agora lia NU e SO nas matrículas dos lavagantes que roncam e que serpenteio com perícia. Talvez a acessibilidade ao trabalho, permitisse procurar um mais difícil.

Andava pelo Saldanha, quando paro numas obras e pergunto se precisam de trabalhadores e começo no dia seguinte. Era Verão e ao terceiro dia resolvi abandonar a maceta e fui directo à Brasileira, eis que passa um mito e saio disparado para ele. O empregado em sobressalto pela conta, pago e vou até ela. Sempre a considerei nas raras vezes que a via de negro na minha rua ou à sua janela e era da minha geração, todos os outros nunca mais os vi, onde estavam? Ela fez-me aperceber que não havia mitos, mas uma vez mais a curiosidade teve uma pequena proeza e voltei ao meu trabalho nesse dia. O negro tinha ficado para trás.

A saudade tem cor?

Vendi o meu ‘Peavey’ e fui ver o meu amor à primeira vista em Aveiro. Não conhecia nada nem ninguém, encontro alguém que se enquadrava à minha procura e em dez minutos tinha o seu telefone. Fui aldrabado pelo taxista e demorei horas a encontrar o Lote. Volto a telefonar e vem o pai ao café e diz-me que a sua filha tinha ido no dia anterior a Lisboa. Sigo para Coimbra e o dinheiro acaba. Durmo numa república

e pala manhã vou até à igreja, espero que a missa termine, dirijo-me ao padre e explico-lhe que não tinha dinheiro para voltar a Lisboa:

- Meu filho, assuntos da terra não é comigo, só trato de assuntos do céu. Fiquei mais que esclarecido, sem palavras. Mas a polícia resolveu-me o problema. Uma escolta em azul até Coimbra A.

Abraço os meus 895 dias com Isabel e os meus 9878 sem ela, com a chuva ocidental que pairou sagrada junto com o primeiro poema, com a bússola que agora me norteia, logo que saio de Santa Apolónia.

Tal como Celso que pensa que sou o Alex Raymond, que me pergunta se agora se paga com multibanco às meninas. Em 1957 esteve na Rua da Barroca com uma e não se lembra se pagou, ele não se lembra no espaço de minutos dada a amnésia profunda, mas é um cómico intelectual e eu pensava que pagava as relações com palavras, até decidir trabalhar mais uma vez. Escrever era a meta seguinte. A poesia da infância tinha dado lugar aos rostos e escrevia poemas a quem passava, depois ao acordar com os passarinhos, banhos de luz dispostos a mim e oferecia a silhueta à calçada. Mas nunca percebi o pessimismo dos outros a ‘pdv’ a’ pdi’, mas como era poeta sempre que me ofereciam um jantar pedia uma mousse e erguia a taça e era tão bom… Assim o deleite superava o carácter por instantes.

Porque é que eu segui um grupo de católicos que iam em direcção ao padre na missa só o soube mais tarde.

Mais tarde perdi a virgindade na feira do livro em Abril, numa barraquinha amarela, na noite e soube bem.

Isabel perdera a sua no primeiro dia de Abril, comigo, foi por acaso, mas ninguém acredita.

O sublime reside numa ascensão precisa…



Chegou de longe, uma brisa que dizia: de agora em diante a tua musa tem corpo de vento! Vai dançar com ela!

Bom e a preceito, cortejei-a a bom ritmo, rimo-nos tanto, tantas voltas num salão de sons da Irlanda, abracei-a e ela não me evitava, enlaçava-me com frescura e a temperatura voltava a ela, tão bem que ficávamos os dois! Tinha encontrado algo mais sorridente. A evidência…

Em mil novecentos e troca o passo, rego com leveza as minhas flores, depois recolhi algumas, pus-me num comboio e atirei-as para o Douro, talvez houvesse outro corpo, já que o vento andava a pensar o que fazer comigo. Tentei a água, mas saiu-me um peixe-aranha na melhor onda de toda a tarde. Veio a terra tocar concertina com os meus pés, resultava, mas era duro demais o asfalto e passei para o fogo. O fogo de inverno era acolhedor demais, desconfiava um pouco dele. Só havia a História que alberga em livros tudo e todos como alternativa ao vento que tinha muito que fazer girar. Folheava um livro mas não chegava a horas, andávamos desencontrados o pensamento do vento e o vento do meu pensamento. Mas que porra, tardavam as proezas, os rostos, mas havia sempre uma lembrança. Não podia desistir, velava qualquer coisa desde uma pedra até à lua e o seu caminho. Sentia o sangue doce e saudava-as pelo amanhecer, quando íamos dormir. A pedra ficou minha amiga, entretanto. Já agora, seria pelo sentimento ou pela razão, a minha revolução? Já tinha uma pedra e um caminho, que fazer pois? Além disso havia o planeta também.

Não podia esquecer África nem o Celso.

Se o ofício da escrita me permitisse notoriedade pública…, pensei e sabia que levaria muitas gerações para que aquela sociedade onde tinha estado em 1989, numa comuna anarquista fosse mais global. E eu tinha a certeza da possibilidade porque funcionou em Nuremberga e na Pampilhosa da Serra. Era connosco agora, não com a igreja, comunistas ou fascistas, era com a voz interior que todos temos. A complexidade do caso, fez-me esperar por um sinal de vida. Perdia-me em reflexões, diante do avanço do capitalismo e deixei de reler Wilhelm Reich pois a raiva era aguda, também sabia de mim e dos outros, então o paraíso eram os pensamentos…

Talvez pensar fosse meu destino. Nunca hei-de perceber o que andam a fazer com ele. E com a liberdade.



E ser português, o que era para mim? Quando nas minhas voltas pelo ‘Bairro’, falava com forasteiros e caminhávamos juntos, sentia uma vergonha tremenda, nascia um ódio visceral. Mas depois a sós passava. Mas como adorava a língua, não mudaria de nacionalidade, até porque não sabia que país escolher. Ora aí está o problema do conceito de Estado-Nação, o fracasso da democracia era evidente, o imediato subvertia a liberdade que por ela muitos morreram. Mas o sonho vence porque sabe perder.

Nu (o) credo, sobrepondo então o que eu tenho memoria, os dias sem observações entram bem. Há dias que não vejo perturbações, só pessoas. O Aquilino filho, recebeu um ‘vencido da vida’ e o primeiro queixava-se que o segundo não se dava com o autoclismo do primeiro, lá na casa do Mestre. A Casa é muito bonita por fora, estive lá um dia com o meu pai, por que ele é um das Terras do Demo e até pelo que se diz o Mestre um enforcou um gajo da PIDE. O riso é dos maiores sufrágios.

Planando q.b. de volta a este lugar, ganho embalo, para que saneie as últimas preocupações e olho melhor aos olhos. Soldado assim e o vinque das cartas são o melhor ócio, sobretudo quando caem ao chão e o corpo (reduzido) sente que nem pelo assobio as dobras deixam de ranger. Um pouco pleno para a próxima ausência. O meu corpo engendra a sós o mundo assente nos pés destros. Meu corpo pede outro, sem ninguém no orgasmo, na vida em Lisboa.

Ó crónica firme, ó espectro agitado, em qualquer parte onde houver uma mulher, estou seguro pela sua sabedoria, diz o lobo meigo.

Andam as árvores comigo (cerebralmente). Indecifrável aos saqueadores modernos e tropeça a postura do selo, quando se colam à real postura da obra. Há sempre um martelo! A lembrar os ‘Era mas Foice’. Quiçá um humor de deserto que é o delírio da esperança.

Se vos disser olá alguém sorrirá? Se fores ‘motard’ é bem vinda uma motorizada! Se fores adepto do álcool eu torno-me pachorrento, se fores religioso dir-te-ei fo(i)deus, se fores tu Isabel, olha para isto e sente-me, como dantes. Talvez a vida arrisque por mim um final feliz…

Levava-te a casa no Datsun amarelo, ofereci-te um canivete vermelho, o meu crachat da juventude com o símbolo da paz, dizias ser ridículo o morrer de amor de Camilo se ficasses sem mim que só te tinha a ti.

A saudade não morre, nem os símbolos, mas o poeta de excepção está dilacerado, tu não. E ser poeta sem a tua glória, vale em vida o que nunca te disse: estou para a poesia como Deus em ti. .

Ser normal tem a vantagem moral dos tempos que correm, daí que resgate a anterioridade absoluta e a torne um espelho que pensa em silêncio. Talvez a visibilidade se alcance. Mas atenção, o princípio destas margens flui como sempre, tenho então a seriedade do bobo, que esteve em coma 4 anos, porque zombou à superfície e a credibilidade arrisca-se, Dom Quixote de La Mancha lá para os lados de Cuenca, soube lutar, eu também. Aprendi sem o saber e arriscarei sempre, porque herdei do silêncio uma constelação onde não há espelhos.

Eu tinha um tostão e fui comprar um rebuçado branco em plástico vermelho transparente. Quando cresci, as mimosas ondulavam diante da estrada que eu perseguia a fim de chegar ao meu amor que vivia longe.

A mão esquerda fora do carro e olhava decidida para a paisagem. Parei numa estação de serviço e havia tudo menos branco e vermelho transparente, mas plástico sim. O meu plástico de criança era autêntico, estes não o eram. Nesta evidência, desloquei o café para dentro de mim e senti uma união pacífica. A minha saia, recebe a verticalidade de um transeunte, que queria trocos para tabaco. Eu disse que não compreendia, sou estrangeira, disse. Para minha sorte, o rapaz não falava senão português. Para minha sorte, uma nuvem pôs a descoberto o sol e este libertou o motor do carro para que embalassem mulheres como eu. Era uma sensação boa. A frieza emanava horas de sono, ó que sentimento forte, o mundo estava de pé neste momento, vejo passar uma constelação pelo tejadilho… A consciência arrebata remates vencedores, sem que o leiloeiro me seguisse. Estou a falar de um recrudescer em mim. As cicatrizes acumulavam-se, tinha de fazer algo, tirei o pé do acelerador e mudei o rumo. O meu peito para onde as estrelas olhavam agora.

Na verdade não tinha o meu amor, dizia-o para mim, para a cerveja que o felicitava, pois esta pôs-me a adivinhar, com os olhos, até que o visse assim que os fechasse. Brinco às tesouras com meus dedos de pianista e florescem dos poros e do seu vértice, uma canção. Atrás de um pequeno bosque, visitava as pedras e fazia-lhes perguntas de menina. Quem vai ser o meu par? Qual é a palavra mais bonita? O que é a vida? Quem és tu?

A cada Abril, verifico que volta a mim uma tristeza inversamente regular à natureza. Paro de cantar e o círculo que faço na rotunda do Marquês, faço-o sempre duas vezes. Adoro fazer ‘rabo de peixe’ ou ser vista dos autocarros, que somam o laranja ao branco e sigo até à próxima estação de serviço. Durmo demais, penso demais, sou demasiada e conheço a delicadeza. Podia ser estrela de rock, actriz, fotógrafa e logo que acendi o primeiro cigarro, vieram as palavras. E serei eu do tipo que escreve com os olhos? Penso ver-te, quando chego, mas não me atrevo a esperar-te, brinco com o homem da gasolina.

Uma banda acenava o adeus, na evidência do fim da festa, assisti serena. Era tempo de voltar a criança.

Uma fonte, debruço-me à frescura. Apenas o ar me tem beijado, agradecia-lhe a fidelidade a cada conforto concedido. Uma cruz cinzenta, ficara para trás, no ermo por onde eu rolava. Quem seria o próximo ausente? Que diferenças tornariam a ligação possível? Sempre visível eu, adiante de tudo. Mas agora trabalhava a par da produção comutativa ou seja tudo dependia da visão.

Não sabia de ninguém, uma terra partilhada pelo deleite das probabilidades. Tornaria a ver alguém? Um pássaro viu-me do alto de uma árvore e numa vantagem imediata após o olhar, partimos.

Sonhara contigo, estavas à minha espera e eu nunca cheguei. Os anos passaram e era eu que te esperava ao lado de uma capela, no cimo de um monte, pela aurora, com o nevoeiro a criar a ânsia de te não poder ver nunca mais.

No murmúrio adiante, sorriam as luzes de Natal e o truque era segui-las. A imagem dos meus botões não escurecia, guardava-se para me lembrar que estava a caminho.

Delirava numa cama, a cassete sustia-me no seu fervor intempestivo e os sentidos tomavam conta das palavras. Nada de grave, para quem tem um fim. Apanho-me em queda livre e desperto na noite, homicídio da luz e eu contava os segundos até chegar a mim. Vi 15 minutos ondularem e apetecia-me dizer-te que levar-te-ia a casa, longe das lendas que te flagelam e cantaria a tua música favorita e prometia ser alegre. Mas os minutos dizem que não, que já não estás aí. Foste para outro lugar.

Um rosto tão bonito, no alto da multidão, recordava os meus heróis a quem intuía naquele deslumbre de rapaz e eu fiquei por aí. Não mais olhei para trás, ele, suponho, continuava sua redenção na cegueira colectiva de uma cidade perdida na própria luz. E olhar-te-ia sem medo, como o funeral onde nunca estarias, carregado de uma dor alucinante a que te remeteste desde que me sonhaste.

Um universo furtava-se sob um tempo sobreposto há tempo demais: o tempo colide entre uma contagem mágica. Acima de um aroma, dou-me como badalada e aperfeiçoo toda a anterioridade em jeito de fé. O solo organizava meus passeios e o meu dedo favorito, não parava de mexer, toco nas árvores e beijava o louva-a-deus, fresca entre o verde. Gorjeteei um senhor que me indicou o castelo e seu alcaide, com um beijo soprado. Pé ante pé, pedra sobre pedra, a fortaleza que me queria e eu que corria para um abraço que nunca mais encontrei. Pedi a mim um verbo de ataque e a pele sossegava a emoção, enquanto os telhados recebiam as chuvas, folheando as casas, uma a uma, para chegar a tempo do Natal, na minha cidade.

Lembraram-se de conceber vitrines apetitosas e eu era comilona, o meu dinheiro chegava para as minhas voltas e tentei a Parisiense. Um carioca de limão, pouca gente lá fora. Um vendedor senegalês de relógios e isqueiros a quem troquei francesices, aqueceu o café.

Como adquiri o hábito de funcionar a todas as horas, pelas manhãs, um gosto pelo trato humano, da sensação de que crescer era saborear (agora). Mas ser sempre eu, era pouco entendido pelas gentes.

Depois do Alexandre e das viagens, comecei a escrever e a isolar-me.



É alto o ladrão de bigode, que mija na rua e se move como uma serpente.

Tal como vaticinava o vento, chego para a História…

Ela era lésbica e quis-me, apalpou-me a desalmada, espera que te arranjo uma companhia e recebi uma comissão de encomendas virtuais. Uma delas não apareceu e ficámos pelo bate-papo das tardes sonolentas de Campolide.

A única pessoa que entrou, fora o Alexandre. O desejo era agora pela vida abaixo, no que me dizia respeito.

E do alto de minha janela, via o Aqueduto das Águas Livres, a Serra de Monsanto, quem ia à janela, quem se vestia e se despia. Era o monólogo da vida concebida de um terceiro andar. Aprendi a falar como os comerciantes, como o ‘robiallac’, o Sr. João da Tijuca e o Sr. João da Bonança, sim porque ou falava ele ou falava eu… E o dinheiro ia-se e comecei a engendrar esquemas para conciliar-me com esta vida. E assim, percebi Pessoa. Mas como dizia o Sr. Bonança, a vida é comer, beber, dormir e ai ai ui ui…



Acertei-me para o mundo e o fumo acumulava-se no termómetro pulmonar que me impedia de correr tanto quanto queria. Também conheci muitos rapazes depois dele, mas a nenhum ofereci apego. Era tempo de me tornar amiga do meu amor e entrar nele pelas minhas mãos de pianista e escrevia para acalmar ‘o tempo assassino’. Sabes Alexandre, eu quero-te muito. E sinto que o teu amigo de Nuremberga me perceberia, dado ser ele o teu elixir espiritual, como tu o meu alambique. Então prontifico-me a servir todos vós, na minha medida de génio. Para que o amor vença de uma vez por todas, serão os meus segredos os de todos e como uma fé de apostador, será uma aliança sem compromisso a quem sabe ver no escuro.

Cabia ao pensamento erguer-se mais e mais, mesmo que tenso a mim.

Aparecem os passarinhos, os gatos e cães, o ronco do céu e da terra, há horas que os oiço. E meus amigos confiam na minha escuta, eram histórias, que lhes contava, daqui e de toda a inocência.

Saio com eles, com o imediato que é um pequeno herói, segundo a segundo e para sempre a minha ementa de tracto. Logo que aqui venho, quero contar-me e sobra muito para o sofá oferecido pelo pai do sr. Absurdo. O sr. Absurdo, é bom tipo, mas põe-me nervosa. Houve um episódio, em que ele se revelou: recusou-se a levar-me a Santa Maria, num momento em que me senti mal e percebi que tinha conhecido uma irritação muito honesta. Lavar a nudez dos olhos, era um deleite e passava com um telefonema, o mal estar. No período seguinte, andava preocupada em quem pensar para me masturbar e livrar-me das insónias, que eram contraditórias: nunca sabia se adormecia ou se ia passear pela calada da noite. E o carteiro trazia cartas e lixo, pela manhã e todas as directivas do reino animal. Sagrada era também a paciência do meu sono, pois destapava-me e rapava um frio, pela preguiça de mexer uma mão, mas às vezes passada meia hora, conseguia e valia a pena dormir pelo meu mundo.

Se ‘parisse uma estrela que dança’, queria dizer que estava no caminho certo. E o punk-rock entrava como vitamina. Faço continência à nuvem, guardo as moedas em sítio incerto e a brisa de Maio, lembra o submarino que visitei em criança e já dizia, ‘captain’. Meu pai só fala francês. No seu bom estilo, não ganhei nada com isso, a não ser notas novinhas e numeradas, lá pelo Janeiro de 1979. Porto de Lisboa. Estranho, não é?

Tormento de médica de bordo, enjoo pelas veredas, onde o milho não é tão viçoso, como outrora, porque veio o papão-cifrão e não chega a água para todos. Reino mineral: a água desliza nelas. Reino vegetal: cortaram o eucalipto onde a seu lado me sentava. Há dois verões que lá não vou. Como estará o Alfredo da cabra e o Mocas que nunca conheci, mas que ergueu aqueles muros em que eu por vezes sonho passear por?

Duro é preencher-me agora. Eu espero, enquanto meu posto avançado, não se decide entre agir e pensar.

Tremenda, a natureza do sortilégio do fim de dia, que me brinda com um S.O.S. e eu salvo a ingenuidade mais uma vez. Mas estou com medo, medo simples, de não poder comigo.

Tento sair-me bem pelo aperto de mão, mas o solfejo de tantas mãos, orquestra ainda mais a minha singularidade. Isto porque, sou agora, a sua reciclagem no estado puro, depois do vício.

Devia saber que as coisas simples são como são e que a dor é uma personagem em suspensão.



No Opel Kadett branco do meu pai, pelas viagens a Escurquela, eu no banco de trás, ele à frente, percebi o medo e a coragem. Medo das ultrapassagens, resolvidas pela destreza dele. E havia o Zig, um cão fabuloso e destemido, ironicamente morto lá na aldeia por um carro. Sei que lhe levava pão e ele deliciava-se, ia buscar água para ele ao tanque num casco e ficava a olhar para ele. Meu pai queixava-se da cabeça e olhávamos o céu, tanto no dia como antes de entrarmos em casa para dormir, à noite.

Tinha 6 anos e montei um burro, descendo em direcção à praça da aldeia. Os miúdos mais velhos riram-se de mim, apanhei um trauma logo ali e temia descer à aldeia. Ficava-me pelos Tapados, o nosso lugar, mais a Lurdes e o Manel moleiro. Um dia pisei um Louva-a deus, não sabia ao certo se era uma folha ou ele, mas pisei e senti um aperto. Como quando deitaram por terra o meu pessegueiro, plantado pelo meu pequeno sacho. Antes de me deitar, matava todas as aranhas para poder dormir descansada.

Um dia acordei com o meu pai a olhar o meu sono, vesti uns calções, abri a janela e enchi-me de vontade ao dia. Ouvi o motor a trabalhar e corri para ver a água correr por entre o milho. Tinha medo da presa de cima por causa das cobras, do tanque por causa das abelhas e libelinhas e nos caminhos dos saltaricos. Mas gostava de subir à serra sozinha e chegar triunfante ao cimo, orgulhosa de mim e da magnífica paisagem.

Andava horas seguidas de bicicleta, até meu pai me chamar. Aprendi a andar de bicicleta com a ajuda de duas raparigas mais velhas de lá. Elas empurravam e um dia consegui, sozinha.

As nossas amêndoas e avelãs eram deliciosas e com gosto britávamo-las na mesa de pedra protegida por uma velha cerejeira e pela casota do Zig.

Minha mãe diz que houve um dia em que ela e meu pai me deixaram em Lordelo (Vila Real). Ela diz-me que eu me senti abandonada. Cada carro branco que passava na estrada julgava que eram eles para mim, então fugia e o Chico ia me buscar e eu dizia foda-se, tinha 4,5 anos.



Estou a ouvir uma k7 que me ofereceste e a canção diz: ‘ i need a miracle ‘. Por vezes sigo o teu raciocínio existencial, como o faço com quem me inspira e apesar de te não ver não altera nada. Assim que o sigo chego a conclusões interessantes: agir, inspirar fundo, ganhar fôlego sobre as coisas e acontece sempre qualquer coisa, uma pequena magia que a vida nos concede.

Ele há mister, alheio e pelo retrato é figura de tacto, diria a estátua ao pombo.

Há pouco estava com a Filipa ali a Benfica e uma vontade de viver em recordação, cumpriu-se como atracção. Esta tradição, afirma-se com uma regularidade autista e uma rima pulsa quando quer. Há dias que tento estar mais próximo da autonomia e as noites, contraem um pouco como característica incómoda ao corpo. No entanto, tenho um verbo interior como espelho que fala e aconselha em sabedoria. Devo um nome a este carisma, muitas das vezes, imagino-o como invenção, então soletro-o e sou como uma foz simpática.

O que trouxe então o corpo, o que traça o desejo? Algumas interrogações da manhã, a que agora ergo. Até uma auto-desconfiança, na estranheza de rejeitar algumas coisas e de me sentir pouco à vontade neste edifício. O que é recíproco à História, é facultativo em curiosidade. E hoje, a mágoa de não saber, trajou um, dois momentos. Acho que a concentração difere da eternidade em quantidade. No ar que se insinua, em medidas ritmadas como entrar num largo sobranceiro a um passeio a dois. Mas as carreiras, os carreiros, os correiros e os correios, são formas entre a linguagem anterior e o corpo de fé. Os meus dentes colados, percebem e guardam as necessidades, como um penso sobre a rua.

Os jornais próximos do Q.I. português, há anos que me aborrecem, quando colhem e tratam as modas. O seu desfile agrava-se, mas nós estamos habituados à animalidade e ao humor praticamente impotente de rua. Espelho sinistro é o cu do ministro, a propósito da democracia.

Construir-me dos aromas à memória, tem sido relevante, pela originalidade e as suas coerências. Primeiro o Seladinho (Pampilhosa da Serra), depois Escurquela (Sernancelhe), os lugares-chave que agora lembro. Em Escurquela, chega sempre na primeira curva em que se a avista e a frase anual: não há como ela! O Agostinho a quem ofereci a gata Blimunda, cospe com prazer para dentro do balcão e serve-nos um café horrível. Acho que não há mais manetas na aldeia. O Manel moleiro morreu de doença do fígado.

Toda a gente é ‘professor’, era um café em Benfica onde me atestava antes de ir chatear alguém, por amor. Se eu soubesse o que sei agora! O meu relógio serve esta fronteira, estou serena, tal facalhão nas mãos do homem do talho, mas não vejo a via láctea.

No lagar do Sr. Místico, um homem recusado do seminário, chegavam músicas novas todos os dias, enquanto ainda A.M., Jorge memorizava o céu para melhor ressonar. Pele do campo, fortes e rijos, recebem em bons modos as falas de fora, mesmo sem conhecerem Deus ou ‘Dj’s’.Tanta interioridade à mercê e o primo vem sempre nos dias do calendário a Lisboa. O primo vai receber como lembrança, algumas histórias.

Só na desventura, a inocência, é doce quando narcísica. Este um destino a pensar. Há minutos vi o meu corpo, corpo de menina. Há três dias que pouco saio à rua. Tenho duas rugas novas, são de Lisboa. O álbum ‘ Psychocandy’, dos Jesus and Mary Chain, define toda a minha saudade estética, o espaço onde os sentimentos são apurado pólen ao coração que pede. Talvez perdurem ou apenas planem durante os dias que cá estarei. Amei muito o Alexandre e é bom assim. A maneira de o querer, como a melancolia, está no sentido para onde me inspiro. Aí sou corpo doce.

As duas faces em volta do aço, eram voltas indissociáveis a uma pequena diferença: que as açucenas abstraem-se muito dos corpos dos automóveis. O aroma-cinza que um orvalhar guina em simultâneo com mãos destras, também assina cruzes. Esquecer ou sentir? Que me dizes? Não posso. Mas é num desses dias que te lembro mais e quero um corpo de verdade e em simultâneo.

Um tempo recente, retoma a solicitude de uma oração. Que a noite não se quebre e possa prometer ao que o dia não entranha. Narro melhor este estado, quando a sua musicalidade, não se escuta, sou identificado num registo inferior. Não há pior enfermidade e nada pode salvar melhor as memórias, senão eu. Proponho paciência, improviso e erros.

Hoje é o primeiro dia do amor.

Obrigado trincheira pensante. Pensa comigo.

Ontem, aconteceu uma coisa estranha: depois de ter encontrado a Joana na paragem do 58 no Largo do Cauteleiro (vulgo Largo Trindade Coelho), antes de chegarmos às Amoreiras, recebo uma cotovelada na cabeça, de um sujeito. Pergunto se fala português e ele diz que são as curvas e os reflexos. O facto é que fiquei com uma sonolência e adormeci em casa.

Tudo o que queria era um pedaço de lar, deixar de me assustar com as memórias, que um dia seria eu uma canção de saudade. Era só o que eu queria. Pedir à narrativa, que me salvasse era adormecer os olhos, faço as minhas vénias e nunca mais faço surpresas às gentes. Fico-me pela canção, que me salva e torna possível viver os dias sem que me toquem mais, pois nunca o souberam fazer. É assobiar pelo deserto fora, julgo assim me cumprir em alguns segundos. E a rotatividade do humor, pouco sabe de si, prefiro chamar o meu esconderijo de escola de sonho. Assim sei estar em mim, por aqui. Pouco menos que o medo de secar as lágrimas numa só noite.

Para que o processo se reproduzisse, teriam que beijar os meus pensamentos, mas quem os beijou parte em breve. Quero-te tanto Patrícia!

Há milagres lá do Deus, há destinos individuais, e por eles o movimento que ele próprio ignora, não é mais que um suspiro plácido. Tenho medo de ti, miúda. Mas tenho-te em cristal como somos. Quem pode saber de nós, senão a oliveira, no desenho em copa a gesticular e tornando-se corpo profundo, que não se funde, vive lado a lado. Tu és sagrada, não te toco. Espero por ti, enquanto todas as palavras nas nossas noites, foram nome de livro pródigo. Ofereceste-me a verdade, que relato, a um tempo. Quando fores, faz como nos filmes. Eu, na minha condição, vou para os cafés e continuo a enganar todos com os meus olhos, que ninguém decifra, que nem a ti pertencem. A este ritmo, estamos diante da originalidade que nos ferve as veias. Quem chora por nós, à noite? A excepção de sermos uma encruzilhada sem alternativa, metemo-nos a caminho, como sempre, exaustos pelo mundo, que nos quer apertar os parafusos. Estamos no alto, não te preocupes, não te assustes, eu faço de rapaz.

Asseguro-te dor, sou mais que um elmo, sou berço de uma nova história. Num prisma-privilégio, norteio a explicação que revela a coerência. É claro, o sorriso em mim, importam as verdades e a inocência de menino, que é invencível. Digo-vos assim ó raparigas de Lisboa! Este rapaz já não será mais vosso, pertence a um sonho, e só entra pela porta principal, quem tiver a responsabilidade poética de se cumprir e não mais mentir.

Será o orgulho, o vosso mártir? Não me toquem! A traição será tradição perdida na pequenez que vos tem assinalado o susto de ser alto. Não mais me preocupo, em saber se querem saber o que é a vida, terei como aliados, na demanda absoluta, o principezinho, a quem visito e me diz: olha este desenho… É a dádiva da imaginação, recriando o brilho de um lado da barricada. Querem luta? Vocês vão ver os poetas a desmascarar-vos do ventre à cabeça oca, os românticos nas ruas das cidades, os pastores lá nas serras, todo um mundo a falar o singular amor.

Sim, eu quero-te, mesmo que mais uma aventura colocada ao lado de dinamite, eu sei sair da trincheira.

Hoje vieste até mim e eu olhava-te, que posso mais te dizer? És como eu… Nas nossas noites do Bairro, em que nos sentávamos à frente daquelas portas, e nos escutávamos. Eu no meu pensar, tu no teu corpo. Lembras-te quando fomos à zona das vivendas aqui em Campolide? Trouxeste o carro do teu pai, escolhemos um lugar à sombra e lá dentro (tu e eu), tão perto e descontraídos, abriste o teu diário e eu ouvia as tuas coisas.

Desde que te vi, em 97, no cruzamento do ‘Mescal’, onde o pessoal se juntava, esperava pela diferença e chegaste de unhas negras e um sorriso raro. Ia todas as sextas e sábados, para te ver passar. Um dia, a propósito de uma discussão sobre touros com uns tipos imberbes demais, fiquei tão irritado que após descer a rua para o cruzamento, sentei-me em cima de um carro, em pose budista. Entretanto chegas tu e eu salto disparado para ti e disse-te que tinha concorrido a um concurso de poesia e que gostava de ta mostrar e com um pequeno medo, pedi-te a tua morada. Acedeste e enquanto a escrevias, olhei para as tuas mãos de mulher.

Hoje, 3 anos depois sei que és tu. Se ao menos olhasses para mim, eu falava-te do universo e tu sossegavas as verrugas do teu pensamento. Quando partires, vou chorar-nos e pedir à intuição que resolva o medo. Que nos resolva e que um dia voltemos ao teu carro, para conversar. E podes sempre voltar aqui a casa e fazer o pino.

É madrugada, a cidade está como eu a quero, numa sonoridade que permite sonha

r com teu quarto. O teu quarto, onde me deste um iogurte gigante em colheradas gentis à minha boca. Sei do teu sofrimento atroz, eu ainda me desdobro do meu e a partir disso, tenho tempo para te olhar e responder-te a todo o movimento fora dos vidros, do carro, do autocarro, das nossas janelas. Lembras-te, quando estávamos no Restauradores, junto ao Hotel Avenida Palace, um gajo olhou-me enquanto caminhava e levantou as sobrancelhas. Eu disse, que aquele movimento sempre me fez confusão. E tu: queres que eu lhe faça o mesmo? E um dia, quando te contava algumas histórias de Lisboa, ensinaste-me a desenhar e disseste-me que eu tinha um perfil perfeito. Depois disseste que eu era o Alex, um rapaz de Lisboa. Hoje falaste-me do António, afinal ele é ficção, assim posso autenticar todas as minhas histórias. Que sosseguemos, enquanto nos descobrimos mais uma vez. ‘ I’ll be Bogart and you’ll be Bacall’…

Raquel, emudecida, pela noite. Os meus vizinhos estranhos, que me confundem as voltas na minha cama.

Gostava de ter dito ao Fernando Dacosta, que era preciso mais voz, à Sara que me beijou, junto à Igreja de São Roque, enquanto esperava o 58, o desejo pela sua boa esperança, à Dona Rosalina que não veja o terror da televisão e que eu acabe isto depressa para fumar menos.

O ‘robiallac’ morreu esta semana, depois de tantos anos a ouvir a sua voz pujante. Deu 3 vezes a lotaria do Natal. Mesmo que não me percebas eu velo-te hoje.

Vou ver as coordenadas, mandar-te letras dos Smiths e esperar pelo nosso encontro. Quem sabe, será mesmo nos Campos Elísios, os dois de mão dada… Como sonhei. E cantar-te-ia uma canção, que minha mãe canta quando atravessa a ponte e o delírio da Rua Garret, quando tu e a Lígia estiveram diante de mim, será maior, porque…, porque te adoro.

Ficaríamos bem, tu na tela, eu no papel.

Fora do Almanaque Borda de Água, passeava com ladrões e lia rostos, numa posição mais humana. Perceber isto, era requerer ao céu, que conduzisse as mãos a um toque mais cândido. E o veloz canto da noite, sossegava-me. Estava propenso ao mundo e às sensações gritantes. Quem podia entrar para o outro lado, estava de volta da banheira, com um patinho vermelho. Queres entrar? Falo-te como sei, em nudez. O semear será a tua melhor colheita. Então, a esquina da rua percebeu que eu era dela e fotografou-me, com uma nitidez que voa acima do esclarecimento. Encontra-te comigo na fonte e dir-te-ei, que teu corpo deve recear somente sua derrota.

Houve um fogo, meu pai e eu, acorremos a ele. Um aldeão colocou a enxada no porta-bagagens e comentou, ‘isto é um carro de guerra’. Meu pai teve tempo, de se orgulhar do seu único carro e o mais corajoso de todos. Assim que chegámos, um pequeno pinhal ardia em chamas ferozes, que corriam pelo solo. Fugimos todos, bombeiros incluídos e meu pai ficou preso numa pedra. Não o vi, sei que conseguiu na aflição, ter a lucidez, num homem só, que é ele. Agora sei, quão é difícil ser sempre o mesmo a todas as horas. Estarmos connosco e com o elmo bem assente, vê-se o que o perigo nos tem para dizer. Perigoso ser mortal.

Ela quis o meu corpo. Teve-o e eu funcionei a chocolates, dentro de estações de caminho de ferro e a água, chás e cigarros. Levou-me a líbido e eu regressei à minha casa, para o meu rock, para voltar às amigas de alma. Uma sentença de amor, decidida entre a minha almofada de há 7 anos e o tecto.

A vida como está?

Um apontamento de espera, a recente pontualidade de um hábito.

Alguém me ofereceu, umas luvas de boxe vermelhas pela infância e do vermelho tive a camisola da selecção portuguesa de 1984, a do Chalana. Uma vez, a minha turma do Paula Vicente, foi à Luz ver os treinos do Benfica. O canhoto Fernando, deu-me a sua rubrica, num livrinho de autógrafos que era girito e ficou-me com a tampa laranja da caneta. Acho que era uma caneta do PSD. Também gostava do Bento, era destemido. Agora, gosto do Pauleta, porque tem um corte de cabelo semelhante ao meu e é espontâneo.

Noam Chomsky ou Murray Bookchin, um destes dois escreveu, ‘Espontaneadade e organização’, um livrinho de sugestões e reflexões libertárias.



Talvez seja demasiado estrondo, estar na Brasileira e ver um poema escrito no topo junto à entrada e não ver os poetas de Lisboa. Os poetas da altura valente, deviam ter o rabo rijo, as cadeiras de lá são duras. Disse a uma anti-amor, que o meu rabo era macio e ela passou a mão para se certificar que era disso que se tratava. Ontem à noite estava a passar os olhos pelo Lucky Luke e no saloon as coristas cantavam:’ The nice little bedbug so cheerful and bright, keeps me a-scratchin half of the night’. Sim, porque um noruguês que conheci numa manif organizada por mim e mais alguns contra o Haider, fez o transporte de pulgas para minha casa. E cá estão, há dois anos. Afinal que sangue é o meu?

Lembro-me de me darem vinho de uma pipa, num copo de iogurte e achar horrível, tinha 7 anos. Em 1988, bebi cerveja, vodka, whisky, ginja, bagaço, vinho barato, só para ficar criativo, mas sabia mal como à porra. A última bebedeira, foi há 6 anos. Estava em Vilar de Mouros e fui beber uma garrafa de cola com rum, feita por mim. Os Xutos estavam, já vendidos e fui para o carro de uma comuna e de lá o meu estômago, ouvia a voz de Teresa Salgueiro: ‘às voltas…’ Não me lembro de mais nada. Agora fumo. Os charros são demasiado perigosos, para mentes como a minha. Dei duas passas num e fiquei com uma pedra para uma semana e ando a tomar 3 valiums 10 desde então, desde 1999. Ah que giro, era a minha série favorita, ainda tenho a caderneta. E eu pensava tanto no futuro…

Tenho saudades da inocência, de andar e pensar sozinho, de brincar comigo, da minha garagem e carros, nunca pensei que o mundo tinha o Amazonas, que a minha pila servia para entrar dentro de uma mulher, que havia de conhecer o amor, a dor. Só sabia sonhar!

Hoje sonho outra vez. Sonho e saudade. Se te disser que conheci a verdade, acreditas? Pelo menos, sou eu.

Às vezes uso uma boina do falecido Sr. Delfim, que me levava à estação de Campolide, ele era tão bom homem… Uso-a quando vou cortar o cabelo ao Mestre Manel, porque ele corta tão mal! Mas agora descobri o truque, eu comando a tesoura e ele acede. Ele tirou o cartaz de uma multidão de muçulmanos a rezar, depois de 11 de Setembro. A minha mãe, diz que ele gostava daquela imagem, porque estavam todos de cu para o ar. Ele, fala muito em pilas, deve ser isso.

Uma vez, chorei por debaixo da Avenida Calouste Gulbenkian, eu e o taxista. Ele, pelo filho, eu pela minha cabeça perdida. Foi forte. Custou-me fechar a porta de seu carro, um pouco mais acima.

E o senhor Delfim dava-me, uma moeda de cem escudos, por cada vez que o Benfica ganhasse.

O prédio, tem três andares, eu moro no 3º direito. Gostava que fosse meu, para escrever, lá fora: ‘ gosto de não fazer nada, sozinho’.

Hoje derrubei uma senhora ao segundo beijo, Graça de seu nome.

Hoje podiam estar todos aqui. O que remete as pessoas à ausência, à morte, à fuga?

Fico para contar, além de mim, todo o instrumental gerado pela vareta de quem? Vou ouvindo coisas, aqui muitas e serão naturalizadas pela apanha da azeitona. Quanto à fruta, tive uma overdose de maçãs e uvas, como dizia o Paião, ‘como o macaco gosta de banana, eu gosto de ti’! Devorei Goldens e uvas de todo o género. Não me lembro do sabor do dióspiro, recordo a banana Pacovã que minha avó trouxe de Belém do Pará. Ela explicou-me que havia a banana chorona (a mais pequena), a banana prata (média) e a pacovã. Deve haver mais. Tenho uma no bolso do casaco, parece que vou comê-la. Não vale a pena comer muito, porque meu metabolismo resolve velozmente e passados 5 minutos já tenho fome. Uma vez, fui a Lagos e a minha namorada e seus pais receberam-me em Lagos. Repeti três vezes e quando acedia ao quarto, ela deu-me um pontapé, por debaixo da mesa. Hoje como vinte vezes ao dia.

O Wilhelm Reich acha mal que se diga ‘ comi uma gaja’, eu também acho. Olha foi golo do Benfica!

Nunca me esqueço do golo que marquei, com o pé esquerdo, eu que sou destro no direito. Fui no Parque Eduardo VII, num campo, onde hoje é um clube não sei do quê. Eu puxei a bola para a minha esquerda, com o pé direito e de primeira fiz um remate cruzado e a bola bate no poste esquerdo e entra. Eu saltei, como fazia o Pélé. O melhor golo com o pé direito foi no jardim de Roma. Veio um passe da esquerda, tinha um opositor à minha frente. Então deixei a bola rolar um pouco no espaço que havia entre os dois e de primeira, remato colocado junto à pedra que servia de baliza. Ainda marquei um golo em que a bola vinha do meio-campo em direcção ao guarda-redes, com força e quando o guardião se lançava para a bola eu desvio e enganei-o. Outro de calcanhar, numa bola vinda de um canto, no pavilhão da Costa de Caparica. O Gendarme é que dizia que era de e não da. Era careca e conduzia e tinha muitas chaves no bolso. Eu tenho 3 + 2, as duas são do Carlos Celso, vou lá falar de cinema. Ele às vezes mostra-me o rabo e eu não mostro nada. Dei-lhe um rádio, que um namorado da minha mãe me ofereceu e tenho de ir lá sempre arranjá-lo. Agora que minha mãe, me levou as colunas, tenho um rádio com duplo deck, emprestado por Cristina, ela é de Madrid. Lá são nove meses de inverno e três de inferno assim diz o César, que também é calvo. Eu ainda não sou, ainda quero ser Jim Reid, por uns tempos.

Um dia fui às Amoreiras com a sexy-beta e no cafézinho, onde assentámos arraiais, estava uma senhorita, eu olhava as suas mamas e de repente vejo melhor e a t-shirt dela dizia: ‘sicknineteens’. Um obrigado às mamas. Desta vez os meus olhos viram o que oiço dia a dia na porcaria da rádio. O António Sérgio, foi pressionado por mim, ali na Pastorinha, para descobrir os ‘Freeheat’ e passá-los na rádio. Eu e a minha namorada virtual, tripámos, quando ouvimos o Jim em boa forma.

O passeio dos carros, silêncio quando?

Cada vez, que um português me dá sono, acordo para além da água mineral. Hoje adormeci através de um laboratório de pedinchice e não tinha uniforme. Encontro o César, com o ABC e ele paga-me o devido imposto revolucionário e anota na sua fala, que a atenção é uma dosagem ingerida, pelo poema visto por um microscópio. A Sónia tem um rabo grande. Uma vez fui com a Tanja, rever (em calções), o Monsanto, logo ali, a seguir à última paragem do 2. À noite fomos à cinemateca, ver uma sua. Ah! Os últimos cinco filmes, foram vistos ao lado de cinco mulheres, a Elizete, a Tanja, a Marina, a Patrícia e a Ana. Isto porque o David, prefere o Peep Show e as histórias da Maria Mateus.

Outra vez, fui ali para os lados do Palácio Mateus, não sei, qualquer coisa como, ‘Senhora da Pena’, lá dizem pana. E o Nuno Alexandre, cantava em cima da mesa de quem levava almoço de casa, no Paula Vicente. Seu tio, levou-nos num minizinho, por essas terras férteis. Quem diria, que encontraria, alguém da idade da inocência, ali? Gosto da Carvalho Araújo, da Rua Direita, da feira, dos correios e da ponte sobre o Corgo. O Quim é barbeiro no Porto, o Zérmindo aleijou-se numa mão, O Carlos gostava de pescar, o Paulinho está grande, as irmãs nada sei e a mãe, a ti Alcina, dava-me sempre broa com manteiga e educava os seus filhos a chicote, que era uma vara. O isqueiro foi-se. Estou demasiado à vontade aqui, não deve ser dos gases, mas por ter dinheiro para outro maço de cigarros. A casa de Alcina era pequena, mas generosa. Ali perto, joguei ao Tau, era bué da fixe. Joguei ao Tau, no jardim de Roma, que no seu conjunto é do tamanho de um relvado de estádio de futebol e levávamos horas para dizer o nome de quem se escondia. A Sónia, é simpática, emprestou-me o seu isqueiro. Ao fundo da Pastorinha, está o Ti António, zarolho e calvo. É expert em pedinchices.

Vigo, viga, vinho, vinha.



Havia agora uma razão fugaz, além de seu pensamento. Era uma bela rapariga de cabelos claros, bem a seu estilo, que se mudara para a General Taborda. Tão breve, quando ia à janela, ora na pequena caminhada de seu automóvel, até ao nº6. Habituou-se a ela, que veio logo, depois de Alexandre reler uma história do Príncipe Valente, do Harold R Foster. Chamou-a de Aleta, tal qual o nome da mulher do guerreiro, dada a sua generosa beleza.

As imagens de ontem foram precisamente ela e o comentário do Celso, ao meu estilo cowboy. Quando poderia eu, dizer a primeira palavra e qual seria. Hoje após um café fiado na Mariposa, vi-a e preparei-me para passar por ela, olhei-a, ela olhou-me. Continuei, mas subi em frémito as escadas para a ver de minha janela. Tenho-a visto duas vezes por dia. Lembro-me do Schpinne em Den Hagg, quando pedíamos trocos, na estação de comboios e ele amante das aves, viu uma rapariga vestida de negro que lhe que lhe fez encher o peito. Ainda agora lia um romance beirão e vesti-me de fúria, por tudo, pela falta de personalidades de vanguarda e eu remetido ao isolamento. Então tomei um duche completo, revigorando minhas pernas. Assim que comecei a pensar no papel, passou de fúria a desejo, aliado ao meu caso psicológico, que é o pensamento sensacional, que tanto atormenta como pacifica. De sua casa ouvia um piano tocar, bailava alegremente pela noite naquele pedaço de rua .Obreiro auditivo, pensei… Escuto a rua. Há uns anos, ela teria notado algo mais em mim. Hoje apenas lhe posso oferecer o improviso. Eu tocava baixo-eléctrico, pendurado na minha janela, e os graves desciam até ao Aqueduto. Às vezes oiço o apito do comboio. Agora é tudo senão vontade ócia.

Mas a ansiedade, afasta-me da multidão, onde era mestre. E lembro o Liceu Maria Amália Vaz De Carvalho, onde minhas proezas me são lembradas, quando encontro nativos desse tempo memorável. Agora, encontro tesouros, dentro do meu reduzido território físico. Não vale a pena olhá-la de soslaio, eu vejo-a duas vezes e chega. Senão lembro-me da Bárbara e volta uma juventude que sonho no feminino. E voo pelo refrão de minha queda autista, em que o coração é trespassado, a alma nomeada ao inferno. Sou todo o intervalo activo da minha liberdade.

Estou seguro no pensamento. Hoje a Filipa R., trouxe-me dois chocolates. A Lucinda da peixaria, chama-me e eu sabia que eram coisas dela, depois dos meus pensamentos a este corpo-carta. Assim é a nossa relação. Cinco anos depois de a conhecer, conheço-a por carta. O namorado de Aleta, veio pôr o lixo, no caixote do meu prédio, que estava já na rua. Lembrei-me de ir lá espreitar, que lixo produzem. Pelos dedos, passa o medo, agora é um medo absoluto ao movimento. Meu desterro, é a Rua General Taborda.

Tenho lhe dado, o meu melhor, mas só me dizem para trabalhar, que será desta gente?

Esforço devoção dedicação e glória, não eu sou do Benfica. C’est pas grave, diria Marie. Hoje deve vir o mecenas, lá vou eu discutir minorias e o anti-amor esfrega as mãos, como o seu reverso. Prazer avulso.

Manter-me entranhado, pela bolina, pela bússola, pelo fogo de San Telmo, que a caça é veia de seiva, sem que haja pacto de sangue.

Quando houver dias de chuva, eu vou de bicicleta ou a pé, para a fronteira, colocar os pés entre as duas linhas e deixar a minha saliva por ali.

Acho que Aleta, está fascinada pela vista, fui espreita-la e está de luzes e janelas abertas. Não há cargueiro que desconfie, deste pestanejar.

Lembro-me da Nina Hagen se enamorar de um jovem punk, eu que namorei uma, aquando do meu anarco-punkismo. Era a Fernanda, magra e destemida. Conheci-a, num concerto de Mata-Ratos e Ku de Judas, no verão de 1987, no miradouro de Santa Catarina. Sei que nos beijámos a noite toda, no jardim de São Pedro de Alcântara. Ela tinha 19, eu 16. Vivre libre ou mourir, escreveu no seu casaco verde, ela.

O doutor Vieira, firme nas suas fórmulas matemáticas, diz que sou herdeiro de uma riqueza incomensurável. No entanto pedi-lhe 50 cêntimos, já não sei para quê e quem usufruirá deste espaço? Importa tanto como esquecer e sentir.

A boleia de Nuremberga a Coimbra durou, dois dias e meio. Vim com a Gorky. Um dia parámos em França e fizemos uma barraquinha de madeira. Eu desejei-a, mas hesitava, tentei o meu pé, que ficou suspenso meia-hora, até desistir. Sei que o caracol, continua sua luta, o maior romântico que já conheci. Recordo as suas palavras numa estação de serviço, em direcção a Berlim, onde ele, gozou com o Salazar e fez bem e avisou-me para não abrir boca das actividades da Indianner Kommune. Assim foi. Foi muito bom Nuremberga para mim, intuí tudo para mais tarde na minha perdição por Isabel e agora com o sacerdócio do afecto. Era tão tímido, na altura, mal dizia uma palavra. E o abraço de Olga, quando pôs os ‘Condenação Pacífica’, lá na casa, fez-me tão bem. E o Kasi: ‘What about Alex’s feelings?’ E o Fritz, um homem da Renascença, a única pessoa que chorou por mim, genuinamente. Agora, são saudades de tanta coisa e a única coisa que preocupa a respiração neste ermo de terra, é o meu nariz que ficou achatado na almofada. Sonhei com Isabel, mais uma vez.

Falei com Aleta. Ela parqueava seu carro, e eu orientei a manobra, depois desci até Raquel, que não estava, voltei a subir (não resisti) e disse a Aleta, para evitar estacionar na passadeira, pois podia ser multada. Ela agradeceu. Ela é música, vi as pautas no seu colo. Meu coração ganha ânimo com ela, pensei que teria um ataque cardíaco, ainda há pouco. Se me movo em excesso, um anãozinho diz-me para estar quieto e fico estranho e longe de mim. “Quando normal, sinto-me estranho, como um caudal que não tenho” escrevi um dia, após uma viagem no autocarro 58. Ó terna e velha liberdade, vem a mim! Porque me sinto mal, não sendo eu? Tiram-me a vida, despersonalização é morte, um horror maior que os salários, sendo duas bandeiras com ossos.

Difícil é mudar o português. Irritam-me, as suas pausas e seus tiques, quando olham e não olham, estando sempre fartos e cansados e sonhando baixinho. Mas se eu tomar iniciativa num lugar público, mais louco do que já sou e das vezes que visitei as esquadras, só pode resvalar aqui e na rua, quando digo olá. E hoje ofereci uma rosa da jarra da farmácia, à rapariga de olhos azuis de paz e eu estava nervoso para caraças antes da oferenda. Mal fixei sua voz, só quero saber os nomes. A Patrícia há um mês que não dá as cartas. Ah! Lembrei-me do diabo, que afinal era homossexual. É o Sr. João, costumava estar junto ao Sheraton, a acenar, a quem passava. Só eu sei que o mecenas lhe tem medo e lhe colocou o cognome de diabo e só eu sei que ele é gay, pois ele quis brincar comigo.

As janelas de Aleta, estão escuras, hoje fico cá eu, por ti e o pensamento do cargueiro não reage, que eu não deixo. Até a morte nos chamar, vão as coisas por si, como a criança com o yo-yo. O meu ABC de excepção é a escrita, não sei falar, que hei-de fazer, preciosa Aleta?

Tamanha é a façanha da ingenuidade, que embora não pague multas, penso no amor.

Tragam os cavalos! Vamos dançar! Por cada aperto dentro, saem os dentes para fora. Mastiguem bem, que está rija a saudade!



Campolide, pertence à aquela velha guarda salazarista, de quem sabe de antemão, o futuro. Melhor que os hierofantes, tal as suas explicações, para os males sociais e para o meu. Mal me querem, em mentalidade, bem me querem em sorriso. Assim se vestem os os nativos de Campolide, com quem lido.



Lembro-me de acordar, da corrente de ar que fazia espirrar meu pai, das cestas de vime, carregadas de uvas e depois penduradas na cozinha. Do ouriço da castanha, o orvalho como uma coisa mágica, da sinalética da estrada, da saudação aos cantoneiros beirões, da serra.

Mais tarde dos serões em casa da Filipa., irmanados na memória, desde o nosso primeiro beijo, em 1988, até Isabel, sua amiga de Faculdade.

Dos quatro anos que passei, na Costa de Caparica.

Da noite, passada no Castelo de Marialva, com Ana C., de outra noite com ela no alto da serra da Estrela, só os dois no topo e estava frio em Agosto.

Da Lena D’Água, que vi mais uns tipos no cinema Alfa, ali ao Areeiro.

Ontem, passeava com o anti-amor, pela noite de Lisboa, fomos ao Extra, da Infante Santo, onde eu trabalhara em 96. Estava bem comido, ele pagou-me as páginas que escrevo e ofereceu-me um chocolate, um iogurte líquido e um isqueiro. Conduz bem, comigo.

Decidira ficar em Lisboa.

Atingi uma altura, agora mesmo, que mal feita a barba, ainda não sei que estado é. Um processo que me ultrapassa, mas que resolveu dilatar o coração. Abri as três janelas de casa e o sangue tenta arrefecer. Assim não preciso de fármacos. Raquel já deve ter chegado, amanhã é segunda-feira, vou entrar na farmácia, na rua e esperar a carteira Vera, com o seu cabelo apanhado. Todos os olás, para já, são neblina. Apanhei a roupa, não deixei cair nenhuma mola de madeira, só falta o fogão, o chão da cozinha e a cera nos tacos e esta casa fica melhor, para mais histórias.

Ermo em mim, após a brevidade à rua, algum sol nos braços e rosto e um corte de cabelo. Aleta está acordada, eu oiço a Antena 2, para embalar na recta da noite. Pouco me lembro do dia na rua, sei que lavaram este pedaço da rua, com mangueiras grossas e negras, homens gastos, de azul, faziam o trabalho. Sim vi a Vera, mas outra, uma brasileira pacata e simpática que trabalha na Conde das Antas.

Cristina vem quarta-feira, traz esperança para aqui e seu humor madrileno.

Aleta adormeceu… Estou tão calmo. Falei com ela hoje. Sentei-me à beira da porta dela, de boina na mão e esperei-a. Perguntei-lhe como se escrevia o Lá Menor na pauta, ela disse qualquer coisa concreta, mas eu tentava olhá-la. Depois, agradeci, ela abre a porta e diz boa tarde. Eu surpreso, retribuí.

Recebi missiva de Belém do Pará, mais 3 contos. Meu pai, gosta de onde nasceu. Tive que ir ao banco trocar o dinheiro. Esqueceu-se destes escudos? Pergunta o bancário, Não mandaram-me, disse. Depois verificou se eram verdadeiras e fez-me assinar um papel e com a caneta dele, já que a minha foi teimosa. Senti-me mal, devia ter sorrido mais. Afinal este banco, em frente à Pastorinha, em tempos fora um café bastante castiço. Ontem comi uma sandes que me caiu mal. Foi o César calvo, comprara no seu Corte Inglês. Hoje ofereci a bica a Raquel e um isqueiro azul pequeno. Falámos de amor e dinheiro.

Há anos, que oiço um fio de urina, entre paredes. O rádio ligado, a camomila chega a mim, numa caneca de cerveja, vinda do Castelo de São Jorge. A estas horas pouco se fala, estive com a guitarra em punho, a ler o Pato Donald. Falei uma hora, para mim. Ontem, por duas vezes, o carro da Vera e da Rita (da Conde das Antas), passou por mim duas vezes, na segunda assobiaram, eu que vinha em apuros de ânsia, caiu bem a sonoridade. Estava a cantar um poema meu, aquele em que me tardo na saia, a corda partiu-se. Acho que uma bicicleta me fazia bem à condição de cárcere. Ia por aí abaixo e o pânico que me castra, chegava resoluto por momentos, em pequena liberdade nocturna. Maldito charro, que fumei! Quase 3 anos, em agitação permanente. O que me vale é a minha caixa de recursos e isto.

Para quem fuma, há algas e alho, anti-cancerígenos. Poderei existir, sem que o coração vacile, para já? Uma moça, filha de uma fadista conhecida nos anos 70, disse que viveria muitos anos. A minha mãe diz sempre que não. Já vaticinou minha morte. Há dois anos que devia estar morto, segundo ela. Hoje na farmácia, premi na amostra de creme e besuntei o local onde as olheiras dão de si. Pela tarde, este acontecimento, pouco valeu a ela, ‘é o teu fígado!’ O espelho da balança, onde me penteio e me pesava antes da moeda única (são 20 cêntimos, eram 10 escudos!), serviu sólido para o dia, peguei em dois envelopes coloridos da jovem que ali inicia a sua carreira, entre a bata branca e a síndrome albiscrastense, numa simpatia voraz e entre a estampa normal e incolor, eu fui aos CTT e pedi dois selos (dois mochos) para remeter nas mãos deles, a missiva. Depois fui ao banco pagar uma renda, caíram dois euros, também de uma colega de branco.

Os meus amigos, lá andam. O Sr. Absurdo viaja como sabe, o João S. abraçou a causa libertária (até ver) e ainda o anti-amor, temente ao diabo-homossexual.

Quanto às amiguinhas, vou selando com regularidade as missivas, entre as vidas de cada uma. Isto porque antes de Isabel, só tinha dois, dos tempos do liceu. E fiz-me às ruas e conquistei afectos no feminino. Os dois, macho e fêmea, entram em curto-circuito, depois de uma discussão acesa em 1988, acerca do Sérgio Godinho, de quem tenho um vinil de capa da saudosa estação de Campolide. Vai havendo sexo ocasional, que de irregular, tem sido bom na qualidade.

Fui ver montras na rua e falei com o pai da Patrícia. Vou falar francês com ela, ‘oui je t’aime tous les jours’, se cair algum, para o telefonema parisiense.

A rotina de homem só, é complexa: varrer o chão de dois em dois dias, lavar a loiça uma vez por dia, juntar material reciclável, falar com os comerciantes acerca de Física Quântica e do Mundo Vip, esgotar a pasta de dentes numa semana, esgotar a paciência dos Campolidenses, aquecer a sopa, um ou dois bifes, leite, iogurtes, chá e café. As molas não têm caído.

O carteiro João, está de férias, tem menos cabelo e a sua mulher disse-lhe que tenho ar de louco. No balcão do restaurante, enunciou mais baixo que as suas manhãs, ‘ser poeta é ser mais alto’. Um suspiro fala mais que toda a ânsia recauchutada. Vem…

‘when routine bites hard and ambitions are low’, then love, love will tear us apart again’…

Inventariar o cansaço, quando as premonições não resvalam para o corpo, e pelo vento interior, o meu moinho vai celebrando águas passadas.

Filipa R., veio a mim, soube bem sorrir e os suspiros que na infância via na padaria, são meus e dela. Sabemos esta pausa tão bem. Sustidos por ferramentas, cada um no início de seu beijo cinzento ao ‘Deus dará’. Filipa, ninguém nos espera, o ego mesmo que autónomo, são os teus desenhos que nunca vi, os poemas que te escrevo, o teu gorro colorido, a minha boina. Já estamos nas nossas casas, o quadro férreo.

Sim, a noite faz check in à janela, de fogo fátuo na sua mão, acalenta os sete mares, como a sirene no seu carrossel luminoso. Fazer rock.

Para me acercar da canção de engate, vou pelo acervo de minhas pernas, em escolha autista, para o ponto onde sinto meus vizinhos, esta aldeia nocturna, onde sou bem comedido. E depois beijei-a, no sopé de um degrau. Ó-Ó…

Entretanto chega meu pai, mais ânimo no rosto de soldado, enquanto minha mãe padece em mente. Tempo para consagrar o estímulo de silhueta que se ri dos automóveis e alguém viu ainda o meu amor?

Uma noite sonhei com uma mulher de cabelos compridos escuros, algures na Irlanda, era noite cerrada e estávamos ali numa encosta verde, nada mais. Talvez menos sonoro que o ponto mais alto de Lisboa, cerca de 1, 32 cm que o Castelo de São Jorge, aqui em Campolide. Assim o disse um ser de óculos que se encontra com outro de boina em frente ao cinema Tivoli, aos Sábados. Já é domingo, o raio da cabeça, meu modo de vida, teima em manter-se e acedeu em desejo a um perna de pau. Como nasceu o dia, ainda uso a uma t-shirt parisiense, até enjoar a vista da disciplina romântica. Porque tocam as bandas nas aldeias e eu que queria cortar o cabelo e dedlhar mais fresco a viola que de fulgor, jaz em sentir, toda a lembrança emotiva, por esse país fora.

Deixa-me contar os dias desta rasura, eu trato-te bem, tenho o bem estar de um guia, que dá exclusivos a amigos, das rondas à minha volta ou ‘gags’ como diz o juiz daqui do bairro.

Desde que o sol pende sobre esta rua, alguém lá fora, alinha seus olhos no poente. Eu aqui, escuto as simulações urrantes e resolvo traçar um real assento, que até é macio.

Um pequeno e manso silvo, chega-se à campanha que revolve por as veredas, os seus murmúrios, que são a melhor paisagem que ele em si encerra. E a elas, a este volver, entra o ofício que julga nunca ser, senão a última lágrima seca…

E ela chegou de porta branca entreaberta como o jornal sem avença, atrasando o pensamento às ferramentas do lugar sem chave. Era agora um frio atencioso, que grita por ti rapaz. E ele avança contigo, para onde o eco é valente. Tonalidade granítica e claramente eléctrica segundo a regra do gatilho de ouro, junto ao polegar de estrada. Espera por ti, sente-te assim, rapaz.

A cada erguer, a cada suspiro arrumado, ele armava o corpo, diante do português que mente bem, enquanto que Alexandre, pedia a si, no sorver da bica, que se calassem, lembrando a Olga e o seu estranho sentido para com estes nativos lusos. Mas eles continuam em nariz vermelho, cada qual cospe mais abaixo, forte e feio. O modo de dissertar à vida é bem mais simples assim. Eu tentei imitar, mas prefiro ouvir os segredos das amigas, daqui e dali. E não existiam ossos para estas suficiências, os dentes rasgavam o pão e pouco mais, facas na boca só para voltarem a ela. Com a sombra já era mais silábico. O crer que dormir, ao lado de uma capela de campo e dirigir vocábulos nocturnos bem baixinhos, enquanto se movem as nuvens mais bonitas deste lugar vago. A emotividade, dista, agora para ele, o rapaz de Lisboa, num jeito que ele abarca sem falhar na ansiedade diária, uma centralidade para melhor se memorizar. É em locais como este, que ele se vê ancorado e se destapa de noite, para pedir que te juntes a ele… A peleja que sonha em músculo é lembrada, nos membros que o fazem mover, assim que levanta a cabeça e caminha direito. Quando de cabeça baixa, algo está então tenso e errante com ele, pede-lhe a mente o sonho e o músculo, sem que falte ar para o exercício de bem receber e assim são estes os seus brinquedos de adulto. E o coração tem latido tanto, que qualquer mentira é bem-vinda.

Tudo para sentir. Tudo para recriar.



Vieram em navios de contra-poder em velas altas e coloridas, a conduzirem um milhar de garrafas de boa esperança. O destino era Lisboa. A partida em Búzios (Brasil). Partiu então pelo Atlântico de agora, com um só navegador, o Alexandre e suas garrafas que colheu em dois verões. Estava nervoso, como sempre, tomou um dos seus Valiums 10 e buzinou sem que as mensagens soubessem que iam ser dirigidas a outro povo. E os locais banhavam-se nos seus leitos. Mais à frente um café e a navio Elixir, avança imponente, para a velocidade a saber e nas horas por zelar às garrafas. Elas agora estavam deitadas, num cobertor gigante de veludo lilás, a dormitar. Ele ia devagar, a pressa de Lisboa, tinha tempo.

No seu camarim, preparado para os dias, pois a predilecção nocturna era maior, no azul do oceano. Então colocou um pano a preto e branco, tipo Arafat, para que a luz não guerreasse, com a audição. A essas lutas ia agora conhecer e por vezes ajeitava-se sobre uma escrivaninha de madeira frondosa e que lhe guardava os papéis que começou a juntar logo na primeira noite. Escolheu a rota e deixou o computador de bordo alinhar-se por linhas conhecidas dos manuais modernos. Era anterior à mediática do automático, mas assim podia tecer melhor seus planos para a sua cidade. Eis que deambulava com seu yo-yo pelo poente, um truque para estimular a intuição. Depois ia tomar conta de suas garrafas. Começava a falar-lhes de aventuras e sonhos, depois cantarolava-lhes baixinho, estavam bem os dois, que ficavam horas juntos a conversar. A sensação de que a paz era soberana e o mar o espelho do céu, sobre o desenho de berço, vista lá de cima. Para sentir a tempo, esquecia tudo na ladainha escrita, já no serão estelar. E de onde escrevia, via melhor o horizonte, qualquer que fosse. A onania era feita à socapa, mas elas ouviam, pois eram desígnio de intelecto romanceado. E alguns peixões ou cardumes acenavam à labuta e percebia-se quem por ali andava. Quem mais acrescentasse luz era amiguinho e quase da silva.

Certo dia, ao leme, vestido Macedónicamente (assim quis a tara), jurou ver um peixe-punk, que emergia à sua frente, todas vezes que coçava a cabeça. Então resolveu rapar o cabelo e mudar de roupa. Agora estava de jeans, t-shirt mal passada, descalço e a sua boina de estimação. Para seu deleite massivo, os cabelos do sol, estavam a ser lavados pela chuva e compreendeu que todo o ser é símbolo de intemporalidade. A cada lavadela de rosto, justificava a sua missão, confiando nestas referências de laboratório ondulante. Recorreu a um chocolate e umas castanhas do Pará, ao mesmo tempo que media a temperatura da intuição. A corda do yo-yo tinha-se rompido e e de imediato a noção do futuro, à hora do poente, vinha em sintonia com o crescimento do cabelo. Estava mais seguro agora, no corte de cabelo e mais sexual, para se explicar à comunidade livre, das suas épocas posteriores. Os peritos, dizem que é necessário, anotar as coisas do lado direito do peito. Peritos da razão, convenhamos. Para Alexandre, seria do lado esquerdo, todo o princípio da decisão contemplativa. E assumiu ao 9º dia de viagem, a sua assistência às catástrofes sem fim e para isso fundou um pensamento livre, tirado da aurora, pouco antes de adormecer. Nesse momento, o ser era a mais alta comemoração da fragilidade. E o senhor músculo a pedir desculpas à sua cama. Tem esse defeito, ser difícil dizer que não somos sempre halteres, as barras perguntam, porque passamos tão pouco tempo erguidos. Aí vai o horizonte a caminho. Land Ho!

Junta teu respirar e trás contigo 3 livros: o livro do medo, o livro da coragem e o livro da liberdade. Inale eucalipto e aguarde um momento, estamos a resolver seu caso, entre alma, tenha calma: como dizem os escoceses Reid & Reid ‘every dog must have his day, and then his got to pay and pay’. Um solitário cruza-me, na sua embarcação, acena com os dedos, eu não percebo. Ah, eis que é mudo, vejo agora pelos binóculos sua linguagem e eu respondo com sinais de luz, com um espelho de fazer a barba. Diz-me que aprendeu espanhol em 4 semanas. Mas espera aí, espanhol-mudo? Era um mímico reformado, vinha de Hamburgo e dedicara-se a isso e lançou um grito, no meio disto tudo, até eu perceber, que nenhum de nós sabia de nada das coisas da terra.

Beija-me na relva do convés, é verde das algas que retirei, para definir-me aos olhos que tenho. Estes variam consoante a luz e agora, que este cargueiro rejuvenesce noite após noite, dou badaladas num sininho, na hora do beijo à luz da mensagem engarrafada. E são muitas luzes, sobre o rosto, onde mais ao centro, apresento lábios finos e sem o rebuçado peitoral, impedido estaria de soltar os anjos. Sim aqui também os há e impressionam, pela abertura de asas. Têm sido eles os meus revisores críticos da leitura legível, assim planam polidos, sem comicidade aparente, mas bem explicada, com suas silhuetas. Cada vez que toco o sininho, eles vêm espreitar a minha mesa e combinamos os segredos para Lisboa.

‘I wish, I wish, I wish’…

Suspiro colorido pelos mundos sem vergonha e filtrados pelo traje, em cada ser que boceja e abre a boca à liberdade, ao espelho em que estou agora. Oro sim, a meu modo, de joelhos também, como fazia um amor que tive. Ontem era corpo fotográfico, estava encostado no porão, junto delas, senti isso. São boazinhas, com a sua graça de lua encalorada. Então, fui à salinha de musica e fui para junto dos Crime & The City Solution. Ui, que guitarra! Cada pedaço de gravidade, recolhida das nuvens para as cordas e assim Alexandre, iria bem mais leve, como volúpia de baloiço. Também aí se recriava, no escorrega, onde lá de cima deslizava para uma areia solta e bem caricaturizada. Voltar ao apelo, deixar as malas, dissolver o pranto, falar de rock na Feira da Ladra, as meninas de preto e saia comprida, Campolide, as castanhas, as cerejas, as uvas, as laranjas. Ao 15º dia, ia assim, sem saber que mais imacular no tempo de betão. Templo de encontros, pensava, com botões e alfinetes com um coração guardado. Falar, passear, contemplar, 3 graus de teor absoluto. A precisão, era a figura de seu porto de Lisboa. Ó Tejo, meu doce Tejo, anda cá, que sou teu, fala-me das cruzadas de sempre aí em ti. Xiça és um poder de arfar. Adoro-te, meu bom amigo.

E as manhãs já em alarde. Chegada.

As mensagens seriam entregues, em dois rios, O Tejo e o Douro.

Far-se-iam para o Tejo, 100 travessias (ida e volta), deixando de cada vez 10 garrafas, quinhentas portanto, no Tejo. Compraria o passe combinado, seria mais económico. Depois, a Régua, seria a cidade, onde deixaria o restante de milhar. Ia no Inter-cidades e pernoitava por lá. Mas jogaria-as de uma vez só. Digo-te uma coisa, depois disso, estaria um altar no mar onde trilhei, estariam de volta a si, mesmas. Viagem de corpo-garrafa. Assim chegado Alexandre o fez. Muito discreto. Pediu ao anti-amor que o ajudasse na logística e tudo se resolveu em 2 semanas. Acho que agora posso verificar os tempos de coração.

Ei, que estás a sonhar Alexandre? O mundo vai de mão dada, a fazer amor pelo sacrifício de te bem querer despoletar oniricamente. Mas não sei quem és, Amor de Mundo a tempo inteiro. E se te fores, eu não vou aguentar. A cidade corre ligeira a par da saudade sonhada.



Entrou em Janeiro, era um pensamento. Pedaços de cumes floridos aos 17 e pele para tocar, talvez no marco geodésico ou nos teus Linhares. A esta hora não há homens de café, encostados ao vazio, eles estão longe daqui e nós podemos quem sabe escutar-nos ou sermos amantes. Eu digo que gosto de ti, enquanto sorris em negro, a águia observa outras coisas, a esta hora. Estamos para nós um pouco, que dizes Ónix?

-Procurei-te nas minhas noites sem frutos, Unic, chamei-te pela cerveja, se soubesses…

-Eu andei comigo lá por Lisboa, nas noites, nos dias, Ónix, tendo as montras como meu espelho, na Baixa, onde fosse, havia eu e eu, com o resto e não me importava antes de te ver o rosto. És bonita!

-Obrigado. Que tocavas há pouco na viola, na tua mesa de pedra?

-Uma melodia que eu descobri por mim, é simples.

-Eu gosto.

-Obrigado, Ónix.

Era Agosto no campo, em Portugal. Numa tarde de verão, Unic tocava a sua viola na mesa da pedra, de frente para o portão. Eis que se sente alguém a abri-lo. Uma rapariga vestida de negro entra, olham-se ao mesmo tempo e foi assim que se gostaram. Unic ia espreitar nos limites da propriedade à contígua de Ónix, para vê-la no seu jardim, pela manhã, pelo fim de tarde, quando não estavam juntos. Que bela era para ele, quando ela se passeava inocente. Desenhou-a à noite, em pensar, vezes sem conta e não dormiu nada. Acordou com o pai a chamá-lo para ir buscar o pão. O pai disse-lhe que se fosse rápido, que tinha uma surpresa para ele. Tinha adivinhado o romance de ambos e decidiu patrociná-lo enquanto pudesse. Encarregou-se de acordar com a família de Ónix, um passeio à barragem. Unic não falava muito, quando soube do passeio, disse que se ia arranjar, fazer a mochila e retirou-se para seu quarto, onde via um pequeno horizonte até ao jardim de Ónix, que uma nogueira tapava um pouco. Antes da hora, trepou essa árvore e ficou lá em cima uns largos minutos a pensar. O mundo girava pela psique que pouco duvidava, nesse verão.Lá foram depois do almoço, para a barragem: Unic e seu pai, Ónix e sua mãe, o Miguel e seu pai Renato, da mesma família dela. Foram alegres pela estrada estreita. Eram os pais que falavam mais. Miguel era do Porto, ela de Aveiro. Teresa alegrava-se com estas férias, mãe de Ónix. Via-se muitas vezes sentada num penedo a ler ou a passear pela estrada. Unic via o corpo de Ónix mover-se pela margem do rio, pegando em pedras. Pouco depois, ele ensinou-lhe a lançá-las sobre a água de modo a que fizessem ricochete e que durasse o voo da pedra. Ónix sorria. Miguel acercava-se da extremidade das folhas das árvores e pensava. Enquanto os pais recordavam outros tempos, os filhos juntaram-se um pouco.

-Um dia venho morar para aqui. Disse Miguel serenamente

-Eu também. Quero vir para aqui um dia. Disse Unic de olhos calmos E tu Ónix?

-Não sei vos dizer, quero fazer o conservatório talvez. Se calhar vou para Lisboa…

Eram eles serenos e belos os três. Os pais um pouco magros e gastos, excepção para Teresa, que tinha ares seguros e rosto pouco marcado pelo tempo. A aldeia respeitava estes filhos da terra, que faziam vida entre doutores, nas grandes cidades. Ambos filhos e pais, eram tratados por menino ou menina. Nenhum deles, conhecendo Mário Soares, adivinharia a alhada em que este meteu Portugal após 1986. Eram pobres os portugueses sim, mas genuinamente alegres.

Unic via seu pai a lidar com a sachola, pouco depois começou com seu sachinho verde, a remexer na terra, depois com os grandes e de várias formas, na forma como entram na terra. Voltar à cidade, afigurava-se cada vez mais perto.

-Ónix, vou te escrever, posso?

-Claro que podes!

Miguel, andava consigo, previa que o regresso à terra era a melhor via. Um jantar entre todos, antes da partida. E nas manhãs de regresso, de saco de batatas no topo do carro, azeite, fruta da época, frutos secos, flores selvagens e fôlego para o que viria, muito fôlego. Os rostos estavam prontos para a guerra fria, anunciada num planeta cada vez mais escuro. Que o diga a Floresta Negra, na Alemanha.

Lisboa 1988



Uma vez mais os humanos. A Rua do Carmo, a Baixa em geral, tal como estavam e o grande incêndio do Chiado a 24 de Agosto. Quem não fosse lisboeta, não poderia perceber a dor de o ver assim sem nexo, como se veio a ver no final dos anos 90, depois de uma década em obras ali. Choravam os trabalhadores, os amantes da cidade. Unic nunca mais pôde entrar no Grandela, entrar livremente por ali adentro e ver tudo sem que ninguém chateasse. Aníbal Cavaco Silva estava no poder, os Xutos & Pontapés venderam-se nesse ano, ao mesmo tempo que Pedro Ayres Magalhães levava avante o seu projecto de cariz nacionalista (os Madredeus).

Unic, decide sair do país. Vai andar pela Europa à boleia. Em Den Hagg, escreve a Ónix.

“Ónix: Ontem estava a dormitar junto de uma escola e fui acordado pelos faróis de um carro da polícia sobre a minha cara. Depois andei algum tempo até descobrir esta pequena igreja de tons castanhos e telhado preto, onde agora estou e te escrevo. Estou sobre a relva, uma pequena luz incide o suficiente para esta missiva. Atravessei a Espanha de uma viagem só. Andei por França algum tempo, depois a Alemanha e agora a Holanda. A casa caracol em mim é o pensamento de lugar, de poucas fala sou, já me sabes assim. Talvez seja mais intimista, como na nossa aldeia, onde nos tivemos. Vou pelas ruas e tiro notas de cabeça, servem de afecto toda a luz de cada rosto e pouco adianta falar. Mas estou farto, quero regressar. E de ti as saudades são vastas. Em breve estarei em Lisboa, vai depender da sorte nas boleias. Unic”

Ónix entrou no Conservatório e ia morar nos subúrbios, em casa de parentes. Era outra cidade, de ritmo puxado. Mas sempre ia ao Bairro Alto, beber a sua cerveja. De negro como era seu hábito.

Miguel, andava pelo Porto, nos estudos, nos cafés, nos livros. Ele era o equilíbrio dos três. Os pais na rotina que morde cronicamente. Teresa era professora de Educação Visual. Renato era professor também, mas de humanísticas, o pai de Unic era funcionário de um banco. Unic teve sorte na fronteira com Espanha, um TIR de um português deu-lhe boleia até Lisboa. Unic fez de conta que ouvia as anedotas do camionista e pedia-lhe sempre para explicá-las, assim divertiam-se os dois, pensou. E pensava em Ónix. Trazia-lhe uma caixa vermelha redonda e vertical, com ícones místicos. Sabia do gosto dela por Bosch. Unic reencontrou os seus colegas e amigos de escola. Estes continuavam a estudar.

-Unic?

-Sim sou eu. Ónix! Então, como estás? Cheguei ontem, deixei recado à tua tia.

-Sim. Saudades tuas Unic. Vemo-nos hoje?

-Vou-me lavar e encontramo-nos às 4, à entrada da estação do Rossio, pode ser?

-Sim, claro! Trazes-te novo?

-Por ti, para ti e por tudo, um molde de sensibilidade, depois falamos.

O que servia estes seres, na cidade? Os céus eram menos estrelados, a liberdade da cidade habita menos no corpo, mais no rapto das horas. Qualquer semelhança era a novidade jocosa de Ónix, logo de seguida.

-Olá Unic! Tenho uma boa notícia!

-Olá, conta!

-Encontrei uma carteira com 5 contos! Era de um polícia. Podemos sair mais logo antes? Íamos ao Ritz Clube por exemplo. Que achas?

-Sim, vamos. Às 9 e meia no mesmo lugar, está bem para ti? Assim descanso mais um pouco.

-Combinado.

Beijaram-se, seguiram pelos Restauradores, viraram à esquerda e depois à direita e ali estavam, no Ritz Club. Era noite de baile, havia mesas alinhadas, eles sentaram-se, duas cervejas, abriam caminho para a noite. Pouca gente, estava-se com alguma paz por ali.

-Ónix, trouxe-te uma fanzine francesa, de uns tipos que conheci em Lyon. Contra os carros. Ele era gay, o Yves, muito simpático. A gota de água foi a morte de seu gato numa estrada. Vou traduzir e penso fazer eu uma fanzine também.

-Não é nada fácil esta cidade. O stress, a confusão, como te dás aqui, Unic?

-Habituei-me desde cedo. Mas penso que tal como o teu primo Miguel, irei para a nossa aldeia.Vamos ver. Agora é lutar, por algo que li, senti, pensei. E hás tu.

- Unic, vamos ao concerto dos Jesus and Mary Chain?

-Ya! Vai ser altamente!

Chegou Novembro e vieram eles, de feedback, filhos do punk, de guitarras de rock masculino e feminino. Ónix e Unic andaram à procura de um cartaz para arrancar e conseguiram, ficou metade para cada um. Juntariam as duas, quando viveriam juntos, disseram um ao outro. O pavilhão do Restelo estava a abarrotar. Primeiro foram para as bancadas, mas Unic, num ímpeto pegou pela mão de Ónix e levou-a para junto dos músicos, estavam em frente a eles.

-Olha este ‘Just like honey’, não é fabuloso?

-Unic, és tal e qual o Jim Reid. Estou bêbeda, mas nota-se bem. Porque não fazes uma banda também?

-Ainda toco mal, talvez, tenho amigos de uma banda punk…

O feedback alucinante enchia a sala de suor e entrega. ‘Some candy talking’, seguia-se.

Foram depois a pé do Restelo até ao Rossio. Estavam felizes. Beijaram-se muito, na estação, aquecendo os corpos e o êxtase da noite efusiva. Partem ambos. Um adeus de janela, sentido…

Mas Unic, entra no comboio e vai com ela até Campolide. Aparece o revisor e Ónix roga por um perdão, pelo amor entre os dois, com um sorriso. O acenar foi mais intenso depois. E depois Unic vagueia por Lisboa. Ia fazendo as suas coisas, a par dela, preparando algo.

Lembrar a proximidade do coração, a do organismo de mulher bem explicada por Ónix, e dizia para si,’Ó Deus, MerryCrassmas’, antes de escrever nas paredes de Lisboa, algo impercptível, em palavras, note-se. Para ela, para Lisboa.

Unic lia uma fanzine do Outono de 1986, a ‘Da Frente’, que comprara numa livraria ao Chiado, que hoje é uma loja de luxo. Estava num banco de jardim, ali ao Parque Eduardo VII.Por trás, tinha o Hotel Meridien, de frente a confluência para a Estufa Fria. Costumam estar putas por ali, os jardineiros do parque, camionetas que vêm dos subúrbios, transeuntes daqueles das 9 às 5, alguns velhos. Parou para ler este texto de um diário de Laurie Anderson: “Enquanto espero o meu almoço apressado, aproveito para me desembaraçar destas linhas, há muito que não pegava na caneta (pausa para as vitaminas).

Hoje acordei com uma disposição anormal. Levantei-me cedo e sentia-me bem, como que depois de algumas horas de sauna.

Colei o nariz ao vidro, estação de paixões e alergias, pela primeira vez este ano, senti a Primavera. Não que tivesse dormido bem, de facto passei o tempo todo às voltas (outra vez a porcaria dos excitantes) depois de noites como esta é quando me sinto melhor, é como saísse de um turbilhão esclarecedor.

6 horas de sono, o sonho e o barulho - lá fora. Passo de um estado ao outro, reviro-me e de manhã acordo com a cara de ontem e mais um palmo de olheiras. Por falar nisso, hoje o espelho revelou-me umas quantas verdades, mostrou-me nua como eu gosto, quase transparente. O espelho, é a única coisa com que me dou bem de manhã, não me aborrece, não me pergunta nada. Fico em frente dele muito tempo às vezes especada-fascinada. Só nos separamos quando apago as nódoas, quando tapo as brechas e os becos desagradáveis.

Sinto-me sempre feia de manhã.

Depois de noites como esta é quando estou melhor, um bocado cinzenta as rugas que se alongam. Adoro este rosto estampado n’outro mundo.

Maquilhei o personagem para hoje, enfiei a camisola de riscas azul e branca. Marinheiro ressacado.

Lá fora, apetecia-me andar aos saltos e andei. Tinha sido tudo lavado…

A fumarada, a distorção dos rostos, o tédio, tudo brilhava como metal polido. Que sensação!

Apetecia-me respirar a rua em plenos pulmões, tirar proveito da desordem. Sentia-me no meio, pertencia às esquinas

às montras

às sarjetas

Esta cidade é um cubo de arestas cinzentas

é a linha cinzenta

15-4-85 L.A.

Unic fumava e leu mais do diário dela: “Mais um balanço matinal, pôr nesta hora as sensações em ordem até chegar o sono. Quando penso, deixo tudo preso por cordões finíssimos e escrevo antes que tudo se limite a nós.

A noite começou tarde como as outras, uma festa igual onde estive, um estúdio abafado em tequilla e ritmos tropicais, as caras do costume e outras mais jovens em grande entusiasmo. Excitam-me sempre, o colorido, as roupas estampadas no fim do mundo com flores agressivas. Bebi até aquele ponto certo, o suficiente para me desorientar e me sentir simpática. Nestes momentos falo sempre demais. Acabei por amanhecer com um amigo antigo daqueles com quem se inventa enquanto se fala, sem direcção alguma.

Abrimos cicatrizes, comparámos a virgindade das épocas sempre iguais mas cada vez mais espessas.

Dantes o belo era o belo, existiam padrões e os poetas viviam entre a súplica e os êxtases de verde e de céu. Agora não se pode ser nada que tenha nome, já não existem bálsamos, mas também é um prazer dar vida nova à palavra, movimentarmo-nos no meio de equações plásticas.

Tenho necessidade de algo que me justifique continuamente. A tranquilidade habita apenas o meu núcleo, tudo o resto é ventania, excesso, paixões inacabadas. Adoro estas conversas de fim de noite arrastadas pela cauda do cansaço.

Ele adormeceu como um pedregulho que cai num poço, eu saí, pé ante pé, depois de o beijar. Não deu por nada. Na rua estava frio, até chegar a casa senti-me como a sombra de um cão abandonado.

L.A.

Pouco depois, parte para a cidade a descoberto. Unic cantarolava: ’some girls are bigger than others, some girls mothers are bigger than other girls mothers’ e uma lata foi dirigida ao pontapé até ao Marquês. Já se notavam domadores e atiradores de facas, no estar consigo, pensou Unic, dentro do metro da Rotunda. Estação carregada, de longos túneis sombrios, onde Unic, por vezes ficava bastante tempo a escutar um cego que tocava acordeão. Quem quiser hoje, estar de perto da estátua do Marquês, tem de ter tendências suicidas. E assim como um terramoto conseguem demolir uma cidade inteira, pessoas e lugares. Como estava inscrito, num desses túneis: ‘Putas ao poder, que os filhos já lá estão!’

Um beijo que me acordou, do corpo em pedra, como ciprestes estendidos ao céu aberto. Era um telefonema de Ónix.

-Unic, esta cidade é doente, mexe-se mal e prevejo feridas graves. Será que o governo tem a listagem dos blues? É que eu tenho mais lucidez que essa escória. Terei, teremos nós de rebentar com eles?

-Sabes Ónix, o amor é oceânico, é frio se sentes mal a trip. Melhor que a droga é o nosso sexo. Eles pobres coitados, vão lambendo o cu uns aos outros, até rebentarem com isto. O povo, esse, gosta de sodomia estática e por compreender. Importamos nós, Ónix.

-Bem, lá vou para Lisboa. Está a custar ver tanta sombra. Tenho o teu amor e o sonho de jovem no feminino. Até logo…

O toque certeiro aos desmaios do sonho, eram focados em cafés de passagem, pela Lisboa velha, a melhor, para entrar na percepção que os navios fazem sonorizar, no belo Tejo. Ela deixava rastos na calçada sem a riscar, dançava para mim sempre, tão leve e estacionária, sem que a linguagem fosse calçada. Eram pernas de mulher que eu via, juntos às minhas e o conflito era inexistente, quase uma canção de nascença. Para completar a geometria, levei Unic a um estúdio de som, a Senófila, ali ao Conde Redondo. Peguei no microfone com letras em inglês, da nossa música cinzenta, enchi a mão com a voz e tomei de assalto a pose cândida dela. Deitou-se no chão e voámos durante uma hora, entre instrumentos vários.

Lisboa 2003

O meu chapéu de chuva, está no lugar onde certo dia aí me baixei e bati forte com a cabeça, por uma curiosidade a um jornal deixado no caixote amarelo deste café, que não tem nome ou letreiro.

Os vidros do 58, estão embaciados, deve estar insuportável a civilização em Lisboa. E hoje foi a antestreia no CCB, do filme da Patrícia,’ A mulher que acreditava ser presidente dos Estados Unidos’ de João Botelho. Eu não fui, foi a minha mãe, no entanto deixei a Pat, missivas que foram para Belém de Lisboa. Do Pará vão chegando cartas, dinheiro e selos. Estes, troco por uma bica, pois o Chico que toma speeds e é gordo efeminado, colecciona-os, enquanto vocifera os nomes de todos os clientes do seu café, tropeçando-os às vezes, no meio desse speed. Raquel, Alexandra, Filipa, Ana Bacelar, as amigas de Campolide. O Carlos de Aleta (Mafalda), pareceu-me um rapaz dado, afinal o modo como disse, “no café do Chico”, revelou-o e também parava no Esteves (Bairro Alto), conta cerca de 27 anos. Já a Mafalda do 13-49-DL, (o seu Twingo vermelho), faz-me as delícias que são irregulares, mas boas. E recordo um comentário de Ana C. Em 1988,depois de uma longa caminhada em Lisboa:’ há uma recompensa para isto’, Seria a da entrega e a da abnegação. A minha última incursão pedonal, foi intempestiva até ao Marquês. Tentei disfarçar-me no olhar, mas nunca ninguém me presta contas a ele, os motorizados.

Ónix fora passar o fim de semana a Aveiro, com os pais. Imaginei uma outra Ónix que se chamaria Lígia e escrevi isto:

Agora é tarde, umas 3 da tarde, aproveitei a ausência de Ónix, para voltar a mim e para a minha casa, que é o meu quarto. Uma conjugação orgânica, pede assobio.

Tenho deixado escapar expressões de rosto, que nos tempos de Isabel eram fechadas. Agora, deixo-as cair, sem que alguém reconheça sua origem. Tento aquecer-me. Pelo café umas vozes colocadas em reforço do som, assim consigo parquear a inquietação da cafeína sem o Valium 10 mg. Mas a minha própria voz cansa-se, havendo muito fôlego de uma só vez, libertando a latência de uma noite completa, comigo. Vou vendo por agora os habitués desta hora, pegando nas deixas, pensando nas madeixas.

Do século XXI, a camuflagem estética dos rostos, que eu desmascaro muito bem. Resta em mim, de forma clara, Patrícia.

A assimetria do tempo, a veloz pausa da noite faz de meu corpo um estandarte-torpedo. Quem sou hoje na rua? Um fumador de estrelas, sem mimos, com uma pala capilar decidida e uma calçada demasiado tortuosa. Assento bem na rua. Mas o corpo em casa petrífica, na rua excede-se de se sentir. Em casa, há a mente, a memória. Pensar em público é difícil.

Ónix adoecera. Fígado, assim mo disseram.

O meu trono mágico que o meu corpo engolia, em vasta e profunda fé, estava acamada e eu, tal verde hera, sem poder escalar nos dedos vivos o domínio de Ónix. No Domingo seguinte, sento-me junto à soleira da Pastelaria Deliciosa, de cigarro na mão e olhos de antemão ao redor. E penso forte, pela vereda actual, própria do ermo. Um estatuto teatral, onde a cortina tem insolações, diante do diâmetro da fé. Ondulo então o rugido da mão, berço vivo do tacto.

Calculo que nos Restauradores, o obelisco sem fala, comente a prece do pombo, calando a orgânica do transeunte que passa.

Vou rezar um poema a Ónix:

O túmulo acima da cor

Só sobrevive na honra correcta

Da piedade que assoma a dor

Da ligeireza intacta e certa

Do ventre, do ninho

Às manhãs de costume doce

Eu por ti adivinho

Se a vida mistério te fosse

A segregar-lhe aroma e coração de alma, que deles preciso…

Há poucos roubos em Campolide, mas Mafalda ficou sem um leitor de Cd’s, instalado no seu automóvel. Eu não fui, prefiro roubar cartas de mim, olha esta Maf:

Lígia,

Esta noite, foi especial. Ajudei uma rapariga da tua idade, (que canta no coro da Gulbenkian e estuda violoncelo) a pôr o carro dela a trabalhar. Depois demos uma volta, até voltarmos à nossa rua. Dei-lhe cigarros, poucos pois ela canta e ela conduzia, falava, e em silêncio q.b., eu olhando-a quando podia. Foi agradável.

Pena, não poder de algum modo estar contigo, seja ele qual for. És um enigma tão acessível e não te alcanço…

Ónix, deixa-me contar poemas desta idade, quero-te bem. Alguma coisa que tenho é alma para ti, como dantes dessa cama, num lençol grande demais para ti:

Aberta a castanha, uma mão

Afasto o ouriço boquiaberto,

Sobem os ventos em dicção

E o paladar do tempo certo,

Das horas de Inverno, do ente,

Que este afinar ceifa a sós

Então escavo todo o alfobre ciente

Para saudar a tua voz

Passadas muitas cartas, sem que Teresa mo dissesse, Ónix estava prestes a morrer. E já estava por esta altura. Parti a minha viola furiosamente contra a parede. ‘She’s bloody fucking dead!,’Himmel kreutz sakrament’ gritei em inglês e alemão. Lancei-me pelo meio das ruas, a brincar com a morte, com os carros, parti caixotes do lixo, gritei, andei à pancada com muita gente. Senti-me abandonado sem que o pedisse. ‘Jesus died for own sins not mine’ Crass records, pensei, para acalmar.

A noite quase calada, o tempo contado, sonos diversos, mais uma noite comigo… O reparo da minha nogueira, que nunca mais quis ver, era a colheita da minha sombra favorita. Miguel, parco, disse, para ser humilde e assim não perder a razão do meu intelecto. Trocámos cartas, durante alguns anos. Ele por fim, foi para lá, para a nossa aldeia. Eu nunca mais fui ver a nogueira, evitava descer e dormi noutro quarto. Falei com ele, a modos calmos, sob folhas e ar puro.

-Miguel, és o primeiro sonho de vida que vejo correr. A minha agora é outra vez Lisboa, sempre Lisboa.

-Olha Unic, eu vou lá baixo a Lisboa quando precisares. Mas acho que vais conseguir. Toma conta de teu pai, ele ajuda-te e tu vais ser o futuro dono das terras, precisas de estar bem.

-Sim, vou fazer disto, de novo o melhor terreno da aldeia, ou talvez não. Daqui a uns anos, de Lisboa eu digo-te. Um abraço Miguel.

Para recordar-me como Alexandre, lembrei-me da segunda metade da década de 90, de uma professora de filosofia. Voltara ao Liceu Feminino Maria Amália Vaz de Carvalho, para completar o secundário. Encontrei uma disciplina que detive bem, a de filosofia. Não só pelo conteúdo, mas também pela professora Teresa. Teresa, vestia umas saias curtas, que sem serem sensuais, eram práticas, calçava umas botas castanhas pontiagudas, tinha o cabelo estendido e encaracolado, um rosto interrogativo e uns olhos azuis semi-escuros. Era ágil fisicamente, tinha uma paciência enorme a explicar as coisas, falava muito rápido sem nunca se cansar e escrevia velozmente no quadro verde da sala térrea do liceu. Lembro-me que no meu primeiro teste tive um 16 e fora a melhor nota. Mas o melhor para mim de Teresa, era o caminho para nossas casas. Como vivíamos perto, vínhamos os dois do liceu a pé para Campolide. Teresa, andava muito depressa como eu, isso atraía-me. E também, não olhava para os carros ao atravessar a rua, fazia como eu, pela audição, se vinha ou não automóvel. Íamos pela Rua Rodrigo da Fonseca, virávamos à esquerda na Rua António Padre Vieira, entrávamos na Rua Artilharia I, atravessávamos a Rua Marquês da Fronteira e seguíamos para o nosso bairro. Sei que lhe fazia muitas perguntas e ela acedia a bons modos. Numa das aulas, pedi-lhe que me dissesse quais eram as 7 maravilhas do mundo, no dia seguinte, trouxe-mas por escrito. E elas são:

- As pirâmides do Egipto

- Os jardins suspensos da Babilónia

- A estátua de Júpiter olímpico

- O colosso de Rodes

- O templo de Éfeso

- O mausoléu de Helicarnasso

- O farol de Alexandria

Eu moro na Rua General Taborda, ela morava mais baixo na Rua Leandro Braga. Um dia de tarde, fui até à sua rua e reparei numa pequena varanda em forma de meia lua. Pensei eu, que fosse o jardim suspenso da minha pedagoga, mas era tão só a minha visão colada à atracção por Teresa, a minha professora de Filosofia…

De novo palpitações, colado que estou a tantas luas de estímulo. O uivo não se ouve, os olhos sim, sempre corredores de fundo e abertos a decisões. E agora, meu cigarro fumado?

Houve um dia em que cheguei só a Santa Apolónia. Olhei para a esquerda e aproximei-me do rio que guardava um navio russo. Tomei o gosto e explorei-o de ponta a ponta. Quando já estou numa tasca junto à estação, peço uma ginja e o senhor diz: “você trocou-me as voltas!”. Eu fiquei atónito. Como sabia ele das minhas voltas?



Não tenho um ente directo, sou um elemento em ascensão que sorri por si, dando meu espaço a quem quiser ficar. E por aí, a precisão do peito é a medida que o tempo faz cumprir. A linguagem exerce a perfeição, justificando-a. Entrem delicados, usem as raízes e os poros. A única tábua suave é o leito do conhecimento. Elegê-lo em formato sóbrio será mais credível, que o cume tem oxigénio suficiente.

A estrada das Beiras, onde vi um homem morto, com o carro esmagado em frente a um eucalipto. Lá dentro a sua viola. A presença de meu pai, impediu a emoção, foi constatar e ter compaixão, nesses Agostos quentes dos finais dos anos 70, princípio dos 80. No final dos anos 80, encarnei um eucaliptossauro, em prol do ambiente, a foto ficou comigo. Numa das feiras da Agrobio na Estufa Fria, levei-a e dei-a a uns alemães do colectivo Parreirinha e com ela chegou carta de Anya, que me levou à Galiza. Acho o egoísmo, muito parecido com as massas do fascismo. Lembro como ela me quis seduzir (a Anya), assim do nada e dizer’ the people in the Komunne like you’, para depois me afastar desse território, onde cresci intuitivamente, agora que ela tinha uma ’couple relation’. Malfadada mulher.

Estar plametade da rua, plametade da dobragem de uma afabilidade preenchida nesta armada negra. A configuração da solidão tem uma estima visível à ausência e há maravilhas por aí. E quando estás só, tens-te estranho sem um espelho humano para contemplar, ou te abstrais em ti e de ti, ou sucumbes ao desespero. É possível desejares no desespero, que amanheça, que não ouças sorrisos alheios. A autonomia, quando saudável prevalece de sua causa a toda a intempérie de existir. Fazer rodar a existência, em exercícios dinâmicos como espontâneos, vindos da vontade de representar a mais bela sensação conhecida até hoje: sentir-se vivo. Os olhos tornam-se mudos e insonoros à noite. Nas minhas noites, a energia bloqueada no peito, um enjoo e cansaço sórdidos como milhares são os pensamentos a resolver. Quem pode suster este peso sem uma voz ao lado? É difícil, ganhar a estrutura de autonomia, mas um simples chá dá alento, sossegando os músculos e a mente. Em seguida, usas a memória, percorres o corpo da maneira mais suave possível. Toda a dor que tu tiveres é imune às sensações de morte. Depois destas energias contrárias estabilizarem, há sempre um palpitar de vida e isso é extremamente belo. Podem voltar e com agressividade o mau estar no plural interior, mas o principal absurdo são as horas em que o êxtase dá conta dos recados da tormenta civilizacional. Absurdo porque por algum tempo, desistimos e em seguida crescemos espiritualmente por um sentir, que ora ingénuo, ora diligente, tem forma de alma. Isso vale por o tempo total de êxtase, afinal as recompensas que experimentei. Como não há teorias de vida, antes uma justificação que se ocupa da vitalidade. Hoje por exemplo estou enjoado de fumar e comer mal, sinto-me todavia além disso

e procuro pela contagem inconsciente das horas, o segundo preciso em que toco a calma. Esta remete-me para o leito e o corpo reveza a mente.

O amor? Hm… A generosidade íntegra e apaixonada a mim, parece distar, mesmo que sinta um carácter a pender sobre tudo, na dádiva, nos valores. Por isso a soma das noites em branco, são um aviso ao dia seguinte, em que o céu ele também pende sobre nosso estar. E ser e estar, compreendem-se, avistam-se nos olhos, no seu silêncio e dúvida.

Sentir o frio de Dezembro pela madrugada, agora que lembro o aniversário de Filipa R., a dois dias de distância. Aconchega-me sempre meus desesperos ela,’and I’ll give you my head and all the things it said, and I’ll give you my soul to…’. Devo-lhe um momento, na minha coerência moral do afecto.

Uma calma restituída num dia assinalado por uma greve geral e 14 anos também depois de ter sido aí, meu melhor ano, antes da enfermidade da dor.

Como serão as sensações dos outros, não as sei mesmo. Estarão dependentes do tempo e do seu comentário posterior à sensação? Porque a genuidade é temida num dia comum? O sol lança alguns de seus braços e a laranja que comi descansa o circuito orgânico. Uma manhã despreocupada é saudável. Mas eis que uma descida (à casa) de Filipa R. e consequente subida à minha, me custou um ataque de pânico dos fortes. E entra uma estranheza psíquica de novo. Será que devo aumentar a dose do medicamento que me regula a Esquizofrenia Paranóide ou será do isolamento? Eu acho que são os contornos do afecto, que me faltam. E não posso fragmentar no pensamento as reservas dele, com a minha dádiva, isso ameaça o bem estar. Oiço vozes nas escadas, decerto minha porteira a falar e sem se aperceber que o faz muito. Está um céu cinzento propício a chocar depressões, mas em mim dado a minha predisposição temporal, faz latir para mim um medo de déja vus. Sinto a presença de minha mãe, que talvez esteja nas escadas e fico adoentado com as coisas dela. A sensibilidade não tem escolha que fareje meu peito sem mo abarrotar de explosivos, sobretudo da minha mãe. Anda há 5 anos no yoga e insiste em ser cruel comigo, até tenho testemunhos de um outro campo masculino enamorado dela, desta crueldade. Quando descia a rua, percebi o quão difícil é falar com gente comum, percebi mais à frente que não estava a pensar forte e na subida e com outra disposição das gentes e da rua temi. E a informação chegou rápida ao cérebro, mas não deitou por terra (agora que comi uma banana), a pequena conversa com Aleta esta manhã. O que será a geração do tudo? Se visse a V.J. Movable, libertava os olhos e a fala, em alguém que sendo complexo me dá mais segurança, por suposta atracção que desse estado tenho. Não tenho um tostão no bolso, a munição que a janela me dá e o calor do aquecedor, que foi oferta, são o meu chá do fim da manhã. Fim de tarde e já noite, depois de um sono buzinado (costume local).

Lembro a t-shirt que o Barata tinha dos Pink Floyd, na altura em que trocávamos as roupas com frequência, nós os imberbes. Lembro a minha barba repleta de cola, num ano (1988), em que experimentei muitos estupefacientes, mas foi só esse ano. O meu coça-costas induz-me aos arrepios, embora aos 31 esteja calejado quanto baste, para coisas como um abandono de minha mãe a mim. Que não seria a primeira. Nunca pensei que os Duran Duran, fossem bons ao vivo. Asseguro que estou mais calado que a arte contemporânea.

Tenho medo de me masturbar, até isso que me acalmava o receio. Receio de me perder no corpo, eu que sempre pensei o acto a dois, no momento, no meu auge amoroso com Isabel. Mas tudo corria bem, pois tratei de atenuar a minha ejaculação precoce com a prática da masturbação e auto-controle, nessa altura. E um auge a meu ego, foram as palavras bem bebidas dela, junto às escadinhas contíguas ao Jonhy Guitar, em que ela diz: ‘o meu homem é bom na cama’. Ela nas noites de sexta aqui ficava com regularidade até às duas/três da manhã, depois levava-a de taxi e vinha eu. Costumava dizer que os Campolidenses eram urradores e agora que identifiquei esses homens, sei da preocupação de uma matemática em torno da memória. Nunca vou perceber o abandono de Isabel, além de outros menores. Porque beatifico Isabel é pelo seu tempo, destronado por uma alma áspera que vi e umas vestes longe da do nosso tempo. Era uma anja, ela, dedicada, bondosa, honesta, trabalhadora, no que tinha de adulta. Desde 1997, que nunca mais tive obsessões, sendo Isabel a última grande história. Uma vez chamou-me Napoleão, após um corte de cabelo. Adorava o seu cabelo comprido e de lhe fazer festinhas. Tinha-a sonhado e tive-a. Depois encontrei nas outras moças, olhares de vida diferentes que explicavam o meu desinteresse súbito a elas. Perguntava se havia um amor além do primeiro, perguntava porquê o abandono, nunca ninguém soube até hoje. E hoje folheava um prefácio ao Estrangeiro de Camus:’ O homem absurdo não se suicida: quer viver, sem abdicar das suas certezas, sem dia seguinte, sem esperança, sem ilusões, e também sem resignação. O homem absurdo afirma-se na revolta. Fixa a morte com uma atenção apaixonada e esta fascinação liberta-o: conhece a divina disponibilidade do condenado à morte. Tudo é permitido, visto que Deus não existe e visto que se morre. O presente e a sucessão dos presentes perante uma alma sempre consciente, é o ideal do homem absurdo’. Hesito em sair de casa, uma fadiga visual e aos sons. Ainda que me chamem de maluco, essas bestas de trote com barriga, eu afino-me à continuidade. Talvez a execução do acto sensível, me seja a definição mais próxima.

Ofereci a voz via telefone público à Pat, ela no seu tom escondido e suave, foi breve como sempre por esta via. À namorada que está doente e que no fim do minuto que uma moeda de 50 cêntimos concede, me diz para ir para casa. Ainda uma tentativa à Filipa R. e seu pai acolheu-me tão bem, que não quis falar das suas lutas e da greve de hoje, pois achei que a sua suavidade de homem pela voz seria somente o recado que queria dar à filha. Tive de guardar o maço de tabaco no bolso de dentro do casaco, pois estava lá um dos ladrões de Campolide a cheirar por cima de seu bigode. Depois dos telefonemas na Pastorinha, fui a uma tasca beber a bica. O lote não é o melhor, mas tem ambiente para sorver a italiana sossegado, ainda que com água fresca por cima. O meu avô na sua casa de pasto em Vila Real, segundo minha mãe, era um território mágico. Das gentes e costumes. A minha tia Leonor tem um quadro com a casa de pasto e sua fachada, ali do lado direito do tribunal de quem sobe a Carvalho Araújo. Gostava de ter calma suficiente para estar com a Patrícia, um elo forte e bem construído em 5 anos. Assim com o mesmo tempo de amizade, à Filipa R. é um outro universo e sinto-me muito próximo dela, depois de a conhecer este ano seu desígnio e agora que parte em Janeiro para Berlim. A minha namorada é pouco adulta e tão instável como eu. Sinto calma, foram 3 vozes suaves e se pudesse pedia à intuição por estas horas tão raras.

Meu pai esteve na guerra de Ultramar em Moçambique. Ficou marcado para sempre. Agora no Brasil, junto de sua mãe, que conta mais que 90 anos. E aí o mato é outro, também há mortes todavia, como a de seu irmão, numa queda de um vigésimo andar em Belém do Pará. Suicídio, acidente, homicídio? O facto é que deixou uma filha sem que em vida soubesse que sua namorada estava grávida. Tenho então uma prima, que nem sei o nome. O tio Eduardo era um homem de personalidade oposta à de meu pai, advogado de profissão, amante dos prazeres da vida, era um homem de posses e muito espirituoso. Chegou a trabalhar com Índios pelo Ministério da Agricultura e foi preciso um intérprete, enquanto mostrava os slides do Amazonas, na sua passagem por Portugal no princípio dos anos 80. Trouxe-me o livro do Principezinho, um gravador ao qual me fez falar. Na segunda vez em 96, fomos ao mercado do Forno do Tijolo, junto à casa de meu pai aqui em Lisboa, fomos jantar juntos, tirámos fotos. A 10 de Junho de 1997 morreu. Coincidiu com a minha separação de Isabel. E tive um resto de ano demente, insolente, não medicado, apesar de me enamorar de duas moças e um pouco menos de uma terceira. A Glória estava sentada num banco de jardim, no de São Pedro de Alcântara. Acedeu a que me sentasse a seu lado, depois convidou-me a sua casa. Ela era muito limpa, cortês, a descobrir-se e fiz amor pela primeira vez depois de Isabel. Não dormi nada, ela sime na manhã seguinte fomos explorar lugares com acústica para ela cantar ao Chiado. Apesar de ela comer coisas do MacDonalds falávamos tão calmamente, encostados ao jardim e ao telefone. Até que decidi que eu não era tão limpo como ela, senti-me inferior não sei porquê e dei a entender que não queria estar com ela, sem que ninguém se magoasse. Até porque ela ficou com a impressão que eu era homossexual, pois apresentou-me um amigo seu que era casado e com curiosidade a esse sentir. Depois veio a Susana C., conheci-a no bar do Teatro Dona Maria II. Entrei e ela acenou-me, eu não queria acreditar que uma moça me acenasse e fui a ela. Ela conhecia-me da faculdade de Isabel, numa ocasião em que tentava vender um bilhete que ganhei na X-fm, para o espectáculo ‘ Os filhos de Rimbaud’. Conversámos e levei-a ao jardim de São Pedro de Alcântara. Do horizonte e da conversa acariciei-lhe os cabelos e beijei-lhe o pescoço, depois beijámo-nos com paixão. Foi um tempo bom, eu gostava mesmo dela, ela de mim sempre a acariciar-me os braços. Cinema, Bairro Alto, até que um dia a herança assídua de Isabel que verbalizava diante dela, fez com que Susana C. me pusesse em cheque e terminámos dentro do autocarro 42 que ia para Madredeus. Pensei nela, tentei voltar a ela, mas não, claro, ela não quis e insisti tanto que já não me fala.

Guardamos os dois um orgulho ferido, a carta apaixonada dela depois do fim e as minhas súplicas ao regresso. E a Sara que era bissexual, toxicodependente e que me levou a conhecer esse submundo. Nada de romântico ou sentido, era apenas uma vontade da libido de ambos e ambos vivêramos as mesmas coisas nos anos 80,apesar de nunca nos termos conhecido nesse tempo. Ela conheceu uma moça ingénua e eu aproveitei a deixa, para me demarcar.

Um postal pelo Natal desse ano a Isabel, sem resposta no 14 de Janeiro, nossa data de namoro e minha de aniversário, soube que o ano de 98 seria para hibernar e passei inúmeros serões em casa da Filipa em Benfica, porque ela me sossegava, mesmo estando prestes (ela) a enlouquecer. Gozei o tempo em que não nos tínhamos em tempo, desde o liceu.

A minha namorada tem amigdalite lá para as Laranjeiras e ainda estou para saber que disparates fez no último Sábado, véspera de seu vigésimo primeiro aniversário.

O flagelo que mais me contagia é a dor alheia, pois fico com ela para mim, não sei porque artes mágicas. Uma vez dormi junto ao Panteão e a Filipa achou esse, um lugar mágico, num dia de incursões pela Graça. Também gostava de ouvir os Parodiantes de Lisboa.

Será que Aleta está bem? Estão as luzes apagadas de sua casa. Eu tento chegar à exaustão, única forma de adormecer.

Ao som de uma batida com garra, numa voz latina e desembarco na excepção que fazem ao pensador. A sua guitarra lúcida empreende pois o céu pedinte. E o tempo de vida, real com o acorde Sol Maior, lembra a origem da palavra cassetete. Assim foi num dia, em que a flor era erguida no tempo interior e do Maio,’ Je te casse la gorge’. Era óbvio o vício das pancadas do teatro moderno, sem expectativa contemplativa. Mais vale passear o ócio e tomar a desculpa do amor a dois. Ser original é menos óbvio, depende da luz, que ressoe na verve. 500 anos, dizia-me o caracol de Nuremberga, para mudar os corações e almas. Eu agora, duvido, dedicado que estou a ser original a um tempo de chuva nos olhos. Arre que há Campolidensses, burros que nem um soco. Só porque um gajo tem vontade de ser estrela e livre, sujeita-se na sua constelação pacífica, a ouvir quem padece como minha mãe também, a do complexo de cintura inteligível. Bem vamos dançar cãozinho, mesmo que o ventre que nos fez, tenha um alfabeto por restaurar.

A amizade abrangente da compleição da natureza, será livro de futuro.

A minha mão encontrou berço no cigarro, as calças apertadas q.b., com uma dobrinha e o sentido sempre presente ao amor. Mesmo tropeçando no instinto à primeira vista de saias. Penso que a violência de amar, me deu muito tempo criativo, assim como a violência de sofrer. E canto,’ I don’t care about the state of my hair’e ‘I’m gonna crucify her’, frases latentes vindas da Escócia. A minha falta de dinheiro não tem uma relação directa com o meu olhar deprimido, a propósito de um comentário sentido, da teoria que o português tem um olhar violento pela falta de dinheiro. O aborrecimento que possuo dos outros remete-me a tal, na retina. Uma vez na cama, tentei masturbar-me e entrei não sei em que mundo, valeu à aflição um chá de tília. Mas o representar do mundo neste código ocidental é decifrável. O jogo do olhar entre Isabel e eu, era tão pacífico… Que aconteceu ao olhar? O lisboeta não tem mecenas, nem se insurge e a minha iniciativa terá origem de futuro, como a escaldada lágrima que habita os céus. Caseiro de uma herdade tenra, exerço a autonomia do tempo, com o brilho cortante da visão de felino. E pulo para a árvore de Rita. Uma moça de Sintra, que ama sua vila e uma árvore muito sua. Encontrei-a num dia de semana, à saída da estação de comboios, após alguns meses de namoro virtual. De voz feminina, olhar anónimo atento a si, levou-me a um bar e foi gira a conversa. Perguntou-me das minhas mulheres, no regresso concedido a Lisboa, no seu pequeno jipe vermelho. Mais tarde, quis que fosse com ela, para os States. Claro que pelas minhas ânsias seria difícil e não fui. Ela sim, mas voltou. Não aguentou o peso americano. Ela é muito de Sintra, a Rita ‘hot pussy’, como lhe chamava. Tenho de aproveitar a solidão, da melhor forma, como na infância. Voltei a ler, começei pelo ‘Estrangeiro’ de Camus. Agora e da estante do Doutor despesista, comecei ’Uma barragem contra o Pacífico’, de Duras. Pensei deitado a noite inteira, até sofrer um ataque fulminante de pulgas, numa altura em que o meu sono profundo já respirava forte. Depois de lavado, entrei na rua e senti estranheza a ela, às pessoas. Baixei a cabeça para ambas. Pensei no dia de hoje, se seria mais pacífico que o anterior. O de ontem deixou-me cansado, com as voltas trocadas da mente dos Campolidenses. Ora afáveis, ora irascíveis. E ofereci-me à minha casa. ‘Vai chegar o dia’,‘…névoa de um povo a sonhar’, ‘se eu cair ao mar, quem me salvará?’

Os ritmos confortantes do chocolate, alisam a gula, parente pobre da libido, assim mo dizem e crepita a língua, enquanto o meu corpo choca consigo. Alexander Platz, lá por Berlim madura, deu de caras mais à frente na noite Alemã, com umas ruínas bem aproveitadas, por um movimento cultural, estava-se bem por lá. Passeei-me com Isabel aí dilatando lusos, a diferença que não importava à folha de erva num foco de luz numa enorme parede. Todos dispostos em amena cavaqueira, lembrando apenas que Isabel, era um bom garfo, no meio das cervejas dispostas ao modo alemão. Mas foi pela cidade de Praga, que nos sentimos muito próximos, fazia sentido toda a beleza aí, com a nossa. Amei-a muito em Praga, num nicho de escola que servia de alojamento, foi a cidade em que nos tivemos mais em toda a viagem de Inter-Rail.

Uma soma de fins de relevo a este hálito desenhado pelo nevoeiro de Lisboa incerta, levam-me a uma proposta de tacto à ordem da sucessão do olfacto, tal pele na lua camuflada. E o peito abre-se do verbo rosa interior.

O veloz espectáculo da boca é em mim tédio de Domingo, quando sai dessa toca. Lisboa cresceu muito mal, em 20 anos. Cheira mal esta Lisboa, tanto que até publicaram as cartas de amor de Pessoa à sua Ofélia e o resto da cidade é ‘sociedade de consumo imediato’ ou seja mastiga-se e deita-se fora. A mim serve-me ao formato reflectivo, esta cidade branca.

Acordei secreto, para caminhar e sentir-me mais vivo, ‘all i want is a dream, something naked and clean’, JAMC.

Lembro grato Susana C., neste Natal de memória activa, das suas mãos nos meus braços em silêncio. Agora que oiço Suzanne da Hope Sandoval & the Warm Inventions. ‘Suzanne is waiting at your door, but all she does is waist your time’, Suzanne…

Rodrigo é um jovem baiano de 17 anos, muito activo em mente. Em si as palavras do tempo europeu/sul americano, conjugam um outro verbo de intimidade para com a vida. Lorelei dos Cocteau Twins, abalos… A tasca de Isabel (uma sopeira), estava repleta de bêbedos e russos, fui o único que não brindei o fígado às cores. Larau larau larau, ó Feira da Ladra, o teu jardim das cumplicidades da década da guerra fria, toca-me!

Manhã cavernosa com o pensar em Patrícia, e eis a luz a chegar. As missivas a Pat são regulares e tudo nos aproxima, até a morte de Joe Strummer, como os dissabores meus no feminino, os dela no masculino. Joe faz falta. Muitos te velaram Joe, acredita, até aqui neste ermo de pedra, cais abandonado onde o velório é diário, sem que os indivíduos saibam que ‘Death is a Star’ no teu ‘Combat Rock.

Tempo prático à poesia de rua, arrastado pela draga nocturna em que a máxima bélica está em voga, no erro sentido. As provações não cessam, tão diárias, no arquivo secularmente esquecido e nada é prova de força, senão no plural do parapeito da aventura. Da janela da Rua dos Douradores por exemplo. O conhecimento é o ente mais eficaz, quando o pólen colide nestas cidades com mais muros que toda uma Berlim dividida. Cresce a Avoadinha, planta desses lugares, deixa de vida em verde erecto.

Os novos humanos portugueses são short dick minded, pouco imaginam, antes um ruminar pachorrento que o sino automático, induz a largos vales de consumo. Virgens em tudo e já conto muitos lusos/as, mas não quebro o ritmo, pois o peso é proporcional à hiperventilação.

Isabel, num dos seus dias comigo fez-me ver os seus seios doces. De cabelo apanhado e no estilo que lhe propus era a mais bela para mim. Tão inteligente como nenhuma portuguesa se me chegou ainda até hoje, pelo parte do coração tatuado. O seu rosto entre cabelos longos, era muito meu, tanto que o via com frequência noutras mulheres e raparigas. ‘Sun grows cold, sky gets black, you broke me up and you won’t come back’ … O corpo de Isabel era esplêndido, desígnio da pontinha de luxúria que as católicas têm. E a vida falada na cama era um caminho carnal, ora de tempestade ora de paz.

Isabel, Isabel! Similar ao céu cinzento, num centro de decisão audaz, ela mudou o olhar. E que olhar era o seu? Deixou tudo entregue a mim, sua vida tornaria-se um gancho de esquerda, um oi-tsuki de punho cerrado, ‘Life is wild life is free’, e todos ficariam com ela na retina, do ardor do seu afecto revezado à destreza do engenho que era a sua alma. Lisboa acordara em frio, eu recordava as curvas do Marão, cantando para o corpo as viagens lúcidas neste território, sem que a era me sorrisse. Isabel, porque tanta gente escreve? Disse.

Se eles ouvissem os Joy division, se eles tivessem morrido duas vezes, cruzado as fronteira dos limites interiores, então sim, seriam válidos, esses novos autores, disse Isabel Mas Alex, não acredito também que haja personalidades fora de série, este tempo não dá sinais nenhuns de grandeza, não há subversão, não há uma luta verdadeira de alma. Deixa-te ir, comigo de preferência. Temos as mentes altas, sabemos novamente um absoluto. Agora, sirvamos as almas, vamos para a rua outra vez, está na hora e já não é cedo. Vamos vencer vais ver. Isabel, disse eu: Lembro um tempo memorável, um trago de liberdade e coragem, tenho ainda isso. Sabes, ocupei-me de sobreviver aqui em Lisboa, em me continuar e algo lá de fora de minha casa, estava tingido para sempre na alma, do que falas afinal. Estive em tantos fogos Isabel, agora estou pleno ao disparo ao sorriso e no combate do brilho, Isabel ‘ Swim in the sea, swim inside me’…

Selaram a união com o corpo. Uma sentença tremenda emanava de ambos, um calor terno e furioso colocava-os nesta frente lusa, logo eles se iriam lançar, agora de raízes mais em raiva explícita que envolve e esgana quem os fizeram parar, num ataque sem medo, a toda a cidade. Alex, escreveu sobre a cidade em carta formal. Era agora mais uma vez, Alex, um rapaz de Lisboa.

Isabel, resolvi falar das cidades um pouco, amanheci cálido sem ponto fixo na voz, mas quis dar um nó à cidade, é apenas um breve descrição:

A concepção da cidade é uma acto contínuo, desde a origem no projecto ao desenvolvimento da ideia, à vivência do habitante. A cidade é sempre um constante identificar de luz, cor, movimento, som em que os sentidos tomam posse da chave de aí viver. E para tal é necessário apreender os códigos, para que o habitante se torne familiar a ela e haja uma relação saudável. Sendo o ritmo de cada indivíduo, declarado pelo inventário sempre em transformação de vias pedonais/rodoviárias/ferroviárias, locais de repouso e acção. O modelo de cidade serve o ideal democrático. Há um ponto de intersecção na confluência do movimento, uma aprendizagem da forma comunicativa com a cidade e uma vontade de edificar um núcleo de vida. Reconhecendo toda a sinalética deste protocolo urbano, o homem cresce com a cidade, evoluindo com ela. Os problemas de uma cidade são pensados antes, durante e depois da ideia da génese da urbe. As decisões nem sempre são abrangentes, na optimização do espaço, necessidades primárias, mas a complexidade por a ser é também uma identidade que origina o gosto desta estrutura, no momento mental em que somos já da cidade. O homem tem em si o instinto, a cidade torna-se o novo mundo, para quase um planeta. Tudo é entregue na cidade, tudo parte dela. As formas tão numerosas de cidades, ora histórico-modernas, ora feitas de raiz ou sempre em renovação, são um mote integral do maior significado de coexistência entre humanos.O espaço é tomado por uma medida de liberdade e avanço na história da civilização, com regras e normas e o significado é preenchido diariamente, numa rua, num passeio, onde aí nos conhecemos como focos participativos. Tendem os habitantes a hábitos, a ritmos, impulsos, necessidades, factores tão naturais, geometricamente distribuídos diante de todos. A habitação é o local de estrutura mais importante para o ser humano, aí se pensa a si, assim como à sua cidade. As formas criadas para que se tenha uma qualidade de vida, encontram-se fundidas na vastidão das formas de comunicar e perceber, tanto a cidade como os demais habitantes. Esta relação é sempre complexa, mas há uma geometria codificada, que o indivíduo aos poucos integra em si. Da cidade activa, há aquela que repousa ou se reveza. Tudo planeado, na forma, estrutura, significado do produto citadino. A imagem é um retrato activo do engenho articulado, por onde alguém se movimente. Encontramos sensações e emoções, no plano de fundo de cidade, em casa ou na rua. A aposta é ganha quando se dão eventos e a população interage como um todo, revendo-se na multidão. Ou em cada núcleo, onde se vive um futuro. O objectivo a traçar será sempre o do bem estar da mente da cidade, que equivale à do homem que aí vive. Se se conseguir esse propósito, terá o urbanismo cumprido a sua tarefa de servir a arte da cidade.

Isabel, quero Lisboa de volta






II CAPÍTULO





A livre estar, uma recordação arejada do espaço infinitamente interior, assim era o seu apelido sensível. Ela, em sessão colorida de borboleta, entrava no dia com uma carga física de enorme notoriedade. As ruas estavam em baixo com a seca e a sua nascente urbana verificava a sede estética dos transeuntes no gingar de anca a passo decidido de volúpia.

Eu pouco sabia do meu nome, era um daqueles que chamavam géisers a si e a toda a ascensão de uma folia de alma. Que diferença a conceber?

Foste encontrada depois, porque a verdade é jocosa na desculpa de te sentir em demasia. Estou adoentado, vim para aqui, saber de ti e um fio-de-prumo torna-se mensageiro dos momentos em que te ergo, nos erguemos, e eu penso que a sedução da viagem em curso é explícita no embarque a dois e depois a todos/as. Feito por adeus, acho que coloco as mãos no cais, que é o parapeito da aventura (disse um poeta) e tomo uma correria pregada ao nível do silêncio. Estás viva, dizem as notícias que me chegam por intuição, não há celeuma à tua volta, dás de ti em soluções contra os muros armados.

200 anos depois da Revolução Francesa, estavas à procura de ti, eis-te convidada para as barricadas. Convives com os radicais brandamente e é bonito ver-te destemida para tomar de assalto as fileiras fascistas.

As nuvens estão com cirros, sentes a prudência dentro da vida, minha amiga?

-Venho contar-te de mim e à minha volta, em nome da paz, dizia Irina. Antes disso, olha isto que escrevi, Human. Foi na minha juventude, à volta da noite:

-Um vulto em vermelho descia a Sampaio Pina, depois da última aula da noite no liceu Maria Amália. Lisboa, 6ª à noite.

-Porra isto de gajo trabalhar e estudar tem que se lhe diga! Dizia o Álvaro para consigo, enquanto se dirigia para o café mais próximo. Não estava habituado a esta realidade. À cidade e à multidão já se habituara. No café arejado pelo vento fresco da noite, alguns jovens, um ou outro solitário, um curioso, duas atrevidas e lá de dentro um negro de bigode ao balcão falava com o empregado. Álvaro pede uma italiana. Os outros dois prosseguem a conversa.

- É como lhe digo, diz o senhor de bigode. A vida não está fácil para ninguém e uma pessoa muitas vezes dá consigo em doida. Inventaram as cidades, meteram lá tudo e todos e agora ninguém quer outra coisa.

- Olha, na tropa diziam para te desenrascares! Disse o empregado

- Pois. Diz o Álvaro, intervindo delicadamente. Estava mais lúcido agora. A bica soubera-lhe bem e diz continuando:

- É nessa base que eles se desenrascam da nossa enrascada e alimentam uma doença, a nossa.

O Álvaro viera lá de cima, das terras do Marão, já tinha passado os vinte há já alguns anos, gostava de estar informado e já tinha passado por algumas

O negro para o Álvaro:

- Um sonho, uma esperança e alguma saudade, é tudo o que tenho. Venho de longe e tenho esta fé, que me move por terras e pessoas.

O Álvaro para o negro:

- A fé que nos faz sentir mais chegados à vida. Também sou fiel a ela. Há de onde venho! Bebemos pela fé e pela vida. Vamos beber

-Uma girafa para mim! Diz o Álvaro

O negro:

-É pá, vê lá se precisas de um escadote! Para mim, tinto. A primeira impressão serviu à contemplação, simultaneamente exterior e interior.

-Meus senhores, hoje é um dia especial! Acabo de saber que a lista onde eu estava para a direcção do clube lá do bairro venceu! Diz o empregado

Um brinde à vitória! Diz o Álvaro

O senhor vencedor empregado agarra-se ao pano, dá um jeito ao balcão, à máquina de café, aos azulejos e os dois recebem uma segunda dose de borla. Estes prosseguem com o diálogo.

-É agradável ouvir o mar, sentir o sol ameno a acariciar-me, olhar o brilho do céu azul… Nas manhãs em que parto para o trabalho tenho vontade de viver para sempre, estou fresco e assobio pelas ruas, tanta coisa a mexer, para conhecer…

- A vida são dois dias e há as palavras, as pessoas, o movimento, o amor…A vida somos nós, diz o empregado

Pois…



Irina, esperou. Human avançou com o seu habitual silêncio, oscilando a cabeça melancolicamente para os olhos da amiga e os olhos dele liam os dela, há muito que se conheciam assim, mas disse: “ nunca te vendeste ao sistema!” ao mesmo tempo que lhe passava uma música na cabeça e lhe dirigia o comentário à sua vontade revolucionária.

Human, deslizava diante do próprio vulto, evocando os tempos em que estiveram separados por uma mesma vontade, apenas a dele, era o silêncio, mas que se identificava com ela e queria saber mais e mais do que a Irina, tinha vivido, interrompida nas suas viagens, para visitar Human. Ele que sempre manteve pé firme diante do funcionamento da espécie.

Ela em abnegação, ele em solidão, ali estavam sem serem vistos, num verde esconderijo de juventude que ainda existia. Em causa estava uma forte resposta da amizade de ambos, entre eles, eles sabiam disso e encontravam-se à volta de pinturas de guerra, sem que se fartassem de estarem de uma só vez, um pouco mais à frente na abertura da batuta mental. Assim que desciam ao povoado urbano, estavam de mãos dadas, era seu fundo de boa sorte, com fundos de iguarias a que a sede alheia, pedia. Entregaram-se a sacudir a pressão dos loucos e dar-lhes voz social. Faziam o que gostavam, enquanto o rio corria tão viscoso como vibrante, as janelas ouviam os seus sorrisos e pé ante pé, esclareciam-se. Pararam, para Human beber água, molhar a cabeça e distribuir água pelos braços e brincaram com os turistas (espécie alheia a tudo).

- Uma vez estava eu a traduzir umas coisas e passados dois dias, deixando tudo organizado, fiz-me à estrada. Quando depois do almoço, liguei à firma, disseram-me: “ -Então turista, deixaste-nos sem leme!” Já aí vou, rapazes, disse-lhes Human.

-E, já agora serviam bem a nação, seus preguiçosos! Irina, sabes que havia um rapaz, que usava muletas, tinha levado uma vacina em criança que lhe fez mal e tinha uma perna de ferro. Dizia-se que ele guardava droga aí. Uma vez andámos a brincar às lutas e eu ganhei-lhe, ao que ele disse: “ seu anarquista de uma figa!” Foi de braços a luta, para ser igual.

Foram a casa de Human e passaram a noite a falar e sempre com uma porrada de cassetes a darem alta voltagem aos seus corações, que em noites de cumplicidade o ouro vestia os olhos deles, enquanto o caleidoscópio das memórias era fertilizado pela linguagem de sons punk. Um gosto pelo osso político, os levara ao céu, sem dureza, numa larga cama, que seus corpos plenos de força, estavam a caminho…

Numa aurora de Domingo, saíram. Eram 5 e 57. Human, pensa para si, tomei-a no meu verbo habitual a ela, depois do galanteio e de dormir sem distância. Como soube bem, saber dela.

Irina, perdoa-me ao meu amor universal, mas quando estou em apuros de nervo, é a ti que escrevo. O legado que deixo, crepita de costas voltadas ao mundo exterior. E o modo como te passeias, é convite sem direcção de intriga, na mesma altura em que o traste da viola passa para o Sol. Estamos assim, eu de barba feita e tu no teu olhar moldado a cinzel. Olhar de culto. E caminho de mãos dadas atrás das costas, vigilante aos corpos nos cafés. Sabes, se oniricamente movo os dedos na chávena, vejo primeiro o rosto teu, sorvendo depois, bate a cafeína e respiro-te finalmente. É assim o ser soldado, no passo mirandês, servindo a causa, evitando a nação e tentando a nudez sem banir o rock.

Circunspecta à descrição, a gama biológica tardava-se nas pantominices de um dia apressado. Não te cales, disse ela.

- 1,2,3, esquerdo, direito, encolhe a barriga e estica o peito…

- Ainda lês nos olhos como antes e ainda és o mesmo? Questionou Irina ao longe.

- Sou Human. Agora, leio para dentro. Às vezes vejo mal o que leio, mas faço-o .

Human lia-se como pauta, logo após folhear a sebe de Irina, num banco ultramarino. E a letra A, retocada no final desta folha, era tão frondosa quanto seria imperial beber um ditado popular às horas em que entrar adentro, era o desaguar pacífico de ambos.

Os beijos de Irina eram dados à mesma altura de corpo.

Resposta de flor, ao ler-te esta noite. Estás vestida e deitada esperas um foco que pensa e aromatiza teu retracto vivo. Eu aproximo a luz e cedo-me a ti, a modos de tacto falado, tu cedes sem pavor, como eu. Abrem-se mais luzes e cobrimos o nosso tom em favor da claridade, como o pavão. As lendas nascem com um condão em emancipação, numa ordenação estrondosa. E passam correndo sem que o tempo lhes faça a barba. Caminhando e equacionando conclusões a enunciar, num ocaso épico. Assim penso, Irina. Que faço com o flagelo presente do passado meu? O ‘No Future’ colocado em 1976, a dar de si, mas não me deixam ouvir música maciça, muito alto. Peço dinheiro na rua para comprar cigarros, para depois escrever. Falo com toda a gente na rua e não devia. Sou o Human, Irina. Um rótulo de garrafa de Whisky, guardado dentro de uma mala de carro branco e pequeno. Nasci no norte transmontano, numa aldeia. Agora, estou em Lisboa, num nicho organizado e a pensar nisto. Olha, posso-te contar como foram alguns jogos de futebol meus? Claro, o autocarro para onde vamos ainda demora. Olha, conto-te outro dia e por escrito, queres um chocolate? Cigarros e chocolate sem recheio. O autocarro não apareceu e comprámos mais chocolates. Fomos depois, para um passeio ameno. Falei-lhe das cavacas que a minha bisavó fazia, ela de livros. Das amoras das silvas, ela da dureza da calçada, que fazia entortar os pés no nosso caminho. Bem, então estava um tipo isolado em frente a mim (eu estava à baliza), em vez de simular remate ou fintar-me (coisa que dificultei, pois tapei bem os ângulos), remata de frente contra a figura, que burro! Realmente! E de resto, ganharam ou perderam? Olha ninguém contou os golos. Sei que fui à frente e marquei um golo do meio campo. Mas nunca mais voltei a esse pavilhão da antiga Faculdade de Ciências, desporto para mim, é ao ar livre. Irina, dá de caras com as estrelas, eu acompanho-a.

A assimetria do tempo nesta veloz pausa do da noite faz de nossos corpos, um estandarte, num rumo à velocidade da luz, hoje na rua. Fumamos em mimos com uma pala capilar decidida. O nosso corpo petrifica-se, já na rua excede-se em pensamento público, assim que lavamos nosso peito como seu registo.

Na clareira do largo, ardem tepidamente as luzes. Os vestígios além estrelas, são folhas lisas no seu corpo verde e o seu sinal telúrico não dúvida do sustento que nos aquece. Sob o teu cabelo, no laranja aurora, encostados às árvores de troncos firmes, que o vento toca. Digo-te de mansinho, Irina: o teu rosto é pronúncia de uma dança leve. A tua letra perto da cama e basta folhear-te sobre o branco nu e extenso, além do cigarro que de ti me exclama, que és tu por mim, a lucidez da carne. Membros sem poiso nenhum, cor a todo o tempo. De soslaio à mente pródiga, Irina, amantes anteriores ao Sol e quase por sobre um trono de magia, que o corpo engole. Mas Human, e as tristezas da era? Olha Irina, neste banco de pequeno largo, a linha que te escuta, o corpo que dedilha a imensurabilidade do que possas pensar. Estas horas vagas, suspensas dos dias normais, escrevem um futuro de plano espontaneamente sensível. Assim através disto vejo tudo melhor. Irina, leio-te ainda no umbigo sobre o ar, ele corre de si a caminho de se detonar, de alguém. Estás a ouvir? Sim continua… a tua fé… O teu decote descodifica-te, Irina. Para haver lealdade e fé à espreita, é preciso saber ver mais que uma vez, vinte, trinta, cinquenta, cem vezes sem conta, como o trevo em alguém. Sabes, um dia encontrei um trevo de 4 folhas, certifiquei-me vezes sem conta, que era verdade. Depois, 20 anos mais tarde, conduzia um automóvel negro e olhei para o parque onde o encontrei.

Agora o resplendor enxuto, norteia-se com um paletó de poeta, para ti Irina. Estive doente no nervo e no osso, tu atenuas os resquícios assíduos de hiper-sensibilidade, sem um disfarce. Quando olho a ti, a noite condescende em nome da paz, que está nua a tudo. Exposta como eu. A bicicleta dupla, é para Lisboa nos ver ao Domingo pelo nevoeiro da aurora, mas estamos a nós visíveis, não achas? Lê-me Human, não pares. Lê a vida, tenho tempo…Havia fogueiras enormes que avisavam, lá no alto das serras, sinais de fé. Somos assim, sentinelas da luz, no âmago da História. O trespasse da noite tem de tem de ser eficiente, no trato, no afago do branco que tens. Vejo-te da serra e estás aqui, via-te e voltei esta aurora para te servir a leitura como doce.

Do comentário do vento sobre nosso movimento de ombros. A história que no aviso ao fumo de aldeia, nos remete a ver a saudade de outra forma, mais omnipresente. Como circular é viver e tu colhes do açude miligramas de água e és delicada, cuidadosa. Falta a embarcação, sentemo-nos. Queres queijo, Irina? Human cortou uma fatia fina e deu-lhe para as suas longilíneas mãos, sentiu-a. Depois deixaram-se assim pelo verde, até voltarem a casa dele, onde ela estava hospedada. E Human falou-lhe da sua infância, de como gostava do campo.

Durante a caminhada silente que oxigena nossos pés, tudo restava imaculado, nada havia a sentenciar senão a colagem das auras entre o largo do jardim. Human, Irina, julgados por si e aqui, o rasto linguístico de duas naturezas elegantes.

Sem querer e por preguiça de si cansada, Human pensa na sua nova identidade figurada. Diz que a perdeu pela cidade…

O líquido do eucalipto limpou-lhes a garganta. Falaram e pediram desculpas mutuamente, por cuspirem amiúde. Ouviam música com cuidado, como se fosse forno preenchido que se não se pode queimar, senão por compaixão. Dizer isto a Irina, era como afirmar “ quero ir contigo até onde a lei seca”. A neblina dissipava, inspiravam-se de sofismas como alegoria de ali estarem. Agora virados um para o outro. Human pega num pequeno bloco vermelho e vai escrevinhar, Irina muda de K7 e canta.

‘Não pertencer a ninguém, também é difícil, sobretudo quando lhe tenho apreço’. O céu sobe da minha miserável condição, sofro cargas elevadas de sensações e dou-me a tudo que se me cruze. O resultado é ser sempre eu de novo, de memória à espontaneidade de um retrato que procuro fixar, na sua voz, rosto, olhos, cabelo.

Num pudor sem uniforme, Human deixa-se ler por Irina. Esta calcula o vento entre as árvores, num convite a um café. Era um café escondido, de mesas de mármore, o dono alto, forte e calvo, atrás de uma majestosa máquina registadora. Sentada, disse-lhe: Irina, podes ler a bica se mexeres com a colher, vês desenhos. São como as linhas da verve, algures na alma. Aí estamos bem, não achas? Human, eu tenho insónias há anos a fio. E eu não sei, que pensarás amiga, por essas alturas. Daí os nossos passeios fora de horas. Pensa comigo, depois dormimos. Temos autonomia e cigarros. Queres um pastel de nata, um bolo de arroz, que queres? Aqui não há tostas mistas…. Tenho ainda chocolate e quero uma ginja. Bem Irina, eu vou pedir para mim um ovo e tu ensinas-me a memorizar este vai vem de café. Quero lembrar às insónias, o gosto pelo faro, porque dos aromas, há o que tens de tranquilidade. E o olfacto, depois do nariz, é o beijo que me prometes, quando sairmos.

Human estende a roupa e deixa voar uma nota e vai à vizinha ver no seu jardim, entre as flores se andava lá a nota, mas nada. Acrescentou:’ não viu mesmo a nota?’

Concentrado agora na tarde, dentro do seu quarto, deitado e pensando através dos sons. Que ao olhar-se a si por inteiro, via luzes brancas como estilhaços de brilho benigno. Para Human, era tão só o fim de um pensamento acordado por ele. Eram-lhe preferidas as madrugadas (mesmo sem Irina), pois conseguia ouvir-se melhor. Cuidava das suas plantas com atenção, uma senhora mãe, fazia a lide da casa, a um tempo estabelecido. O dinheiro tinha-o, por artes de ofícios vários, vivia tranquilo consigo. Estava menos dependente de mulheres, menos ansioso e com uma poderosa amiga sempre latente. Tinha os seus hábitos, não comprava jornais, não passava muito tempo dentro de que lugar fosse, excepto com Irina. Tinha carta de condução, mas odiava tanto os carros, como a condução em si. A sua roupa era entre o clássico e o freak, sobretudo o cabelo. Tinha garrafas de plástico de todos os tamanhos, espalhadas pela casa. Vivia num bairro quase típico (pensando em aldeia), não fossem as novas urbanizações de luxo a cercá-lo.

Irina, vou-te contar algumas coisas daqui, onde tenho vivido:

Era algo que a manhã ondulava baixinho e serpenteava em crescendo. Vem do Rossio, passa (muito) por baixo da Valenciana (no Alto de Campolide) e esta viagem a terras da lide do campo é esboço a negro-acastanhado, visto das janelas, sob o néon do tecto das carruagens. Se forem díspares nas horas deste trajecto, a lógica de populações distintas é vos servida. E indo mesmo até ao fim da linha, em Sintra, a viagem é agradável ou não, depende da flutuação, a díspar.

Daqui de casa, oiço na minha escuta aos sons da cidade, o apito de partida, lá de baixo de Campolide. Quase na mesma distância, o sino da nova igreja do Bairro da Serafina.

Houve uns tempos em que ouvia um bater de ‘tráz-tráz’ repetido vezes sem conta dia após dia, vindos de Monsanto. Às vezes estando eu deitado e de pernas estendidas, imitava esse som, batendo com os pés um no outro:’tráz-tráz’de lá, ‘tráz-tráz’ nos meus pés. Um dia apanhei o 2 e fui ver se descobria o ‘tráz-tráz’. Andei pelo mato de ponta a ponta de certa zona até ligeiramente ao princípio do caminho para a mata de Benfica. Sei que quando descobri, era uma coisa normalíssima, uma pequena fábrica, algo assim. Antes julgava ser algo de místico, pois as batidas acertavam de seguida (sempre), em qualquer ruído que houvesse nos céus ou em Campolide. Este mistério foi resolvido, se bem que não me lembre agora, exactamente o que era o ‘tráz-tráz’.

Uma vez fui fazer dois recados SOS, um à Rua 10, onde a senhora me deu 2 euros e o outro a um lar de freiras, onde depois de entregar o medicamento, pergunto se me davam alguma coisinha. A freira disse, com os olhos fechados, que ‘aqui não damos dinheiro, só recebemos’.

Conheces esta ladainha, foi a minha tia Leonor que me ensinou:

Santa Bárbara virgem se vestiu e se calou, e pelo caminho do Senhor andou e o

Senhor lhe perguntou:

“Ó Bárbara tu onde vais?”

“Ó Senhor eu ao cão vou desmanchar a trovoada!! Que Vás lá tendes montada”

“Pois vai Bárbara vai e bota-a ao monte maninho onde não haja pão nem vinho,

nem bafo de menino, nem pedra de sal, nem raminho de oliveira, nem coisa que

faça mal”



A dócil árvore era a púbis de Ana Catarina, fazendo correr de si arbustos leves, para o voo rosa onde meus olhos seguravam cada ramo. Uma certeza, que o uniforme branco tomava do degelo e após eu esperar, que assim filtrado o maior poro, pudesse beijar, o lugar cuidado que se queria preciso.

Ao manejar o labor do estímulo sexual, pensava como acometer-me a essa tonalidade e a simpática timidez desculpava-se do denso floco do seu coração, mas algo foi dito… É engraçado ouvir-lhe sorrir, quando se cuida mais acima do ícone simples da sua saia.

Era de uma rapariga que gostava.

Agora vamos sair, anda! Toma calor de lençol, nós saberemos estender a roupa, em qualquer apeadeiro em que estivermos a fundo, entre os afazeres de perímetro e seu trilho florido, característico da ascensão. Estamos por nosso conta de encanto, a noite não jaz facilmente, mantém-te leve, mesmo na firmeza.

Vale o lapidar demorado de ritmo de lancha, que (à minha volta) te circula e o mundo pode esperar um tráfego tão etéreo, como se o ódio já não tivesse músculo, o beber influente de autonomia, elaborando searas, mesmo no deserto demarcado da lua, i.e. somos um bom petisco, quando nadamos pelo lado onde assobiam os inúmeros loucos românticos. E somos numerosos e tão poucos, Irina.

Uma vez, veio um homem, o senhor Carlos Nascimento, estava eu sentado na soleira da porta 74 da Rua de Campolide e mostra-me um pequeno saco de plástico. Eu peguei, olhei, cheirei e perguntei o que era.

-‘É o meu bigode!, perdi-o numa aposta.

O senhor que é dienético, senta-se a meu lado, enrolando um cigarro com a perícia de 6 décadas anteriores à escola. Perguntei-lhe a quem deixava a sua modesta vivenda, quando morresse, a que ele cantarola isto:” Quando eu morrer, quero que no meu caixão, tenha a mão de fora, para tocar na minha viola, na minha viola…’

Sabes que a configuração auditiva da ternura subterrânea em falanges de corso, às quais, todo um teor químico ante o entendimento das semelhanças, é o fôlego de todos os amanhãs. Abraçar as fissuras do corpo em si, num amor de consciência constante, evitando investidas missionárias a nativos em que o clima lhes prefere um sustento intenso em centro absoluto da silhueta anónima. Estamos descobertos e oxigenados, crepitando prazeres e entregues à elementar dadora de energia, a palavra da natureza, que nos é independente e nunca alheia. A todo o gás, o vapor pende secretamente ao segregar um franco convívio com a matéria, a temperatura que constrói o humor fino ou áspero dos traços do corpo. Sempre em progresso alimentado, a mente reveza-se ao combate de escolha em análise. Se o lustro onde a coerência deve imperar, deixar eternamente guardada, o saber, qualquer indivíduo, pode, deve e age em função da sua marca pessoal, para brotar daí, a ordem que se dispersa da liberdade de toda a auto-estima bem embalada. Levámos a encher o peito, pela boca, quando às coisas do mundo, voam daqui até ao umbigo, do sono melódico, à limpeza que temos com os espaços e em relação sempre a definir pela presença, que é a medida preferida para a satisfação do ego. Oscilar o berço a todas as horas, o hábito do amor.

Continuas igual a ti, Human!

E sabias que o sublime reside uma ascensão precisa? O trabalho de uma alma a tempo inteiro é de fundo. Sou um atleta de vigor espiritual. Quem for pródigo na sua autonomia, respirará feliz.

Corria Janeiro em cada passada da hirta multidão, que consciente apenas desse movimento, deixava atrás de si, à fusa multidão, o tempo de alma. A leitura frequente da volúpia de Irina e de Human, justificava honestamente o tamanho dos seus corpos em sossego. O chocalho fumegante, indiciava-se um contra devir, ele e eu na emboscada da bússola, tomávamos este langor como esconderijo físico e a que o nervo pedia que se estabelecesse geometricamente. E recebendo a frescura da manhã, o sol certeiro pela tarde e o prisma nocturno tique-taqueando. Eis a naturalidade deste pensamento e querendo como não quer a coisa. O recanto do assobio, manobra qualquer pranto muito bem, na elevação do peito, um fulgor rubro de vida, onde doce se o fosse e nada suspeito, o beijássemos.

Uma vez, ali à Calçada da Pampulha, na Rua das Janelas Verdes, corria o ano de 1996, ganhei um amigo, de nome Lee. Tinha um restaurante, que ao primeiro olhar, parecia uma tasca. Era um restaurante chinês, entre muitos outros estabelecimentos que vasculhava, na altura em que trabalhei numa loja de conveniência. O Senhor Lee tomava conta das mesas e a esposa cozinhava. Ficava perto de um posto da GNR, muitos soldados iam lá, assim como alguns casalitos enamorados. Eu tornei-me cliente habitual, como amigo pessoal do Senhor Lee. Gostava de falar com ele, do seu passado, do seu filho, de ler o Correio da Manhã, com uma coca-cola, enquanto esperava o meu prato, nos meus 45 minutos de refeição. Mais tarde levei lá a minha mãe e um amigo dela e o meu amigo, fazia um preço muito baixo, para três pessoas e ainda me guardava a maior fatia de bolo de bolacha. Um dia estava no largo do Cais do Sodré e pontapeava uma lata, o Senhor Lee, ia dentro de um autocarro e acenou-me com simpatia. Na refeição seguinte, disse-me: ’Human, que alegria estava naquele dia!’ Muito depois a esposa adoeceu e ele teve de fechar o restaurante. Era um homem bom. Voltei lá a perguntar por ele, mas ninguém sabia do casalito.

Andei num estar sem deserção, mensurável às pequenas coisas que há para brincar, quando isso é soma de tempo a afectos. Agora e desde que a chuva folheia os telhados, ainda imerso e inexacto a enfileirar-me no dia, o meu corpo exibe sinais que apagam explicações escritas em quadro de ardósia. Os movimentos do meu busto, subtraem em sorriso generoso, a fala do dia de hoje para um lado onde a cabeça dói e apetece roer cerejas empoleirado numa árvore e deixar os longos sonhos da noite passada.

Metro e meio de horizontes dado o sono, metro e meio na ponta da língua, que gosta de abrir o chapéu-de-chuva a Isabel, que anda melhor, mesmo que lhe paire sempre um desgaste de tanto auto-consumo por tanto querer sorrir onde há água fresca, para os lados onde as braçadas são a delícia do veto ao alimento e eu ainda na árvore, assobio-lhe e vem ela a correr, mesmo que não seja seu fervor, ela vem sempre. Talvez por a cereja ser avulsa, como a memória.

Numa disciplina de sesta, acordamos com a destreza felina de um temperamento esguio às horas onde o amor é hábito pontual. Ao operar a levitação, deste tom que olha em frases em simultâneo, a uma livre andança pelo sorriso de mais um tempo de vida, atinjo molde mais perfeito de volúpia e acrescida de um porto sem qualquer âncora à vista desarmada e logo nos espraiamos para o espaço aberto à nossa volta. O flutuar dos suspiros acerca-se do entardecer em corrida contemplativa ante o cume sem cisma. Quase uma oração tão elástica como esculca é a sensibilidade do broar da nuvem erma, neste plácido sol, que nos aquece a nuca.

Para Irina, iria docemente ao seu repouso e eu em olá beijado, deixava-me por perto das vozes da boa terra e muito pouca avidez que não fosse esse recurso tenro, tão terno e de tanta fibra moral. Quanto ao jardim de belos efeito nas traseiras de Human, ondulando diante e à distância de uma cadeira comprida de lona, Irina entretinha-se em ser cortejada e tão vivo era o namoro, que se prostrava firme a todos os ecos desse lugar, que eu escutava sem dar conta que o alheamento se devia à solene idade deste sonhar. Ora ao abrir o corpo de volta ao seguimento da hora de escuta, vinham a mim constelações imensas, que um xaile apaziguava do sereno da noite. As refeições eram frescas, saudáveis e deliciosas e no que houvesse a ser necessário, era apenas o sono.

Vi-te hoje, enquanto te olhavas ao espelho e reluzias alvamente teu sentir ao dia, tinhas um azul a todo o gás, vestido pelo dorso, não sem pressa, que o desleixe da realidade, me fizesse cristalizar as tuas belas mãos. Todos os dias que te vejo, usas teu nome e eu assisto, como se te pedisse a mão. A caneta nada cáustica ao caos de enfermidades, é tão elástica como a tua passada, que fulmina a tristeza no bambolear doce que tens. Ortopedicamente, estou bem contigo, servimo-nos do trabalho como energia em movimento.

És alegre, eu melancólico. Por vezes ao ver-te, sou demasiado.

Houve um dia que pedi um autógrafo à Sara Tavares, que é simpática, disse que ia fazer umas brincadeiras para o estúdio. Um negro, gritava seu nome, de dentro de um buraco.

Sabias que o jazigo em mármore da minha bisavó Maria do Nascimento Ferreira, custou em 1976 , 100 contos? A porta do cemitério tem uma grade alta azulada com uma data antiquíssima. Depois de sair, passava por uma laje engraçada na forma e seguia para um portão que custava a fechar. A identidade da tinta, reside na sensação que provoca à memória, quando vimos nossos lábios em truque de ilusão fleumática em avanço a outros membros.

Conheci a bisneta do Marquês Sá da Bandeira. No seu apartamento, completo, há obras datadas de 1800, em francês. Da sua casa vê-se a prisão, ela que diz que namora com os guardas ou eles com ela, que sabem da vida dela, que se prepara, depois de uma viagem à Patagónia, para uma viagem cósmica.

Quem soma e segue são os animais de cidade. E tive uma Bianca, de mnemónica fácil e meu pai mandou dizer, que animais só no zoológico e tenho um amigo meu, guru da música africana, segundo os franceses, que fica doente ao ver animais matarem-se, mas que os come aos mortos, enquanto aos vivos ainda os podemos salvar, segundo ele.

Dizem que ‘au dimanche de matin avec ma putain’, é uma canção. O Hindu Ashin canta e a mulher chama-se Pátria.

Quem respeita a hiper-vigilância sobre o cidadão, é porque vota para decidirem sobre ele. Também há quem viva para não comer como propósito e os hindus que passam fome, não podem comer as vacas sagradas, que se passeiam diante deles.

Eu sou um menino com corpo de homem e tu és uma bela mulher no teu elemento de ar.

O idioma pardo que branqueia no escuro, como som de pensamento, baloiça em gavetas, em cantos directos da memória, até ao abraço festivo, após a refeição de alma. A assinalar o vencimento intempestivo da humidade da minha casa, sobre as minhas pernas.

Ao renovarmo-nos do fim-de-semana, que na cidade, é como pastar sem barulho, sei que pela manhã vamos mexer nas membranas expansivas para com os transeuntes, untando com calma e em bênçãos alheias, que as fazemos com extensivas diligências, como um estafeta demasiado sensível à inquietude apática das vozes e entrando em burburinhos espaçados a meditações, que preenchem o apetite e o fulgor que o fôlego necessita. Ao mudar de posição do corpo para pensar, torna-se esclarecedora a diversidade.

Fosses tu, uma marca no céu era o que esperava do pensamento. Com as desvantagens protocolares, nestas viagens de interiores, tinha mobilado já uma imensidão de coisas, com o mimo que lhes parqueava o chapéu, em que vendo a deslocação das nuvens, arbitrava este jogo imune a regras, para me desabotoar sempre que o amor me quisesse. Lá pelo degelo, dizia Human para consigo. E o sulfato andava pelas vinhas, depois de lhes fazer umas bordas bem amaneiradas no meu bom juízo de agricultor biológico. Neste caso, deixava o sulfato noutro lugar e borrifava com uma organicidade mais em conta com a natureza, que é uma linguagem que temos de saber ler.

Lavar o credo a quente, tem o senão da fechadura só ser atendida por radiografias e não por toques de mãos em tornar à esquerda ou à direita e a auto-gestão de quem lavra fundamentalmente o pensamento na ponta da língua, tal o hábito da pontualidade imponderada que aí vive.

A rua anda connosco ao colo, sustêm-nos e os sapateiros e os calceteiros, usam manualmente os seus afazeres em prol das margens do asfalto, que desaguam em portas.

Na linha da luz e do calor, que emigra de acordo com as cruzes dos jogos de batalha naval, uma merecedora surpresa mas invectivamente supreendida pela junção do conjunto das declarações dos sexos em entrevista. Aprecio portanto telefonemas originais, é fácil perceber porque os ouvidos traduzem e retrovertem este boomerang, seguramente mais palpável que o Bar 25.

Irina, é provável que as idas tenham voltas sem Vomidrine e com um financiamento mais seguro como a sua brancura. O meu capital social, tem um inventor que nos desempenhos da Academia do Sonho, entra em longas caminhadas, nas mais sossegadas ruas, acenando a todos e de volta a casa, a minha vinda pensou bem se o episódio do pêlo da nabiça, que perguntei na farmácia, era genuína a sua existência, que sim, mas que eram brancos, o meu era negro. Aprendo muito na farmácia, tanto que hoje havia sangue no chão de um corrimento da menstruação da farmacêutica. Antes disso falámos nos seios dela, eu olhei-os, estavam normais, não havia corrimento portanto. E o chão estava lavado com Xampa, por uma soldada que andava com açúcar na mão. E não sabia que as mulheres do lixo se riam muito (três de uma só vez), lá para os lados do Campo Pequeno, e chamaram-me de senhor. Chegado a este ponto de vista, temporizado pelo apelido, que se apagam os contractos de quem ora, tal a trip de Lúcia e de todas as pontes ecológicas, que nascem em Portugal, vindas do mar, que é o espelho do céu, disse-me a farmacêutica.

Irina, como achas que folheio as leituras magnas dos corpos intermitentes? Olha, revezo-as do molde espesso, à proximidade que meu olhar abrevia, em cada compasso excedente à colheita de uma higiene fraseada em saber esperar a outros olhos, às vezes e sempre. Por pouco a vertigem recebia certas linhas de fuligem e o corpo dançava menos que sabia, os nomes do espelho que sonho, deviam horas de energia à folia de uma noite pendente no balanço de uma cidade dormitando o cansaço acumulado, em cada segundo real, pela monda dos poros e quão longínquo é medido o livre respirar do livro plano do todos as cartas para a noite. Talvez mais um momento estacionário, em paredes mudas, isto se soubermos a magia de as atravessar nas noites de sexta-feira.

Um postal chegou de uma amiga minha, vou-te ler:

Querido Human

as minhas palavras nunca conseguem chegar a poesia das

tuas. Que presente indescritível, receber estes teus

sentimentos desde campolide ate berlim. És uma pessoa

tão especial como inagarravel, o espírito nómada mais

sincero que conheci ate hoje, tão perto como também

tão encantadoramente longe, tão pessoal e logo, sem

contradição, tão universal, pertencente a todos os que

te rodeiam (anónimos ou conhecidos), sem esquecer a

distinção entre cada um, nunca fazes distinção, és

sempre um inteiro para cada pessoa que amas (e como

sabes amar!, talvez a escrita seja o teu maior meio

para amar) …es sempre um todo para mim…, Human, serás

sempre parte da minha Historia.

Um abraço tao poderoso como aquele que pudesse ser

dado desde berlim ate lisboa.

Tua ‘corpo-carta’

Conheci-a há uns anos era muito bela e muito afectuosa. Eu tinha-lhe mandado uma história recentemente, que te vou ler:

um certo paladar sonoro, tique-taqueando para uma expressão guarnecida a relações exclusivas, era o guarda-fatos de um posto de gasolina. O remetente nada calvo, oriundo de seu passo, tinha uma voz telegráfica e seguia os sons com os braços a métrica nocturna. Parado e colocando uma bailarina em ponto pequeno junto de si, ela altiva, dançava, assim adiante ao broar distante e lhe centrava a memória mais perto da vitrine para o mundo. Os ricochetes espadaúdos, que reflectiam o mastim do néon, deviam à hora do leito automóvel, o roncar desperto de um corpo pesado. Afigurava-se a pompa de Vesúvio, na circunstância outra miniatura que dispunha.

Fluindo ao cabimento de se ter sem fingimento, tomava-se para fora da vitrine e girando, volvendo a metros do seu sagrado coração, via melhor os pedaços de céu e pensava em salinas, ao mascar tabaco, logo que um veículo aparecia e de igual modo iluminando também a distracção desse seu mundo de aço, essência e vontade de estar, para existir em semelhança e em contraste ao branco e ao negro.

E hoje se me demorei no café, era porque te escrevia, estou em suspenso contigo, ires, eu ficar contigo, ficarmos os dois, ou continuarmos como sempre?

Human, sabes que pelo charco das patas, uma camisola apregoada no verde das árvores onde diz o pato à pata, “Ri-te Pata, e a Pata ri”, eram pernas de maratonista que urravam em princípio convicto de um olhar quente, o teu sobre o horizonte e o espaço pós charco, tal disposição revolucionária, em que coloco as atenções, depois das nuvens e desenhava pictoricamente o pensar no hospitalidade caseira da crisálida, ela que voa sobre o centro dos teus olhos. O saber estacionário, permite avançar o corpo com relax apenas da gravidade de um espaço vivido a negro, cegamente te sentia, como lábios que de bruma etérea à minha volta, eram tons de viola baixo e olhavas para mim a gozar uma coisa, sustido numa madrugada épica de acção intimista, sendo sorrisos os picos de voz suave em alegria poética, aqui onde me sei, na chave que entra coração e dá uma volta de entrudo, para se abrir em entendimento de puxador visível a um traço contínuo, logo após nada estar decidido, eis a organização da nossa espontaneidade…

A curva do lábio que Irina encaixava no meu terminal falante, fazia dessa eloquência sem baptismo, uma descida ao alfabeto das vias físicas. À atmosfera do quarto, nas evidências do corpo, dos método eléctricos que emanavam calor humano, um temporizador de confiança profunda sempre presente, era a caixa de recursos de um perscrutar do tudo, que se abria para fazer entrar um elemento e ruborizar o silêncio, com reverberações constantes e de ponto de cruz. Depois, ela e eu, na vantagem do prazer, sorríamos abraçados, numa colocação de sentir que seguia dentro, adiante ao dia seguinte e chegava por carta a renovação redentora das horas em palavras de dois jovens, entre si para toda uma saudade, que se impunha no ritmo vibrante do mundo dela e do meu.

Para descomprimir, tenho uma história engraçada, escuta:

No ano de 2001, em que uma aventura e aposta espiritual atingia o auge, fundindo na carne uma apologia de alma, que foi segregada assiduamente durante 6 anos. Por altura deste ano, conheci uma mocinha amiga da aposta. Vestia saias compridas, gostava de filosofar e ir beber imperiais ao CC Vasco da Gama/Parque das Nações/Lisboa .Um dia vi-a aqui neste bairro de Campolide, e começou uma história pequena e singela. Feira da Ladra, minha casa, as ruas deste bairro, a paragem de autocarro e uma história. Ela disse-me um dia que seu pai era juíz, que tinha uma pistola e que tinha ganas de se matar um dia. Quis eu ir saber onde era a casa da mocinha e fui ao café da Urbanização Nova Campolide, onde vivia o senhor e ela. Entro e procuro alguém com cara de se querer matar. Vejo alguns rostos, analiso, hesito e aproximo-me de um calvo gordinho, de rosto pesado: -Desculpe o senhor não é o pai da Isa? Sim, sou e você?

Bem por acaso comprei o Diário de Notícias e vejo uma cara na capa que conhecia e digo para mim: conheço esta cara. Mais tarde, na farmácia, que é um local de veículo de informação, alguém confirmou a identidade.

Não lhe vou dizer nada ao senhor da Polícia Judiciária, vou continuar a fumar o meu cigarro de Domingo e perguntar-lhe pela filha, enquanto observo o amanhecer sentado na rua e as pessoas entregues a si.

Podes ficar o tempo que desejares, Irina. Obrigado, Human…

Vamos tornar diferente este nosso processo, eu, Irina, vou ficar aqui e tu dizes se me queres como companheira numa relação de definição indefinida, por tempo indeterminado. Ele diz, que tudo bem que seria interessante. As histórias que contamos são o nosso alfobre para o futuro, nada definido em tudo isso, insisto e tudo por saborear. Não julguemos nossos corpos se se querem ou não, importa andarmos regulares em edificar uma autonomia social de amor. As histórias de outros tempos, têm seu espaço e servem esta parada, continuava ela.

Uma actividade de cores, segundo atrás de segundo no que o alfabeto consegue congregar. Cada um seguia pelos seus passos, voltando depois a si, na aventura de Lisboa. Human conheceu um cavador, da zona de Santarém. De rosto lavado e olhos distantes, falaram da vida e de enxadas.

Human adorava enxadas, a conversa foi agradável e o senhor voltou ao seu caminho de mãos atrás das costas, como um crucifixo na parede. Seguia seguro de boina na mão. Não parecia temer muita coisa, a sua fala, a curvatura das costas e toda uma precisão de saber dado de mãos abertas.

Irina conheceu uma francesa, após se terem cruzado entre uma fila no supermercado e foi a camisola do Quebeque que motivou a bela francesa a discorrer sobre uma dúvida portuguesa. 5 badaladas e um balde de cal, que quer dizer, sabe? Irina, disse que era um costume antigo, antes de uma pessoa morrer diziam isso, lá para os lados de Oliveira de Azeméis, Águeda. E por falar nisso, posso-lhe contar uma coisa sobre uma outra localidade, a de Mortágua. Se lá passar, pergunte quem matou o juiz… Vão-lhe dizer, que foste tu minha filha da puta… Histórias antigas, sabe.

OS franceses, nomeadamente as mulheres, têm uma espécie de suspiro agudo, quando respiram após uma pausa numa conversa, sabias Human? Por acaso até sim, conheci uma aqui em Lisboa, a Marie, muito bela no seu bom gosto de saias, que fazia assim, tal e qual. Restaurava santas. Um dia fui buscá-la ao Museu de Arte Antiga, chovia a potes, a luz foi abaixo, ela saiu mais cedo e fomos beber alguma coisa. Alguém me disse que ficávamos bem juntos, eu apenas olhei seus olhos melancólicos numa travessia do Tejo, pelo poente.



Toda uma ressonância nocturna, tão nítida em mim dos céus que não caem senão em acústica. Este costume pernoita em afazeres vários, há um sotaque depois do pensamento e dito tão alto cá dentro, que me faz levantar do leito. São no modo, dizeres que vão a caminho.

Parte-se em partes que tornam o corpo fértil, o bocado de queijo e o ar de enlace do piquenique, à volta do chão tenro. Pouco a pouco nada dista, aproximo-me de ti e a junção é um sortilégio fora de horas. Como sabe bem sentir a fluir, dentro. Lucra o truque que se esconde e descobre o segredo do rosto.

Os cirros avançam seguros a olhos que fendem a esta hora de sustentabilidade do branco, de novo no meu leito. As mãos soltas, os latidos, a brisa e um conjunto de vontade madrugadora ao que quer que seja. É hora de almoço e no jardim sossegado, cai sombra suave e apetece permanecer na visão que lhe pensa e trazer para casa o repouso do almoço.

Vou indo sem lamento, no encalce de um proveito, tomado em mim diariamente e tomando forma quando mergulho mais fundo para o sono e daí em seguida, os sonhos.

Escrevo sucintamente, que me distraio a pensar. Sem dar conta, vivo para mim nesses momentos que me parecem muitos. O caso que me ocorre, é a minha nitidez quando lúcida, se apraz a trepar amplos enigmas. A voz é constante, ponderadamente traquinas ou cordialmente amena. Continua a noite e eu espero o meu prolongado silêncio no banho remoto do meu primeiro lar. Não corro, nem salto, o corpo vai para perto de onde possa pensar. Trago sempre, ainda assim, qualquer coisa para casa.

Há um livro pródigo em cada ser, tendo cada página a marca, que folheada com o cuidado que se consagra o sagrado de cada partícula nossa. A função da memória, activa o lugar onde se deixou a saudade. E presente ao destino, o decalque dos sonhos, apresenta-se como vontade e diante do espaço de sensibilidade espiritual, temos pronta a roupa para cada segundo de vida.

Por amor se concebe o futuro, um trabalho a tempo inteiro, tão real se o imaginarmos como extensão absoluta da saúde.

Há um jogo, onde todos se vestem de fantasma em verdes colinas, o ar é puro e brincam entre si, para espantar uma presença maligna, mas já ausente no espaço deste grupo. Em volta de ausências benignas, há o sentimento imaculado que enche o peito, lavando-o com a imagem que nos é querida, em qualquer foco que sustenha o seu pensamento.

Ora Human e Irina, predispõem-se a recordar e a contar toda uma série de coisas, questionando-se no acto espontâneo de suas vidas actuais, sobre o que lhes mais alegria traz, por um lado são eles em si e para os outros e a paz de saberem que estão no caminho certo.

Human sofre dos nervos e fuma muito, o que lhe afecta a saúde física, como ostenta uma fragilidade tão autónoma, que lhe consome em cansaço cardíaco e tinha decidido se movimentar num pequeno espaço de território, para seu bem estar.

Para Irina, interessavam-lhe mais as pessoas que os lugares, era enérgica, destemida, alta, auto-didacta e com uma beleza nómada, num rosto claro. Tinha a capacidade de se adaptar a uma situação nova e construir a partir daí. Tem uma mochila muito bem organizada. E decide estar com Human até ver e Human aceita-a, com agrado.



Um enigma torna-se amigo, assim que o humano mundo chega à sorte e vive com ela. No verso da moeda, a vida habita e erra, escolhem-se os pares, formam-se lares. Por trás de da porta, do lado de dentro, sinto o que pode ser uma decisão e voltando para fora, fechando a porta, inspiro bem e centrada no devir mais próximo, ando pronta para o rumo dos dias em transporte, na minha mochila mais pequena. Nela andam a tecido, que é olhado na cifra subversiva vista na elevação com que é pronunciada ao olhar alheio. E muitas conversas dirigidas a mim, começavam com os dizeres da minha mochila mais pequena. Por exemplo: ‘Irina, Anarquista Graças a Deus’, faz soltar a língua ainda mais aos alcoólicos/as parqueados nos cafés. Os sóbrios, ficavam na mesma, que eu não lhes tocava o sino, para além do meu contentamento, que se quiserem uma liberdade que seja lúcida, como após uma infusão de Lúcia-lima, onde reina paz interior e se avança pé ante pé aos passos contrários, que são os ortodoxos em constante multiplicação de todas as ideologias e crenças. E assim, em ponto de embraiagem, subo ladeiras e articulo a minha dicção, com Human a meu lado.

As reservas de afecto de ambos eram enormes, numa escala de silêncio meditativo, fabricavam-no a par de seu coração, que urdia flores de felicidade a quem necessita de ser ouvido na hora mais intensa do corpo e da alma.

Uma afinidade na corporação de surpresas diante de um sem número de estranhos, a propensão sempre presente na vida de Human. Desde que tomou a noite em gesto de castor, uma arquitectura sem falácia num sentido ao Norte, a caminho das nuvens.



Planam acima da terra, pequenas relíquias de bom trato e por elas, falamos de descobrir qualquer centelha de senso a ver. Poderia ser um candeeiro iluminando uma conversa a dois ou a maneira de uma mulher se mover à luz de uma recta como horizonte estático. A vida fia justificando todo o tempo a cada início que lhe pensa e aí somos responsáveis, por pensar. É este peso que torna as pessoas anorécticas. Aprendi a esperar como quem procura, cantando.

Abrindo os olhos em movimento pausado, ter o sentimento de vagar e vontade, um ronronar até ao ponto exacto de sentimento do exterior.

Era uma manhã fulva é ágil, entre maneiras de querer passos sobre a textura da realidade. Entre o rosto claro de Irina a inventariar o anúncio de calçada de cidade. Sabes, dizia-lhe Human, é em tormento, com os meus tormentos que me vejo em torneio pelas coisas de deixar um novelo e eu que me vejo numa montra, igualmente sem existência. E incólume de tão bem querer, termino este palpite em vaga passada, para o teu conceito a que chamo de nuvem, que ascende em foco de bem ser. E cito o meu amigo Paulino Vieira: o dom de saber sofrer é uma virtude, que nem todos se dão a esse privilégio, pois ajuda-nos a entender cada etapa da eterna felicidade que sempre existiu. Só quem não viu! Disse-mo a isto num Março-marçagão e anotei.

Como seria para Human, viver fora do seu território? Irina puxava por ele, mas ele achava tudo tão estranho, bastante estranho. Então reuniam-se em torno disto de se temer vida não inteligente e Irina procurava Human nos seus pensamentos.

Mas venha o humor, disse Human.

Irina, ouviste falar da católica que rezava para ser rica? Bem era uma rapariga hippie que depois de uma longa viagem, foi a correr a uma capela rezar para ser rica. E ficou.



Indo para a defesa de uma luz que dá de frente, enfrenta-se com a mão a fazer de fusca ao duelo que se ganha no solo e em pé, depois de irradiar todo o pólen de um eixo, o espelho, o rosto sem a sombra, as pequenas viagens ao canto da sirene e o esplendor do aroma anda à solta. Sweet Rendez-Vous…

A margem de manobra ostentada pelos parentes da revelação, dignam-se a planar por hostes inimigas, seguindo estrategicamente em passos de táctica ardente no temperamento subtil dos românticos. Esta virtude não cessa nem ceceia, na ventura do modo dinâmico de existir ao largo da cidade.

Um domar da ânsia gregária era o sofisma que se queria calmo, o dote que Irina tinha junto com Human. O assobio fresco da liberdade ao peso da súplica de cada refrega na mente, o drama vejamos, era para ambos um decote sem receio de um rumor cristalino na sedução de limpeza, pela meditação e partilha de sentimentos, tudo. O calmo odor que vem da peleja musical do violino, tem uma colheita panorâmica, como cálida e nobre ela é no traje que reveste no arquear do movimento até aos nossos sentidos. Se bem que Irina tocasse viola de caixa e não violino, conseguia ser virtuosa na natureza alegre dos acordes entre dedos e a mão, para o lugar onde praticasse e para Human, era uma bênção ser colhido pela música a seu lado, nos dias sem drama e de contagem articulada aos que virão. Deixem pois passar o amor que ambos transportam no peito, adiante e ao caminho que vai dar. Serenos vêm, nada bruscos, apenas alguns momentos (como é natural, para quem respira) escondem o seu património, que está em suas cabeças. Isto envolve-se no encanto da beleza que nos é servida.



De volta à correria dos laços sem nó, engordava um porquinho, com moedas que caíam nele, num ritual de economias, feita de trabalhos da mais variada espécie e volume (da grama à distância), e o destino a dar ao abate do porco, seria por altura da vontade de partirem por aí. Coisa que não tardaria em chegar, dados os impulsos contrários de ambos, mas que iriam servir uma qualquer causa de encher os pulmões e olhos, muito provavelmente rupestres. Mais tarde se veria, se o trabalho de alma, faria mossa nas falas dos dois. Assim, que irrompesse um bocejo, iriam tentar, porque não lanchar numa avenida chamada piquenique.

Sem grandes tagarelices que envergonhassem o rumo da amizade, iniciaram a Primavera de 1999, com solidez, no que diz respeito ao respeito. E na devoção recrudescida ao tempo, tinham passado 10 anos depois da queda do muro. Irina sabia que a sua visão se mantinha actualizada e nos seus contactos extra-Portugal, procurava as rotas, que a segurava às possibilidades do real. Quanto a Human, tinha os seus contactos ordenados de forma semelhante, além de que a sua vivência de nicho residencial, lhe indicava, os sensores a despoletar, para a nova era.

Estando reservados para si, as resoluções de combate que passavam por uma espécie de sensibilidade poética e humana, junto das pessoas, que por acaso se cruzavam com eles. Não procuravam, mas ocorriam às vozes e silhuetas anónimas, nas suas preocupações, dores, angústias e desejos. E viver entre criaturas em que dizem: ‘putas ao poder, que os filhos já lá estão!’ e depois vendem-se outra vez ao mercantilismo tão fácil de desmascarar, que parece brincadeira de crianças, que não sabem que ainda o são… Os ritmos do sol eram um problema para a pele exposta fora de casa, onde há mais energia orgon. Mas o descuido voluntário e no desrespeito à mãe natureza, trouxe isto para as casas e hospitais. Um queixume de lume vivo, que um dia, sabe-se, essa estrela potente, irá se extinguir. E olha-se para o lado, no duelo de rostos, para que não se ceguem as colheitas de amor, que é o espelho do que Irina e Human, tomavam como explosivo artesanal, sem usar artifícios psicológicos ou manhas. Que a arte responde mal aos apelos reais, escondendo-se num autismo que gosta de estar calado e mesmo quando fala, é só para brincar aos índios e cowboys. Há quem diga que é uma arte, essa literatura, uma aprendizagem do bem e do mal, os bons e os maus e sempre com o estigma de 2000 anos de gatunagem da igreja católica, que não é a mesma coisa que Deus. Quem é esse? Que se cosa! dizia a mãe de Human.

Expeditos em terminologias, no caderno que os acompanhava em cada mochila, numa chuva sonhada enquanto digeriam o calor, anotavam a sua intimidade por palavras letradas em experiência criativa, oriundas de uma plataforma de sossego. Conseguido esse termo no corpo e mente, podiam achegar-se aos víveres com maior facilidade e assim trocavam silêncios, para adubar esses momentos como uma abertura de uma obra poderosa.



O aceno de breve leveza, remetente de uma emissão que gera velocidade ponderada e de acordo com a aproximação de vivência. Pois quão espirituoso é estar dormido de bom sono e pelo despertar, a prontidão exacta do índice folgado do corpo. A zona longínqua do sonho, que apetece brindar como academia de uma multidão tão singular como o coração. E o exigir da série de vontade quadrilátera, sendo rimada, acede a galões claros, no brilho que hasteiam o sustento do céu.

Tirintar os dedos onde há metal, para arrumar a vaga num sussurro gigante. Esquecer-se disso e continuar pelo germinar de voz, onde desagua por fim o disparo de consciência.

Edificar a gargalhada como se fosse um frémito genital. Conclui-se, que ao saber científico, há que dar espaço, sobretudo aquele que avança para nosso bem estar, como ler a obra de Wilhelm Reich, que há quase duas décadas não tem dinâmica na edição da sua obra, em Portugal. O que se seguiu para os leitores, encontra-se uma área de crítica social e herdeiro de princípios anarquistas, em Noam Chomsky.



Um primeiro beijo, tem por si um grande respeito na memória, avaliando o êxtase juvenil que se apodera dos sentidos em agitação de vontade e a necessidade de costurar o tempo, por locais seguros, obtêm-se pelo espreitar do nosso diário, escondido no bordado do nosso corpo em levitação. Se a consciência é lavada, recorre-se ao prazer por dá cá aquela palha, alimentando um dia a dia sem rumo no diálogo musicado da vida, escutando sem atenção, quem diz o quê e quem desdiz de seu juízo, o que é o acossar da vida. Recorrer sempre à concentração, para chegar à lucidez, com experiência acumulada numa presença de espírito que se torna generosa e de moral espirituosa e sem rumo materialístico, pois este vector divide o mundo dos vivos daqueles que dormem em pé, sonâmbulos iludidos com as magias de uma tecnologia sem pés nem cabeça. Antes com tentáculos que são o tédio desta era, mas que não inspiram ou abre portas ao surgimento de génios, dadas as preocupações de combate social latentes a todo e qualquer instante social de cidade ou de campo ou ainda de transição fronteiriça, a outras paragens onde o mesmo pano de fundo se estende diante de nossos olhos. Resta o domínio do tempo, para despoletar projectos de vida, individuais ou colectivos, no seguimento de um olhar sólido às fragilidades de quem diz levantar halteres dia após dia, que é uma grande aldrabice e pegando-se como doença emocional aos demais. Então, temos a sensibilidade como função a conceber na estética que gera beleza, para segurar a roupa que nos veste.



Obrei um pedaço de eucalipto claro e fiz uma fisga, mas era por vontade de a fazer não pelo uso. O que por vezes dou uso, é ao passo seguinte, tantas vezes desmedido na diferença com que calco o solo. Pés destros tomados de exílio, portanto pausados e por conseguinte contra a natureza expansiva, mas se o coração pede tempo, para lhe ser atribuído uma nova e bonita história, há que ser paciente nos tempos de espera.

Afinar a voz com a do canário, afinal és a mais bela, Irina! Porque és em minha vida, um voo profundo de medidas acariciadas pelas preces na nossa orientação do amor e isso vale por si, logo que se o rastilho se perca em serpentes de viva voz, isto querendo dar-te a inspiração no meio de uma multidão, onde te faço destacar, no teu belo e generoso corpo de mulher.

Que dizes, Human?

Qui, que, quoi, dont, ou e a nuance do nu, Irina, felina! Olha dizem que o Jimmy Hendrix foi envenenado. Ele abria a boca demais aos que não têm um sindicato, sejam músicos ou operários ou muito mais que isto, após o seu último concerto, ele disse ao público que o olhava, onde estavam eles este tempo todo sem perceberem o que ele fazia com a música. No dia seguinte morreu… E a Janis que bebia uma garrafa de álcool antes dos concertos, era para se inspirar, que tomar droga pode ser uma forma de ser contra o sistema, mas não resolve esse contra-poder, em meios de ataque, antes a ele ou ela enfraquece e os poderosos ganham terreno. Os olhos fecharam-se para ambos, mas estão vivos connosco nas suas magníficas canções e ficam nas conversas de café para sempre, enquanto o empregado anota que eu estou apaixonado por ti, miúda da bica. Human, vamos aos chocolates? Bute! E o preservativo, tens? Está no meu bolso, Irina. O que era o rio, tornou-se mar…



Sentados e alados como o anonimato de uma árvore, entregavam carinhos, como crianças empurrando uma distracção de alegria serena. Dispunham consigo o empolgamento de um início que sem rubor, os abraçava. Pairavam as ancas diante do verde, um verde que trauteava a nitidez que um manto de cansaço se lhes cobriu, ali no quarto de Human, até à voz do amor ser preenchida pelo silêncio, porque te amo, por assim querer a vida e um laço de emoção levou-os ao sono, merecido pela estatura livre de ambos. E estando em processo de definição, o sonho elevava a experiência dessa noite calma no andamento agora de piano, que no dia seguinte um ardina dos céus, anunciaria um novo amor, entre as florestas virgens de uma glória celeste numa rua chamada alegria, eis a remessa de anjo em labuta e que também se passeia e lê jornais…



Tenho o olhar alucinado e ela gosta de mim, que raio aconteceu, somos dois a olhar e a lutar e toda a metade da lua é ingerida com a gula voraz após mergulho de mar, logo iluminados por saber que se tem a alma na frente etérea do amor.

Um levantar de volume cinematográfico em seus cabelos, com o comando visual atento ao desenho urbano de sua vida. Era uma lassidão sem serventias, que pelas noites frias impelia o corpo a manter-se quente, imóvel e sorridente em odores de matemática felina, enredos, imagens várias num sonho cadente até ao nível da sua pele junto a Irina.

Logo e posteriormente ao ocaso épico, nada mais podia sucumbir no claro plano de seu carácter e mais adentro da noite, a passeata do destino a quatro mãos. Mantendo o carisma independente na personalidade, as sombras delineavam um rumor, andando circunscritas no espaço de uma janela sempre sua, nos momentos de alheamento e de resguardo. Da porta ao doce do obelisco, uma prece neste rabisco, que era a sensatez cognitiva do cantar giratório da canção de Human com Irina. Completado o conselho pardo da noite, voltaram a uma volúpia achocolatada na deixa que os unia e foi Human quem entrou em Irina pelo primeiro sinal de desprendimento da manhã no colchão onde se amavam.

Embebido de cuidados que contavam a partir do humor mímico que em crescendo, gostava de somar nomes de flores até ao clímax do organismo. Coisas destas, existem na natureza humana, espécie sem evolução.

Numa achega ao rumor de musa que o Chiado ouviu falar, houve mesmo um tempo conseguido, feito de poesia in loco de um imenso alfobre que agora plana pausadamente. É um círculo sem espectro, pode subir tal balão e lá de cima, olhar a coerência subtil a que se entrega.



De um nevoeiro iniciando o primeiro olhar, sabe para si que se ao dissipar, a mente confere uma nitidez no seu mundo.

Pegamos na verdura que se cansa de ser malhada, mas que seu ouvido mantém uma analogia ao tacto alheio, então entende quem é quem, mesmo depois de solta a raiz, a folha, o pólen… Para que o alimento se torne genuíno, a natureza dá a escolher na sua diversidade, o caminho para os nossos passos suspensos e os que vão na direcção da fertilidade.

Crer no coração, num amor que é dador de vida e não de jogatina financeira ou cabotino. Medindo a força do amor genuíno, temos todo o retrato de uma pessoa, seja qual for a ideologia ou religião que subscrever.



Tentemos a vida fora daqui, alguns dias, os que forem. Que achas Human? Vou fazer um chá e volto para ti e conversamos com prudência, sem que eu esteja muito arrebitado. Movendo-se para o santuário do amor, Human aquece Irina com filas de beijos. Olha comigo, olhando na mesma direcção… Que temo eu, assim para me deixar ficar por aqui e pelas redondezas e tu que andas sempre num andarilho? Podemos ir de comboio ao norte, ver o Douro, queres Irina? Yupi! Consegui! Bramou Irina.

Faziam planos para as mochilas, para o som, para a comida, para a dormida, Agosto era.

Seguiram cedo rumo ao Porto, no primeiro comboio da manhã de Santa Apolónia, para depois irem para a Régua. Da Régua, foram para Vila Real no ‘Texas’ e ali ficaram visitando a família de Human. Depois apanharam uma boleia até à Viseu, continuaram a descer à boleia até à Covilhã e faziam tenções de irem ao cume da serra da Estrela, onde apanharam uma boleia até ao cimo, que estava cheio de casas abandonadas, do que deveriam ser pousadas. Human recreou-se pelos campos e foi ver as vistas a 2000 metros, até que ficaram só os dois ali no ponto mais alto de Portugal. À medida que anoitecia, o frio apertava, apesar de ser Agosto. Entraram numa das casas abandonadas, num dos quartos mais interiores, fizeram um fogueira para comer e se aquecerem e ficaram os dois bastante colados fumando uns cigarros, comendo queijo comprado no mercado da Covilhã, chocolates e vinho para a tripa. Trocaram correspondência do calor para o interior dos sacos cama e fizeram da temperatura, o valor real do amor. Pela manhã, após uns exercícios para aquecer os ossos, foram descendo a estrada, até apanharem nova boleia e desta feita voltaram, de novo para norte, para verem o castelo de Marialva. Caminharam da povoação até ao alto do castelo, onde pernoitaram, fazendo uma fogueira com os arbustos secos que Human colhera e dormiram numa muralha com vista para Espanha. Regressariam rapidamente. Human não se escondeu, durante a viagem, nem era seu hábito não narrar seu interior, mas pareceu-lhe estar contente por regressar a casa. Para Irina, retratou a viagem com a nudez do seu diário diante do recado murmurado de si ao resto do que há de melhor, para se descrever. Não os sentimentos unicamente, mas outros foros de vitalidade como aspirações, desejo, aventura, sentido do real e do bem, dissertando com destreza das suas vastas potencialidades, que vinham da sua visão íntima. Foram íntimos Human e Irina, mesmo que a paisagem os abstivesse deles, trouxe-lhes alguma paz e conforto de uma aventura segura, diziam eles.



De soslaio, seguiam o dissipar das nuvens, que continuam uma beleza pura, para o ocaso ascendente, meu ente querido e a horas de chegar a tempo de estar por aqui escutando os limites da face rosa que meu odor faz chegar a nenhures, a frieza sabe disso e é malandra como uma zorra com apenas um condutor…

Vale mais o nosso encontro, que uma mão cheia de dinheiro, dizia Irina. Por isso recordo o nosso tempo de vida como um domínio de vontade e determinação, sem juros a demorarem, que não sejam nos bancos de jardim, nosso lar nocturno, onde jaz o mais completo jogo de olhares, onde as árvores percebem a nossa sexualidade e nos saúdam jocosamente, no diâmetro que ostentamos na nossa folhagem e corpo presente, aos poros sucintos deslocados para o céu, lá em cima e concisos aqui por perto, estamos com as mãos laçadas neste mundo, em que o vento balança para direcções, que não estão escritas. Daí, a celebração da inspiração…



E voltar ao bom destino, o valente príncipe que bem entoado, nos recorda estados complacentes de aventura e bonomia de paz entre os povos, além do mito do amor, que no caso do nosso herói era real.

John Peel faleceu no final do ano passado, sabias Irina? Sim ouvi num programa de rádio em sua homenagem… Quem não se recorda das bandas que ainda ouvimos e ele lançou? E sabias que eu meti conversa com o António Sérgio, para ele passar no programa dele, os Freeheat, a banda do Jim Reid, que ele desconhecia por completo, e lá passou, após falar com um amigo, que lhe arranjou a música. O ‘The two of us’ é fabuloso!

Bem vou cozer feijão, para ficarmos rijos e tu vais ficar por aqui ou laurear a pevide? Vou ler um pouco, Human, vou aproveitar para perpassar os olhos pela tua biblioteca e depois dormir a sesta, se quiseres passa por lá, que te espero… Olha Irina, a intento informativo, ouve onde houver interesse de inteligência, para que não percas o amor no tempo, nem a saudade para reticências Busca-pólos, dorme serena que eu te velo, vigilante ao que sonhares na tua respiração branda, um costume sem horas prontas. Human depois da comida feita, coloca-se a observar Irina, como fazia seu pai consigo, era Human uma criança e jogava horas a fio à parede com uma bola que durou duas décadas.



Rebolar por onde nos deixa escorregar o corpo e pensando no longo divertimento, fantasiado e permissivamente agora nos píncaros de uma corola escondida no rés-do-chão, num apetite sem razão, colhemos o aroma e a pele distingue-se da avaliação do ter que partir de uma coisa boa. Sonhar pelas tardes e esperar sem demora, pelos campos de trigo, oscilando mais as mãos, levemente estudando o sono da natureza, cujos olhar é visto pela ceifa do homem, que necessita de se alimentar e amar a sua terra, cultivando as raízes de um sentir limpo e puro, às condições de ter tanto que fazer e pensar, para depois, não poder evitar o seu próprio sono.

Seguindo as luas e tocando o presente, a excelência da moral não se extingue com siglas, nem somando mortes ou acrescentando certas genealogias, pois que nada está escrito, já sabemos, então o acossar da liberdade, ali num lugarejo perto de um ribeiro farto com uma casinha e a nossa mulher por companheira, na especialidade de um conceito simples como objectiva é a voz que me impele a isso e outra que adia. A noite também tem fim, mas o dia tem nomes vários e quem toma o turno de um solitário? Os sinais assinalam que a história adivinha-se numa procura de que há a fazer ao mesmo tempo que a produção social incompreendida por ignorância do vulto que pára para pensar, mas fóbicamente detido não pode mais que esperar essas luas, pedindo a si mesmo, a regularidade orgânica e um sonho no feminino, que por labuta teimosa, é a sua meta de sempre. Poderá ser a questão a definir ou temos forças contrárias, que se encontram e fazem de mim, um pensamento com conjuntivite. O conselho apropriado, está na lucidez e na sua simpatia pela vida…



Porquanto o lençol a meio caminho de ser retirado pelo lado, para que Human entrasse de mansinho e colhesse o corpo de Irina com um tamborilar de dedos pelas costas, ponto por ponto e descendo ao cóxis, ultrapassando as nádegas (Irina dormia sempre nua) e relaxando os músculos das pernas aos pés. Tudo depois de afastar a BD ‘O Homem de Papel’ de Bilal e assim que ela acordou, Human beijou sua face quente e terna e colaram-se, ouvindo a chuva. Ela atira as roupas gastas e entra no ninho de corpo quente, com um chocolate cremoso para ela.

Como um maestro de batuta em riste, propôs diversão e ficaram assim em arranjos simples.



Falando do papel que ia se enchendo de notas novas e bem constituídas, o recheio do almanaque da temporada ia de vento em popa. E para onde iam os sons medicinais que eles sabiam de cor? Voltavam a eles, como no acto genital em que involuntariamente se acertavam, e as formas correctas de soletrar e escrever, eram dadas como certas e por vezes este tesouro era muito muito químico, em que os membros corrigiam a tensão do dia a dia.

Sem ocultar a espiral do espírito em favor da paixão, havia uma dosagem para todas as causas que adviessem de um congregar sem eufemismos, no verbo amor, o mais saudável ao momento e na sua função libertadora de dois hemisférios humanos.

Sempre em suor, o abater das horas na casa de Human, pois a divisão casa-redondezas, tornava legítimo o sopro da graciosidade nos poros, dando suavidade à existência poética partilhada pelos dois.

E do ócio que agrada sem ceder no tempo cujo seixo que por sobre ele chove, como paladar na essência. Em pequeno finge-se de mão na bisnaga de plástico, que separa o caminho para a novidade, quando se encontra uma irmã da 11ª capicua (102+9) e quer-se estar nos olhos dela, nos seus 18 anos simples, sinceros, calmos, frágeis, eu que na minha ausência de idade ao domínio do tempo, tenho estes encontros ocasionais muito ricos, e que me furtam a melancolia e para que se perceba o enigma que esta sombra apresenta, na face que se colou à jovem mulher, depois de explicar coisas deste mundo e eu queria estar ali mais um pouco, igualmente explicando a génese da beleza.



As voltas do mundo desta poesia no dito e no que é armado cavaleiro, tem senão que se remediar com o veludo da língua, para que se perdoe o abandono e assim selar a carta que sobrou aladamente num casamento perplexo e sobre descrições pacíficas na paz do ter que partir, entre as coisas favoritas que há no poema…

A mestria do povo, pensa que Human e Irina estão a caminho de continuarem juntos, para que acordem a horas de semear versos de amor. E assim sucedeu, com o chocolate dobrado na língua e o sossego do prazer…



Pousado pelo dorso, no existir de tempo a saber, agora que vagueiam no teu corpo, odores que pendem assiduamente numa tonalidade estética drenada. Sim, gravito por hábito celeste ou de firmeza, para depois implementar a operacionalidade do milionário sem vintém. Isto é, sair da proximidade da ausência, logo que descruzo a perna e me dirijo para casa. Que o elo sabe por norma do cooperativismo, que um indivíduo pode ousar nada possuir e alisar o desenho da terra, como ela em origem continuada.

Num dicionário abundam definições e as ideias aqui, têm uma lembrança muito cuidada, dando à gestualidade do tacto, palavra por palavra, até chegar ao momento de discernir pela alma, o que é tesouro a ser guardado no afinco da memória.

A música chega baleada, daí haver em nós, furtos nos lugares mais aprazíveis por forças não conscientes.

As sequências métricas, têm um percurso idêntico ao das ruas de cidade, com a natureza da urbe em construção de um ideal a nós involuntário. A poesia foi um ideal, agora vive hospitalizada. Gostava de voltar à mímica e à sedução, no olhar e na emoção funda. Por agora ando de terminal em terminal, nomeando o temporizador da imaginação, como requinte do silêncio.

Nas voltas de uma sombra que se esgota juntamente com a luz, há falatório que não cessa de se repetir, palrando, grasnando, ladrando, urrando, neste vívere de pensão completa, que é a poluição. O assolo a que se presta na primazia de um alvo em movimento, que reage da terra, dos ares e da água, onde o humano se estimula aí com as rezas da sua própria maldição de irracionalidade sem conta. E para que entre o bem estar económico de um lar quando se sabe que ninguém tem razão, se a história for mais matemática que ideológica. Ora assim sendo, para que lado dormir? A noite dorme de dia e não lê o jornal, dorme bem e não se distingue a sua liberdade, apenas tem um pouco de tosse. Nada que um bom dia não resolva.

De acordo com a imagem do erro ma margem deste acervo, a brincadeira denota aqui o sangue do carácter, que é o vinho que sobeja antes de se tornar cadáver. O que é esquisito, é olhar o fotógrafo, na hora agá, porque os olhos pendem e a lua avança como sabe. Pendem como o marco geodésico e perdem-se de vista. Só o nobre voador sabe da tristeza do seu isolamento quotidiano.

O pensar de alavanca, retira a imobilidade e mantém o dinamismo do movimento, como um passeio ferroviário pelas margens do Douro.

Ainda não se sabe quem matou o juiz, mas se forem a Mortágua, perguntem.

Muito sabe o povão, encarecidamente iluminados por um governo padrão, que os opera na conjectura de um salão, onde o crescendo da voz, tal ópera para ninguém, mas onde o ensaio de farsa, é uma absoluta verdade. É necessário um génio da insurreição, com voz colocada nas directivas da democracia do trabalho, para se colectivizar uma autonomia que se espera durante os momentos bélicos deste século XXI. Olhemos o que diz o néon. Ele pisca, não de amor, mas pisca matreiro, armando ratoeiras demagógicas. O amor pisca de frente e ora de dia ora de noite. A sublevação é amor de dentro para fora, o exterior que amamenta a esperança. Organizando os afectos e tudo o que é humano, ficamos menos ansiosos, com os atrasos do senhor da insurreição, que pode ser uma senhora de bem.

Como se fora um ninho bem escondido, a criança fala sem mistério e confia-nos beleza. A aprendizagem da criança, requer uma predisposição de tempo de entrega, como a qualquer outra pessoa sénior. Acompanhar livremente um humano todos os dias, é a chave que se não precisa, pois a porta da beleza abre-se pelo coração. Tenho essa experiência, como rede solidária de afectos e pela parte que se apercebe de outros mundos e sem guerra. Depois deixar que cada uma siga seu caminho. Toda a dádiva, tem a sua recompensa, como um sorriso pacífico diante de nós.

Vou a caminho do interruptor e depois abre-se um elo radiante de triunfo, na primeira de tantas vezes, que se sente a profundidade da vida numa outra pessoa através de nós.



Ter em conta que há genialidade em humanos no sopé dos continentes, mas que não conseguem dar de si, por voltas subversivas às massas. É neste momento que se amparam as pessoas com os novos sachos e roupas de trabalho, numa valorização do drama plástico, que passa depressa e por todo o lado.

Qualquer coisa fora do sítio, inverte o lugar comum. Se houver na feição dos afectos, a mesma beleza que na criança, os adultos em consciência de propósito libertador, podem conseguir avanços graduais, no seu equilíbrio e nos demais.

Inicialmente a variabilidade do conformismo, abarca leituras na bagagem, que a caminho da autoridade, não permite à pessoa dar de si a desbravar complots, dada a iminência da fraqueza que à leitura é dada. Pouca consequência e muito servilismo religioso. Mantendo-se o humano comum a viver sob um sol científico que ele construiu. É estar triste porque o amor não lhes assiste. Pensar universalmente no amor multiplicado, à pansexualidade, à entrega íntegra do seu plural, idioma do interior que se expande em comunidades serenas. A imaginação vem como ocorrência de ideias, não como feira de projectos vaidosos e vazios e sem a ligeireza do corpo solto e desinibido, que sabe respirar com a compaixão pela pele do outro.

Um comício de pele exibe no seu âmbito coisas vivas, para poder executar a sua nudez com perícia.

Por ora, temos a certa hora deste instante, a revelação do acto de pensar. Do que o alfabeto maneja calmamente, acalenta-se um período que vaza e serenamos. Das eclosões, durante esse durar, rolam no sangue as células vestidas a primor e quem se maquilha púbicamente, tem o olhar íntimo de uma zona revisitada a pente fino.

A sorrir, a saltar, nada se exclui, tudo vaza, solta-se. É o balanço final de um corpo e mente, com os olhos nas planícies azuladas nos céus poéticos, onde os sonhos acampam. Porque a beleza uma vez vista, jamais é esquecida…


























III CAPÍTULO







Na recta da estrada, um homem caminha, carregando um sinal de proibido nas costas e o esforço de permanecer interdito, eram os passos que dava até desaparecer na primeira curva… Depois de partir para lá do conhecimento, tratou de indicar a si o que seria a sua casa. Seria a estadia mais prolongada que até aí poderia travar consigo, propôs-se sem lamento à causa.

Agradavam-lhe os dias serenos e chilreantes dos habitantes do céu, pelo tempo quente e das noites gélidas da invernia, do halo fresco saindo de sua boca, fazendo danças de ar visível. Dias com cartas que chegavam de quando em quando, vinham de longe e eram o seu contacto com o resto, nos seus olhos profundos, de mansa voz e de afabilidade com os habitantes da aldeia, próxima da sua Casa do Monte, que herdara. Aí nem Cristo, nem D’El Rei alguma vez passaram, o que para ele lhe era indiferente, pois estava seguro do seu reencontro com a sua natureza atípica em relação ao comum das coisas estabelecidas.

Aos poucos a aldeia, sua vizinha, crescia e deu-se conta que não era um maciço, mas segundo soube havia 141 pessoas recenseadas. Quem lhe contava as notícias era o taberneiro, onde comprava pão de centeio e outros víveres de pequena conta, pago à vista. E soube que das eleições legislativas, houve um empate de 70 para 70, com uma abstenção. Na segunda volta, conseguiu a antiga facção do regime local, os 71 votos e metade da aldeia deixou de falar com a outra metade, devido ao empate e ao misterioso voto em branco da primeira volta.

Para si comentou que teria de se exigir a uma vontade de aproximação e até porque havia umas raparigas ainda solteiras e de simpatias à solta.

Albano, seu nome, disse num dos seus papéis, que o vento sobre os carvalhos da mata, que via da Casa do Monte, era sobrevoado por gralhas e que os espantalhos estavam bem adornados, para prever futuras debicadas aos frutos das árvores. Albano não possuía armas, tinha os talheres de refeição e um canivete para descascar a fruta, que andava consigo no bolso. Tinha o hábito de se recrear com a vista dos eucaliptos que via na direcção do portão e quem poderia abri-lo, pintado que estava a vermelho. A caixa de correio, ficava no portão de baixo, junto a uma nogueira. Havia alguns gatos e cães que se passeavam em busca de comida e de água, que escasseava por ali, mas que de uma fonte próxima da casa, ainda gotejava qualquer coisa no verão.

A Casa do Monte, foi remodelada. Dos três quartos de cima mais a sala ficou por um quarto e uma sala maiores e uma casa de banho. Depois na sala de estar do trabalho do campo que era o local de vigia e a cozinha, algumas obras. Pelo verão, a porta de casa estava sempre aberta. Albano organizou os seus cadernos, correspondência, ligações ao exterior, via telefone fixo e móvel e uma ligação à Internet, assim como um fax, enfim tinha passado umas semanas a colocar as coisas no seu lugar e de maneira a movimentar-se como desejava.



Encostei-me ao cariz da serenidade e eu, Albano, fui falar comigo pela sesta revezada, numa escolha bem coberta de descobertas e de pequenas histórias, para despertar em mais um olhar a iniciar a sua função ao pensar que seriam horas disso mesmo, uma vez mais… Depois fiz o truque da moral, pois era perito e o facto é que superei a memória do abandono a que fui sujeito, desde cedo e sempre até determinada altura, em que tive de parar por força maior a mim. Tive o condão na condição de cárcere, da paciência e ouvia muita gente e não me fazia sentir, como dantes, mas soprava do meu corpo presente, algo de redentor, que afinava as sensibilidades.

Vou deitar a recordação da minha voz no amplo mover das quatro estações, seguindo como analogia, a existência dos dias retidos no reino da retina. Eu quero crer que, como possibilidade é certo, eu ter entrado em seus corpos. E tinha sido, por estar a afirmar, sabendo das feições internas, do acto íntimo de pensar com o corpo, a moças de Lisboa e elas seguravam-me assim, por dentro.

Ó meu Portugal, terra de boa gente, das conquistas do passado às misérias do presente… E lembrar como cheguei numa quinta-feira de Janeiro, como anjo em cio, sorrindo do frio e fiquei… Muitos pereceram pela ronda dos quatro caminhos, pois tinham menos endurance nos rounds mais apertados. Eu sempre fui um estratega, que passei a fazer sorrir moças no café, que desabafam disto e daquilo comigo. E sorriam mais quando a nuca era acariciada ou os braços e ombros, com o recado de uma alegria que vai de mão em mão e era aí que chegavam as cartas, não o truque da moral… Eu tinha sido muito físico, mesmo vivendo com o porte mais bolachudo, longe das subidas efusivas, eléctricas por onde sobe o Elevador da Glória e ainda tinha tempo para uma luta de facas e desafiar a juventude popular (ex. juventude centrista), mais concretamente em 1997, o candidato Ferreira do Amaral à Câmara de Lisboa, num jantar com militantes, em Campolide, na Valenciana, onde lhe chamei de fascista e me caíram em cima uns 10 tipos, sem que eu tivesse medo ou sentido dor. Incluindo um jogo de predador nas ruelas do Bairro Alto, onde veloz me dirigia às moças dali e que iam chegando. Tempo para falar com música no cabelo… Porque o punk é a minha maior coerência no que diz respeito à coragem e à honestidade. Não há que ter medo do amor nem da polícia!

Pois chegavam-me notícias de longe, enquanto o meu tempo diurno, era de meditação sob uma macieira carregada, junto da casa, como de calmas caminhadas ou olhando o vale, de certos e vários trabalhos no campo. Cartas de moças que me tinham conhecido, outras não, mas que estavam cheias de ternura e nos meus cabelos brancos ganhos em Lisboa, regozijava este perfume de vida distante do olhar e claro próximo do coração.



Veio o sol científico em parelha com uma ignorância, que o sistema patrocinava e a sociedade de humanos, viveu sempre num Entrudo inconsequente. E agora dos bons velhos tempos do rock n’ roll, pouco ficara no legado musical, pensando na atitude que marcou pontos desde a década de 50 até à de 80, marcou pessoas, movimentou multidões e tal a fonte do meu tanque, tinha secado sem a clareza de um acto no ponto V. O vê central no corpo das fantasias que tinha executado, quando ainda se podia jogar à bola no meio da estrada. E acordar cedo era um exercício de quem quer brincar mais tempo, entre o que a liberdade ressona tardiamente e se deixarmos nos ficar a olhar as unhas quando falamos, mais tarde na rua, como a questão da compra do bikini. Por isso me revelava moldado por uma aprendizagem que se manteve erecta, mesmo que melancólica, daí a doçura da comédia, como origem própria de quem leu o dia como extensa corrente de espelhos a que recorria, só para me certificar de quem era quem. A tal história do relevo cru onde o truque da moral, chegava sempre que o tema era o dinheiro, aí via toda a nudez de uma pessoa.



Na boa macieira, a sombra pregava-se ao corpo de Albano, que sem risos nem choro, sentia pardamente seu vulto preparado a novidades e sem um adeus regular. O seu tentar afeiçoava-se, levando com a firmeza do cajado, o seu passo ao entendimento da satisfação, cujo leme era detonado pelo palpitar sensível dos corações e da paz à sua volta.

A Casa do Monte ganhava vida com a presença de Albano. Sim, eu andei por lá a propagar-me, logo após que a minha sombra se dissipasse e me chegasse às coisas pequenas da terra, com o cuidado de proteger as mãos, para que pudesse mostrar que nunca tinha tido um emprego, esta era a sua oportunidade de gozo. E num manso repente, entrou mansinho uma brisa que me conduziu a um caderninho situado nos meus arquivos. Albano andara a remexer no passado, desta feita era o seu em questão, num rumo de silêncio, pausado e tenaz, que corria forte no seu sangue de flor de montanha.

Dias reais, uma ou outra ponte para o divertimento. Tentou-se pois ao que era um hábito de prazer, no passeio da voz, no germinar do riso, entre um ou dois amigos e as amiguinhas lá do bairro. Havendo falácia no comportamento nos demais, um pouco por aqui e ali e Albano sempre predisposto a proteger as virtudes de cada alma sôfrega. Albano dirigira-se por directivas pacientes, tal como agora no seu espaço e atento às urgências do mundo. Dissera para si, que estaria uma vez mais, construindo histórias com as pessoas e ali, não seria excepção, ora deu-se a revisitar uma imensidão de experiências e de semblante limpo na face, pôs-se a elaborar o que aí viria, vindo por sua iniciativa. Se fosse por vontade a si dirigida, ele desconfiaria, pois todo o seu manancial de histórias, tinham partido da sua vivacidade com que coloria a vida dos outros. E em oposição a este facto, tudo o mais tinham sido interesses de todo e variado género e grau de maldade. E por acreditar em si, valia-se para uma regular e imperiosa dedicação à vida. E igualmente crendo no que era a mais real verdade, que tudo é um momento activo diante da vida. Contemplar, era pensar da memória para uma acção segura. E seguramente e sem forçar o que a brisa centra em redor do cérebro, sou um complemento à solidão, pairando sobre mim mesmo, quando a inspiração vem e vai com a sua certeza e no confiar, conferindo meu método de andar por entre gentes, que nada explica. Pois cá dentro é se inteiro, por fora um pouco desfragmentado, pela via da presença ora calma, nervosa, ora vivaz. Das duas uma, ou o movimento de um baloiço, sente-me melhor ou estou na recta que interdita o sossego e abre foros de muito pensar. Que o conhecimento, apenas ele, é insuficiente sem um pedaço do amor, a colar ao fragmento e estimulá-lo com os gestos que se gostam nesta ou naquela, com que se sonha. Se houver pesadelo, é sinal que o sonho é pouco seguro, daí desejar esta Casa do Monte. Porque na anterior casa, modelo de uma soberba vida, existira outrora actos contínuos de amor, edificados com perícia e lembro-os com a mesma saudade que os devolvia à primeira casa e que agora experimento, com a distância de uma pele que respira por completo, adivinhando que o que pretendo está por ora na mesma medida que a saudade. Uma chuva cai e recolho-me, esqueço ao que vim, preocupado com as voltas de uma nova casa. O calor é abrasivo, tento um duche e uma nudez por sobre a cama e arrefeço a cabeça, percebendo a essência substancial da intuição sobre o quotidiano, tantas vezes se escondem de ambos, que espero o querer de mais um olhar sobre mim, visto por outra e depois por mim. Sempre vivi assim, talvez por saber que desta forma, tenho as costuras dos fragmentos mais preparadas ao sorriso, à simpatia e à generosidade.

Depois da chuva, o regresso ao terreno e observar o que encaixara a água de fundura na terra necessitada. Salvas por um dia as árvores. Nos outros de pouca dura, sou eu que levo baldes de água, numa andança de oliveirinhas a pessegueiros, macieiras e cerejeiras, entre outras, como na horta, de onde vinham as saladas e as sopas e se mais água houvesse, talvez plantasse uns morangos.



Sofrer de monotonia, pode ser resolvido com uma mudança no trajecto diário a caminho dos afazeres de cada profissão. Quanto ao tédio, é deixar que a cabeça se resolva durante esse processo involuntário.

Grave seria se me acossasse de uma rapariga sem memória e quando isso aconteceu, a sensação de estar a falar para nenhures. Também em casos de falta de percepção cognitiva, o mesmo sucede e visto do céu, é dramático, mesmo que seja bela, a cor azul de um poema chamado planeta Terra.

Ter em conta o fim, saber de nós assim, com coisas sem agrado, para que sirvam de contra-feitiço, detonada uma tristeza ou depressão. Serve também como receita para jogos de sorte e apostas pessoais nisto e naquilo que não entendemos, ainda.



Albano tinha a boca seca, tinha travado largo autismo falante consigo mesmo e como tinha um frigorífico, refrescou-se com água fresca, para voltar à conversa, que parecia estar de bom gosto. Em que pensaria ele? Teríamos de o escutar quando ele falasse, sobretudo das coisas que ele gostava, para que se não metesse de novo consigo. É consigo, Albano…

Ah sim?

Sim!

E então?

O nosso presidente disse que vai haver reformas na educação, reformas a sério!

A minha cor favorita é o Outono…

Bom, volto depois Albano, já vi que está ocupado.



Divertia-se com os forasteiros e sacripantas do sistema com a sua operacionalidade completamente incapacitada. O problema do isolamento sem amor, derivava disto e as variantes de equilíbrio provinham de contactos sadios, e em momentos em que recordava a sua criança inocente, bondosa. Lembrara um cego, muito alto e magro, muito pobre, Albano dava-lhe sempre uma moeda e o senhor agradecia e um dia Albano conseguiu dar-lhe uma moeda de 25 escudos, ficou feliz, mas sempre com pena do destino do senhor sempre muito humilde e educado. Dava-se melhor com pessoas humildes, pois era de natureza igual. Tanta pobreza na arrogância, como um casal de comunistas que traficavam droga para sustentar o vício e assumiram que esse vício era superior à moral da ideologia de esquerda. Essas coisas de igualdade, liberdade e fraternidade… oh mais ça c’est super! Albano fez desaparecer esses carrascos da sua vida, com subtileza, porque tinha o canto da alma, mais afinado que a voz do canário.








IV CAPÍTULO





Enquadrar o brilho quebrado e particular ao cérebro, onde por seu requisito, há esconderijos que ornamentam o cálculo de labirintos a saber. Em cada registo intemporal, como uma sensação amorosa, por exemplo, temos o paladar concreto da ausência em corpo presente e numa viagem autista, é o inconsciente neutro de si, onde ele se toma como fluxo rotativo de imagens e pensamentos, associados ao que desejamos na nossa escola de sonho. O que difere a realidade do sonhador, é o acto liberto que este apresenta, devoto a uma causa instintivamente aventureira.



Na apresentação da manipulação social, há uma elasticidade mal explicada: onde poderemos coabitar em paz e cooperação, connosco na região portuguesa, onde olhos que se lêem em piratarias activas, colhem algo de consequente aos princípios de um paladar humano, conquanto ele exista muito além do que se entende como a independência dos agentes reguladores dos cidadãos, que através de controle do pensamento, deixam em aberto a destruição acelerada da humanidade. E somos inúmeros e românticos, os anarquistas, do you love me, do you love twenty?

O inferno pessoal de cada um, é a ausência do amor genuíno e a batida que marca o ritmo em jazidas de ouro e mel, onde somos um corpo de verdade e em simultâneo, é uma pequena parte dos futuros individuais. Por diplomacia, gentileza e subtil manha, já que a raposa tem sete e a mulher a manha de sete raposas, há na sensibilidade feminina, um halo redentor, que é sombrio no homem, com a excepção daqueles que afirmam, que é perigoso esclarecer as populações do controlo fascista, mas que mais perigoso, é não o fazer; assim como aqueles que de um modo ou outro, não se vendem e lutam generosos, numa entrega de vida em nome da paz, contra o estado de cada nação, ‘porque não queríamos cá tocar também, ‘só quero que se saibam comportar – que as guitarras e microfones não são para brincar’, fodass, só quero dar a minha opinião, sobre o que vai mal, na puta da nação, na puta da nação’ (Condenação Pacífica, revisitando Crass). E claro a disciplina da linguagem, tem na poesia a sua expressão sem complexos de culpa, quando se apresenta com um assobio que se estende numa dança nua.



É crucial o desenvolvimento educacional alternativo; não aceitar o que existe, sendo-o numa forma livre, onde há espaço, liberdade, confiança elevada, auto-ajuda e cooperação humana. Os desenhos poéticos, as imagens do poente elevadas em amizades profundas, os fenómenos de entes que são mais velozes no pensamento e que de algum modo, lançam as sementes para que se creia poder haver territórios onde a mente se expanda naturalmente e o corpo se sinta solto. Estive envolvido nisto em tenra idade e agora soterrado com as congregações jactantes ou balofas dos habitantes de Lisboa.

Desbravado o caminho, desenvolvendo-me de forma gradual, a um estado de consciência e conhecimento, em que as minhas características, colhem o saber universal e ecleticamente unindo reflexões, como ao conhecimento dos humanos, mesmo os que me ajudaram a desbravar este meu viver, fazem de si o todo, que desperta em mim, o início de querer mais, por dever intrínseco à minha natureza.

É também necessário desenvolver a teoria da autonomia do ego, elaborada num discurso libertário em 1989 e a partir daí, tornar os humanos, menos dependentes da visão economicista de liberdade e serem elas mesmo, sem um cêntimo no bolso, mas com um sorriso a meio do rosto. Estas tarefas são, como outras mais e de igual grau de importância, (como o esclarecimento da manipulação do capitalismo nos mass media), o ódio emocional praticamente um atavismo encarcerado nas mentes das gentes de muitos países da Europa, e aqui por Portugal, iniciam-se ciclos de feroz e mortal violência, precisamente e não só, mas num aspecto importante: eu não penso como tu e o pensar, não é o conjunto de evidências do aculturamento, mas a coragem desafiando quem se fecha, para além da alienação multicultural, que perpassa em muitas actividades sociais, como a música por exemplo, mas sobretudo nos pequenos momentos do dia a dia, em cada acto acorrentado e quando eu me dirijo a quem encontro, noto sempre, o The fool on the hill, para além das minhas costas e eu em silêncio atravesso a rua e faço qualquer coisa, que me deixe perto de estados seguros que vêm do trabalho de pensar e muito mais além que o culto da poesia.

Chamemos de vocação interdita, o meu estado de graça e procurem-me aceso, um pouco depois do segundo round.



Certa manhã, estava acompanhado de pouco sono e dirigi-me a um posto de venda de artigos de papelaria, seriam umas 8:30 e um homem exclamou ai ai e o dono disse que era preciso cantar o hino da mocidade portuguesa. O outro foi embora com um jornal desportivo e corroborou o primeiro, acrescentando que era preciso mais que o otário do primeiro-ministro de Portugal.

Em Guadarrama, no distrito de Madrid, há lá uma estátua do Franco e as pessoas são otárias como as de cá. Gosto de chamar de otários a essa súcia, porque me lembra de um manifesto do João Gabriel Morato.

Agora, indo para uma amizade alemã, que trabalha num matadouro de porcos, fazendo controlo de higiene por lá, diz que vem para casa a cheirar a porco, mas que tem um problema de pele e não pode se lavar com muita água, então dorme a cheirar a porco.

E lembrando o álbum de BD, As Falanges das Ordens Negras, onde um grupo anti-fascista, ataca os pestilentos nazis, recriando a bravura dos anarquistas, enquanto os meus lábios pensam a quem devo dirigir a palavra escrita pelos Smiths: Nature is a language can’t you read?’.

As obras de Wilhelm Reich não são reeditadas em Portugal, talvez por a contestação não ser a mão de obra mais requintada nesta quinta dos milagres e daí ter de recorrer à importação francesa, a alguns livros que emprestei e sumiram. Faz-me lembrar o assalto ao Pinguim, mais conhecido por João Paulo Cardona, que lhe levaram o Lp, Give Them Enough Rope dos The Clash, que lhe tinha emprestado e ele mandou vir outro, importado. E depois as distribuidoras anarquistas em Portugal, como a Rastilho de Leiria, estão ligadas a sites fascistas.

O Pinguim era um rapaz simpático que conheci no Liceu Maria Amália Vaz de Carvalho, então baterista dos Condenação Pacífica, praticava pólo-aquático e chegámos a ir ao cinema ver o Padrinho, a casa de um fabricante de baterias na Avenida João Crisóstomo, 69-A ou B e cheguei a tocar com ele, mais os restantes elementos dos Condenação Pacífica sem o So What, à guitarra, num fraseado que ele fez. O projecto dele, chamava-se Em Nome da Paz, ele cantava, mas o Careca não gostou e acabou aí.

Encontrei o Careca no 42, há uns 3 anos e trabalhava em pinturas com o pai, creio, soa estranho quando ouvimos as letras da demo deles, que ainda conservo. Sei que a casa do Pinguim foi demolida, tinha uma pintura comunista no prédio, como a que colocaram num moinho abandonado em Monsanto, com vista sobre toda Lisboa.

Quanto aos bandidos que fazem grafittis, apagaram muita coisa histórica aqui em Campolide, pintando por cima, o que era a história da luta contra o fascismo e os jornalistas ficavam admirados por serem burros e não saberem do facto e eu coloquei uma frase no fim do muro da Penitenciária de Lisboa (num espaço em branco), que dizia, ‘Musicamos com palavras o diálogo da vida, vamos indo sem rumo, apesar da bússola’. Isto, lembra-me uma loura sueca que conheci algures num local impróprio para o diálogo e que tem nome de sabonete, que trabalhava no World Wide Found (WWF). Medimos os braços e nada mais, e depois de sair de lá, já na paragem do Bairro Alto, vi um rapaz a enfrentar 15 negros do Bairro Padre Cruz e depois ser atacado pela polícia, tudo porque se meteram com o chapéu dele e o motorista da Carris, esses Fangios mal dispostos e cobardes, partiu sem que se resolvesse o caso, fazendo que o rapaz perdesse a cabeça, com tamanha injustiça que se lhe deparou. Eu saí para o amparar, mas ele queria estar sozinho.

They say we are trash, our name is Crass, not Clash…



Voltar a calcorrear a par do sol e encontrando duas amigas (mãe e filha) que em conjunto comigo, resolvemos um problema de um cão, corria o ano de 2001.

Ia de olhos de chorar ao café, após ver o vídeo do Joe Strummer e ao ver a Marcela, a filha, disse-lhe: Chegaste a ver o Verão de 42? Porque te ris? Mas não tinha visto… Queria olhar mais para ela e perguntar-lhe coisas de adolescentes, eu que aos 12 anos em Escurquela, disse para mim que queria ter sempre aquela idade e recordo o local onde o disse para mim. A Marcela passou para o 9º ano do ensino secundário e quando cheguei a casa, pensei… podia ter-lhe dito que o meu 9º ano foi muito feliz e que afinal sempre consigo espaços de alegria, oriundas do mesmo espírito do verão de 42, cujo filme terá sempre a minha idade, dado ter nascido no ano em que ele foi realizado, em 1971…



O gatilho na hora de uma inteligência à prova de bala, vê iniciar um episódio de lepidópteros em volta do passeio e pelas margens do asfalto, nota na curiosidade e inocência das crianças, alguma poesia de rua, que também se acha sob forma de sensibilidade em mim, quando me tenho menos tenso e daí à observação do mover da multidão, vai um desenho mental que entoa um dever cumprido. E sendo uma deslocação de que prezo fazer multiplicações sem que deus exista e o estado também, deixo minha presença, longe e ao mesmo tempo, unida ao universo numa fórmula de unicidade que dá conta das necessidades de fornecer vida aos que pouco falam e nada disto é senão, aquela vontade orgiástica de tudo querer com afinco e originalidade, após anos de terror, onde ainda assim e continuando, me aproximo de um estado espiritual constante como ardente e da mesma qualidade de prazer com que escrevi o poema dedicado à Lígia em 1997 e que está no topo deste espaço. E porque me descolo dos erros, que dão manobra à recriação de plataformas de entendimento da vida e coloco-me mais e mais sobre um aperfeiçoamento e auto-desafio em seguir sozinho, como num passeio numa aurora de domingo pelo Tejo, olhando o rio e o céu, sabendo que meu caminho, é feito desse êxtase que deixa o estuário e larga o seu sorriso calmo a cada pedido de tempo.



Denotando que o vazar tem como impasse antes da saída do tampão ideológico sempre revestido de cores dadas à precisão de murmúrios semelhantes à da fala que o sono compõe em horas de conhecer a sua autonomia.

Por conhecer o que os olhos ditam, demoro-me por aí, segurando a sexualidade vítrea da vitalidade, pela lógica de um instinto saudável.

No corredor das massas vigora um estado comercial da consciência, facilmente adquirida e não há mistério aí. Não há reacção nesta patologia de hoje para o futuro. A figura do corpo que a vida desenhou, representa a dinamite mal colocada e daí qualquer descoberta generosa tem a base de um garrote que olha alucinadamente para a morte que chega e é preciso discutir porque dançamos sem par. Isto se a alegoria se manifestar em indivíduos sem o círculo que une a força da imensa redoma da natureza, cujo fim é a sua evolução através de facções onde as probabilidades de retomar a pureza são tidas como sérias. Mais que a seriedade, há no desenfreio do desejo pela plástica, uma elasticidade que posso definir como a caixa sem recursos do ilusionista perdido por respeito à coragem e a sensibilidade avisa que todo o freio que toma o lugar do tempo, equivale ao não ser. Este, o tempo que temos para hoje, amanhã há que combinar o que vamos ser, de instinto recolhido. Não vou esperar o sono da verdade, vou ver cirros…



O curso do presente está apetrechado de festividades de uma banalidade residual, onde se encontra pouca sensibilidade que se irmane de uma família em conluio com o processo redentor de uma vida assente na constante evolução de ideias e com uma moral que se pensa. Por onde pisar o solo, outrora tenro e nos corpos de hoje, aquela rigidez que a própria mente fundamenta, quando assiste ao decurso do limite que faz cerrar as sensações de viagem que podem estruturar uma liberdade, no seio da ditadura capitalista, onde a voz de um indivíduo sem dinheiro e de comportamento de tez surrealista na sua energia vigiante, é alvo do pior desdém que uma sensibilidade feminina como a minha, tem que suportar. Há dias tinha uma nota e vi o filho da romena que está de passagem por Lisboa, e quis lhe oferecer um pouco do meu tempo, falando nós por gestos. Ali no pátio, onde moram ucranianos, romenos e alguns portugueses, tenho amigos que me recebem com um sorriso doce, como a esposa do Vasilli, a Irina, o saudoso Viktor que cantava com alegria canções da sua terra natal e certo dia em que tive uma lombalgia, ele vinha trazer o café, que me aquece a alma e eu comovido, ofereci-lhe a minha televisão. De passagem os lugares que cativo e me emocionam, na multidão que sei precisar de atenção, escrava que está dos compromissos nervosos da normalidade.

Eu estou aqui, para dar a minha vida aos outros. Os meus recursos naturais são o meu pensamento e desse posto universal, caminho entre as veredas que um adeus regular assinala…

1 comentário:

  1. a viagem foi longa, mas eu ainda estou de volta que você precisa de um que lhe dá satisfação por todo seu trabalho espiritual. para aqueles que já me conhecem como ele não surpreendê-lo se você ler o meu artigo de hoje na rede para as pessoas necessitadas e eu estou aqui para ajudá-lo a meu irmão, minha irmã, eu sou a sereia rainha Eu estou aqui presente para você que têm o problema de dinheiro e você quer ficar rico tem dinheiro para pagar tudo em aberto para você deseja em sua vida com a ajuda de uma rainha sirene trabalhando como o nome indica Mamiwata você manifesta. cada pessoa que não encontrar um melhor parceiro para uma melhor vida amorosa é a hora de mostrar-lhe como você faz você enganar ou deixar por seu parceiro que você ama se manifesta como você receber um resultado rápido automático. para cada pessoa que estou perturbado por espírito maligno e que não encontra a paz com eles e foram cativados e perdeu toda a sua vida em cada planta tem certeza mostrar que é hora de você para refazer sua vida. você é um homem ou uma mulher e você se juntou a uma seita Mamiwata ou fazer um pacto com o MAMIWARA para cada caminho da felicidade que você quer em sua vida não excitá-lo em contato comigo não é nenhum problema em futuro. Você que não conseguiram concordar ou não funcionam em sala de aula e você quer ter um rápido contato intelecto levar comigo você sempre será melhor. Você é um empresário ou um empresário ou você ocupar uma posição que faz você pagar bem e você sabia uma queda ou você quer ter uma grande mudança ou manter uma grande posição para ter muitos clientes em sua área este é o momento para que você possa reagir estou aqui para ajudá-lo com o meu trabalho. cada pessoa que sofre a doença de apresentar você não encontrar uma solução que e você tem um monte de passar para outra pessoa ou em hospitais e não foi mercado de apenas certifique-se de contacto comigo e você terá uma satisfação automática etc ..... não vou dizer tudo, mas em contato comigo para qualquer problema que você tem e você vai saco o resultado de que nada é fácil na vida, mas todos podem estar em casa Rainha da sereia.
    Email: maitresupremeducerte13@gmail.com / meu número de telefone é: 022962025881
    NB: Eu faço meu trabalho livre a todos os que contatos me Eu nunca vou tomar com antecedência o custo do trabalho e é o que eu faço desde que eu comecei a serviço, mas você terá que pagar-se cada ingrediente ou qualquer produto que você usou para fazer qualquer tipo de trabalho que você mesmo com seu próprio dinheiro se você quiser uma verdadeira satisfação.

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